terça-feira, 11 de fevereiro de 2014

Amor… ai!



Numa Terra que se desterra
Invadida pelas águas
Do mar revolto,
Pelos ventos sibilantes
Do céu inclemente,
Procurámos numa qualquer fábula de antigamente
Algo que nos desviasse a atenção
De tanta aflição
Que vai por esse mundo fora,
Que desse, sem demora,
Alguma calma à nossa alma
Que chora.
Encontrámos em La Fontaine
Uma história de Cupido,
Que poderia ser algo de divertido
Por ser ele o deus do Amor
Encantador.
Mas o conto divertido
Revelou - na sua alegoria humanista,
Que nela enfia
Os deuses olímpicos para melhor dimensionar
A psicologia mista
Da humana condição -
Ser um cliché de efeitos trágicos e cómicos
Que simboliza o Amor, afinal,
Na sua estranha realização,
Sempre amalgamado na perversão
Dos muitos sentimentos
Que ora o engrandecem
Ora o envilecem.
Donde a conclusão
De que a Loucura da alegoria
- Ou não -
É seu guia.

«O Amor e a Loucura»
«Tudo é mistério no Amor,
As suas flechas, a sua aljava, a sua infância
Que Cupido tão gentilmente simboliza:
Não é obra para um só um dia
Esgotar esta ciência.
Não pretendo, pois, aqui tudo explicar:
O meu intuito é somente
À minha maneira contar
Como é que um cego – um Deus -
Perdeu a luz,
Que sequelas teve este mal
Que provavelmente até foi um bem:
Disso qualquer amante será juiz,
Não me compete a mim decidir.
A Loucura e o Amor brincavam
De companhia.
Este não fora ainda
Dos seus olhos privado.
Uma disputa se engendrou,
Enlouquecedora,
Bem própria do Amor e da Loucura.
O Amor exigiu
Que o conselho dos deuses fosse reunido,
A outra perdeu a paciência.
Um bofetão lhe deu
Tão esforçado
Que a luz dos olhos aquele a perdeu.
Vénus exigiu vingança
Sem mais detença.
Mulher e mãe,
Bem podemos imaginar a gritaria
Que ela faria.
Os deuses ficaram
Atordoados:
Júpiter, Némesis, os Juízes do Inferno,
Enfim, toda a confraria.
Vénus declarou a enormidade do caso:
Sem cajado,
Seu filho não poderia dar um passo.
Nenhum castigo era bastante
Para crime tão indecente.
O prejuízo tinha que ser reparado.
Após tudo bem considerado –
- O interesse do Público, o da Parte pessoal,
A decisão, enfim, do Supremo Tribunal
Foi, sem mais clamor,
A de condenar a Loucura
A servir de guia
Ao Amor.»

Mas se fosse hoje-em-dia,
Onde é que La Fontaine acharia
Loucura suficiente
Para o Amor descrever
De modo eficiente?
Não nos clássicos, certamente.

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