Deu há dias,
em mais uma reposição, o filme de Robert Aldrich, de 1967, leio na Internet,
com Lee Marvin no principal papel – o de um entroncado Major do Exército
Americano, encarregado de treinar um bando de condenados para uma missão
suicida contra o exército germânico, durante a II Guerra Mundial, o que lhes
dará a possibilidade de se livrarem das respectivas condenações, algumas das
quais à morte. Um filme divertido, que revela espírito de rebeldia mas também a
coragem que em muitos outros filmes da luta americana transparece como mensagem
de um país poderoso, à imagem do povo viril e orgulhoso do seu poder, que bastas
vezes acorreu em auxílio do Ocidente, não apenas por zelo de fraternidade, mas
para criar barreiras à expansão de ideologias avassaladoras, destrutivas da
liberdade humana. Grande parte das vezes, todavia, os interesses económicos dominadores
presidem aos seus objectivos de ambiguidade e sofisma.
Tal como os
actores americanos dos filmes estadunidenses de guerra, denunciadores da
dimensão orgulhosa de um povo e uma nação, Barack Obama apresentou-se
garbosamente nos centros europeus, pisando o chão com a autoridade do possuidor
de um vasto chão, e transportando a sua mensagem da necessidade de punir os
criminosos que mataram com arsenal químico, embora desconhecendo a autoria dos
matadores. Tal como em tempos se fizera, nas alturas de Bush e de Saddam Hussein…
Também
Obama se apresenta como o Jeová bíblico, tantas vezes castigador e dizimador,
por conta da purificação dos costumes, embora sem resultados práticos. Vasco
Pulido Valente várias vezes tem mostrado os cordéis que movem as políticas
americanas ou outras, neste caso particular.
O artigo de 1 de Setembro «Uma guerra absurda», a que se seguirá,
em 6 de Setembro “A ilusão de Obama”, mostra bem a preocupação que uma
atitude de “força” ocidental poderá acarretar para o mundo inteiro:
«Uma
guerra absurda»
«Cameron foi proibido pela Câmara dos
Comuns de intervir na Síria por meios militares. Trinta deputados do Partido
Conservador votaram contra o Governo e também nove deputados do outro partido
da coligação. Cameron disse que tinha compreendido a ordem do povo e declarou
que lhe obedeceria. Nunca tinha acontecido antes, que um primeiro-ministro
perdesse uma votação quando se tratava de decidir entre a guerra e a paz.
Sucedeu agora. Apesar de uma crescente dependência e disciplina, ainda
apareceram nos grupos parlamentares 40 indivíduos que seguiram a sua opinião (e
a sua consciência), em vez de seguirem obedientemente a política do seu chefe e
senhor. A lição que a Câmara dos Comuns deu a Cameron não seria possível em
Portugal. Em Portugal, a Assembleia da República faz tudo o que lhe mandam.
E assim Obama ficou sozinho. E por
culpa dele. Primeiro, resolveu estabelecer perante o mundo a famigerada “red
line” contra o uso de gás. A seguir, ameaçou com uma intervenção, como se não
precisasse de um mandado da ONU ou sequer de esperar pelos peritos que foram à
Síria. E, no fim, acabou internacionalmente isolado, sem o apoio dos países do
Médio Oriente (tirando Israel), sem o apoio da “Europa” (tirando a França) e
sem apoio do próprio Canadá. Vai meter a América numa nova aventura (mais
perigosa sdo que a do Iraque e a do Afeganistão), acompanhado apenas pelo sr.
Erdogan da Turquia e pela Arábia Saudita, dois parceiros que não se recomendam.
O comportamento errático de Obama e as dezenas de erros que cometeu comprometem
um mandato estimável e provavelmente acabarão por inutilizar o segundo.
Pior do que isso, Obama não pretende
liquidar o regime de Assad (até porque não existe na Síria uma oposição capaz
de o substituir) e sabe muito bem que um “ataque cirúrgico” não mudará em nada
a situação estratégica. O que ele quer é castigar Assad pelo crime de matar com
gás 1400 pessoas (4oo crianças) e, julga ele, impedir que o caso se repita. OP
prestígio da América está em jogo, pensam loucamente os serviçais da Casa
Branca e Obama imagina que uma pequena intervenção da América não trará
consequências de maior. No que se engana: uma violenta retaliação de Assad é
susceptível de sublevar o Médio Oriente inteiro e, em última análise, empurrar
a América para uma longa, frívola e mortífera campanha. Que o sr. Hollande,
impotente e desarmado, se alivie de algumas cretinices que pesam no seu doce
coração não interessa muito. Mas que Obama o imite é com certeza catastrófico.»
Que a
guerra contra o governo de Assad é absurda, não parece duvidoso. A maioria dos
povos é contra, com medo das consequências sobre o mundo. Mas todas as guerras
são absurdas, já o disse Pessoa no “Menino de sua mãe”, ou António Botto
em “Baionetas de morte”. Ou mesmo Nicolau Tolentino na sátira "A Guerra", ou Vieira... Tantos! Mas as baionetas são material bélico ultrapassado,
a guerra agora é espectáculo aéreo que os média gostarão de divulgar. Além
disso, os versos de Botto ou de Pessoa não chegam aos olhos de Obama. Tampouco
dos jornalistas. São mais de doze os patifes:
...Louvar a guerra? - Loucura
...Que é preciso arrancar
...De quem a quiser sentir!
...A humanidade não deve
...Atraiçoar a razão
...Fundamental de existir.
.
...Punhais, espadas, metralha,
...Tudo isso para quê,
...Se a vida pode ser bela?
...- O homem à luz do amor
...Chegaria ao infinito
...Para tocar uma estrela!
.
...Viver na lama sinistra
...De uma trincheira atascada
...De mortos e podridão,
...É perder a consciência
...Do que vale para a vida
...Ter no peito um coração.
.
...Morrem cem mil? Não importa?
...Em nome da Pátria, quantas
...Infames negociações!
...Soluços! Caem por terra
...Nas lágrimas dos vencidos
...As mais altas ilusões.
.
...Conquistar novas bandeiras,
...Chegar além!..., Mais além!...,
...Matar, impor, destruir,
...É tombar, ingloriamente,
...Na maravilha fatal
...Do eterno Alcácer-Quibir!
in "Baionetas da Morte"
de António Botto, ed. 1936
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