sábado, 6 de setembro de 2014

Se fores a Penamacor



Naqueles anos sessenta, quem quisesse ser bem recebido em S. Francisco (da Califórnia, é claro), devia levar flores no cabelo, para ser esplendidamente lá recebido, o próprio Marco Paulo também o frisou, na esteira da canção de Scott Mckenzie que estava então na berra. Bem nos fartámos de o cantar, na consciência gradual para uma aventura de beleza e libertação, que não mais pararia, teríamos ocasião de o viver. Ou seja, talvez tenha parado, em termos musicais, por alturas do “We are the world”, quando as afectividades se apuraram em torno das criancinhas, como mundo capital no mundo da travessura que finaliza, nestes tempos do terror, com as imagens dos jovens encobertos da travessura ocidental, (sem ilibar os da oriental, igualmente idóneos nisso), prestes a assassinar os repórteres que se limitavam a cumprir as suas obrigações de jornalistas viageiros no mundo da guerra.  Mas na verdade estamos a enganar as crianças do mundo, que não são, de facto o mundo, como informa a canção, mas puros joguetes do mundo adulto bem apessoado, como tantas vezes verificamos.
Esta referência às canções com o nome de terras, como “Alentejo da minh’alma” de Luís Piçarra, “Figueira” de Maria de Lurdes Resende,  Coimbra menina e moça”, não sei se de Edmundo Bettencourt, e tantas mais, sem olvidar as terras estrangeiras como o «New York New York» da “voz”, isto é, de Sinatra … e mais os poemas como o de “Nambuangongo”, de Manuel Alegre - referindo heroísmos de homens com medo aos que apenas reconheciam em Hiroxima o caso extremo da monstruosidade - e sem esquecer referências literárias mais primitivas no nosso país, caso da cantiga de amor
Tu que ora vens de Monte Maior
Tu  que ora vens de Monte Maior
Digas-me mandado de minha senhor
Digas-me mandado de minha senhor
que mostra muito simplesmente, sem pedantismo algum, um coitado de trovador  (Gil Sanches) ansioso por notícias da “senhor” amada, para se sentir feliz…
Dizia eu que esta referência a poemas ou cantigas  com indicações toponímicas, me surgiu a propósito da entrevista de Fátima Campos Ferreira a António José Seguro exactamente na terra natal de Seguro, Penamacor, de lindas vistas, terra de um homem bom, o que imediatamente me fez acudir o desejo de que tal facto implique a criatividade dos poetas e cantores da nossa terra, em entoações de louvores melódicos por ela merecidos, como terra de um futuro provável governante importante. E bondoso, querendo o bem de todos, como Mandela, seu ídolo.
De facto, de tudo o que por cá se diz e faz, nestas vilegiaturas turísticas dos candidatos do PS a 1ºs  Ministros, em incómodas caminhadas obrigadas aos beijos do mulherio e a breves referências aos pontos de vista sem importância, de cada um, restou Penamacor como terra para musicar, no rasto das melodias citadas e tantas mais que há.
É também verdade que artigos como “A geringonça”, de Vasco Pulido Valente, com os retratos de Seguro e António Costa, sendo impecável de precisão e de rigor satírico sobre as nulas diferenças entre ambos em caso das políticas a seguir, de que eles não falam, são peças fulcrais de análise que superam qualquer melodia, mesmo que esta fosse em torno de uma terra de pedras sólidas, onde se formou o carácter de Seguro, que nelas colheu a solidez e a teimosia  para a continuidade.  

Ei-lo, o artigo de Pulido Valente (Público, 31/8):

A geringonça
António Costa e António José Seguro não vão ganhar nada, excepto um partido desorganizado e dividido. Nesta longa campanha de verão, nenhum deles se conseguiu explicar. Fora a repetição dos lugares comuns da seita e alguns disparates que foram buscar à extrema-esquerda, não disseram uma palavra capaz de esclarecer ou de entusiasmar o “eleitorado” dessas desgraçadas “primárias” para “primeiro-ministro”, sem regras claras, nem objectivos definidos. No meio da confusão, só se percebeu que António José Seguro se recusa a sair e que António Costa quer entrar. Os dois perderam o seu tempo a trocar insinuações de velha azeda e mal disposta, que não resiste a espicaçar os vizinhos. Os jornais, de quando em quando, falam em “diferenças” entre eles. Mas na realidade não há diferenças que se vejam.
António Costa, quando apareceu, tinha uma fama de homem sereno e reflectido, criada num programa de televisão, em que quase não abria a boca e deixava confortavelmente a berrata a Pacheco Pereira. Faziam um excelente par. Pacheco Pereira ficava com a indignação e o excesso e António Costa com a prudência de estadista. Infelizmente, na propaganda das primárias (nas suas voltinhas de candidato que em Portugal nunca variam) está sempre rodeado por um bando de jornalistas sem senso à procura de uma frase ou de uma notícia; e a oportunidade para se aliviar de altos pensamentos é nula, tanto mais que na cabeça dele convivem ideias vagas e mutuamente exclusivas: a da maioria absoluta e a do entendimento com a esquerda radical, por exemplo, ou a da “negociação” com a “Europa” contra Merkel e Hollande.
Entretanto, as “primárias” de Seguro em vez de o aliviarem, como ele julgava, só lhe trouxeram desgostos. Primeiro, a trafulhice das cotas pagas por defuntos e mais categorias de ausentes. Segundo, a radical ambiguidade do conceito eleitoral de “simpatizante”. E, terceiro, a licença ecuménica aos maníacos da política para meterem o bico onde não são chamados. Peregrinando pelos tristes cafés da província adormecida, bem longe dos “festivais” de música, gastronomia e artesanato, Seguro recita as fórmulas do costume, sem acrescentar uma única variação ao breviário. O país que o ouviu, já não o ouve. O eleitor médio de qualquer partido reforça a sua compreensível repugnância em votar nele, e sobretudo para “primeiro-ministro”. Mas começa também a fugir da gerigonça a que se chama PS.

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