Parece que se decide hoje. Para preocupação de quem se
preocupa, entre os quais Vasco Pulido Valente e Alberto Gonçalves. De António
José Seguro não se espera mais do que aquilo que ele repete inalteravelmente e que
Pulido Valente tão bem retrata: um mundo de realização plena, caso ele seja
eleito, porque o que é preciso é erguer a economia e subir o emprego. Com o
auxílio de uma fada-madrinha, já que a literatura por que se ficou Seguro não
extrapolou do universo infantil, com certeza, pois não alterou uma vírgula nos
seus discursos de apelo e luta pela vida, de promessas de realização mágica.
António Costa, no fundo, diz o mesmo: o que é preciso é o desenvolvimento da
economia e a diminuição do desemprego, o que nem Vasco Pulido Valente nem
ninguém põe em dúvida . Mas a demagogia de António Costa parece – e a Alberto
Gonçalves também – mais perigosa, no artifício das palavras roncantes mas que escondem
zelos de alianças a uma esquerda arrogante, cada vez mais prestes a lançar o
comando das suas “elites” gritantes e acéfalas sobre os destinos de uma nação a
braços com dificuldades gritantes, mas cujo Governo trabalha por as ultrapassar.
Põe-se, além disso, a questão da diminuição de
deputados proposta por Seguro, recusada por Costa, contra as opiniões de
Alberto Gonçalves e de Pulido Valente, este no costumado desdém pelas camarilhas.
São três artigos que retenho pela sua inteligência e
preocupação críticas, desejando que a eleição de António Costa – que não ponho
em dúvida - não resulte na catástrofe prevista por Alberto Gonçalves:
O socialismo em 2014
Vasco Pulido Valente Público, 13/09/2014
Dois candidatos andam por
aí melancolicamente a explicar ao “povo socialista” o que fariam com o poder,
no largo do Rato ou em Portugal inteiro. A parte mais curiosa deste peculiar
exercício é a concordância final de Seguro e Costa para nos tirar da miséria em
que vivemos. Tanto um como outro acham que o segredo da felicidade está no
“crescimento” da economia. Se a economia “crescesse”, eles mudariam a Pátria de
alto abaixo. Seguro quer mesmo mais. Quer “re-industrializar” um país que nunca
foi industrializado, uma avaria quase metafísica. Mas, no meio disto tudo, fica
uma pergunta perturbadora: onde pára, no “pensamento” destes próceres, o “povo”
que o capitalismo, de propósito ou por acidente, empurrou pouco a pouco para a
pobreza e o desespero?
Presumindo que nem Costa nem Seguro tencionam
ressuscitar a URSS e o dr. Álvaro Cunhal para reconstruir a próspera sociedade
que existia no leste da Europa, só se pode concluir que eles querem uma
sociedade de mercado, com o Estado reduzido a algumas tarefas de inspecção e
regulamentação e com um pequeno banco (o novo Banco de Fomento) para ajudar de
quando em quando meia dúzia de empresas perto da falência. Em 1970, o nome que
se dava a esta actividade dos socialistas era “gerir com fidelidade o
capitalismo”. Agora ninguém acha estranho e muita gente pede aos Céus que lhe
tragam um segundo Cavaco, na pele de Seguro ou Costa, e um bando de meninos,
saídos de fresco da Universidade Católica ou da Universidade Nova, para tratar
dos pormenores.
Insistindo no “crescimento”, nenhum dos dois mágicos
do PS percebe que fica submetido às regras do mercado. O dinheiro vem de fora
(porque não há cá dentro) e com certeza imporá as suas condições: nas finanças,
na justiça, nas leis do trabalho e por aí fora até à política pura e dura. O
Estado Social passará a ser uma preocupação secundária e a margem de lucro a
preocupação principal. Ora o dr. Costa e o dr. Seguro, empregados públicos
desde pequenos, não sabem o que é uma empresa, como ela funciona e o que
precisa para funcionar. O risco para qualquer um deles de cair na asneira
sistemática à portuguesa é enorme e provavelmente inevitável. Olhem bem para
eles, ouçam as conversas pedantes que eles dia a dia nos fornecem e, depois,
tentem imaginar um desses abencerragens a dirigir uma economia. Não se concebe,
pois não?
A vacina
ALBERTO
GONÇALVES, DN, 17 de Setembro , 2014
Numa típica cartada populista, António José Seguro
defende a redução do número de deputados. António Costa opõe-se com veemência e
o argumento, razoável, de que a proposta é uma "declaração de guerra"
aos partidos mais à esquerda. Entre o populismo e a razoabilidade, neste caso o
meu coração não balança e prefere o primeiro.
Por um lado, porque é evidente que 49 parlamentares a
menos, conforme pretende o Dr. Seguro, não afectariam em nada o já esplendoroso
desempenho da Assembleia da República (aliás, o acto de levantar e sentar de
acordo com as ordens partidárias seria realizado com vantagens por meia dúzia
de marionetas). Por outro lado, porque a paixão do Dr. Costa pela
representatividade democrática esconde, sem esconder, o interesse estratégico
do homem nos eventuais apoios da extrema-esquerda, seja esta o PCP, o BE ou os
incontáveis grupúsculos que diariamente abandonam o Bloco com o ecuménico de
namorar o PS.
Sonhar acordado é fácil. Os pesadelos é que doem. E
infelizmente não é disparatado imaginar que o dr. Costa vence as
"primárias" do PS, chega a secretário-geral da seita e, em
"legislativas" marcadas pela penúria real e abundância prometida,
alcança o Governo. Sendo previsível que a alucinação colectiva não vá ao ponto
de lhe oferecer a maioria absoluta, é aceitável supor que, para efeitos de
"governabilidade", o Dr. Costa cozinhe as alianças que nunca rejeitou
em público nem, desconfio, em privado.
Em suma, é legítimo presumir que daqui a um ano o País
é bem capaz de cair, parcial e literalmente, nas mãos de comunistas. Após
quarenta anos, Portugal arrisca tornar-se a proverbial "Cuba da
Europa", ou a "vacina" de Kissinger. Curiosamente, a doença foi
entretanto erradicada da civilização e de Cuba, no sentido atribuído, sobra
pouco. Sobramos nós, embora o processo de emigração em curso não passe de uma
brincadeira se comparado com o que aí virá. No máximo, ficam os deputados.
Um produto do cérebro de Seguro
Vasco
Pulido Valente
19/9/2019, Público
Segundo parece, a Assembleia irá ser reduzida a 181
deputados, o que beneficia a direita e prejudica a esquerda radical, sobretudo
o BE e o PS. Mas, tirando esse terrível problema de saber quem ganha o quê,
António Seguro tem razão: a esmagadora maioria dos nossos representantes é paga
para não fazer rigorosamente nada, excepto votar quando e como a direcção do
partido lhe manda.
O exemplar típico assina o ponto e, a seguir, vai
trabalhar numa empresa ou num escritório de advogados. Uma dezena deles passeia
pelos corredores, lê os jornais, bebe um café e, às cinco, volta para casa. As
gritarias, de resto raras, cá em baixo no anfiteatro não comovem ninguém, nem o
público que ninguém sabe o nome dos figurões, nem o país que os despreza do
fundo do coração.
Têm sido feitas propostas para acabar com esta
vergonha, que os partidos rejeitam sempre. Porquê? Porque os chefes precisam de
sinecuras para premiar os seus fiéis, principalmente quando eles vêm da
província; e porque os batalhões que chegam, bem disciplinados por uma vida de
subserviência, nunca lhes desobedecem. De resto, não se compreende por que
razão os “reformadores” do Parlamento e da lei de eleições preferem
invariavelmente o círculo uninominal e variantes. Seguro fala, se não me
engano, em “visibilidade”, em “transparência” e nos chavões do costume; e
também no facto miraculoso de cada português ficar, depois de 2015, com o seu
próprio deputado. Claro que esta “ideia” é uma salada de ideias trazidas do
estrangeiro, que não nos servem e já se demonstrou que não nos servem.
O círculo uninominal não impede que a intriga
fervilhe, como fervilha agora, embora com novos beneficiários. O voto do patrão
da pequena ou da grande empresa (rural, industrial ou de serviços) e dos
grandes funcionários do Estado passará a valer mais do que um voto e daí se
escorregará depressa para um comércio de voto generalizado. Votar no A ou votar
no B exige um minucioso tráfego de influência e uma larga troca de favores. Em
vez das clientelas dos partidos, mesmo assim relativamente poucos e com um
chefe conhecido à frente, virão os “donos disto tudo”, sem nome e sem cara, que
puxam pelos cordões na sombra. O sufrágio uninominal seria o fim da democracia,
até da escassa democracia que os portugueses por enquanto gozam. Só Seguro não
percebe.
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