A ocultação não é para findar
Coisas bem graves as citadas no artigo de João César das Neves -A
OCULTAÇÃO DE INTERESSES-publicado no
blog “A Bem da Nação: “A geração da revolução
concedeu a si mesma reformas superiores aos descontos e financeiramente
insustentáveis”. “Leis criadas para nos defender são a origem do problema”. Está em fábula, sobre imprevidência. Foi desmedida
ambição – mais pessoal do que altruística - a que nos fez mergulhar no saco
azul do bolo enorme, além de estupidez inqualificável e criminosa de desconhecimento
aritmético. Não, a imagem que temos de nós nesta questão não pode ser senão
negativíssima. E o resultado vê-se diariamente, nos media como por aí.
«A OCULTAÇÃO DE INTERESSES»
«O presidente da RTP referiu
recentemente (Notícias TV, 31 de Janeiro) que a empresa tem trabalhadores que
não fazem nada. Pouco depois um jovem perguntou-me como se conseguia tais
empregos, que considerava adequados para si. Expliquei-lhe que se assinava um
contrato de trabalho, mas fui logo interrompido. "Contrato de
trabalho?" disse o rapaz: "Isso hoje não existe."
Esta é a face negra da
realidade que o Dr. Alberto da Ponte indicou. A geração do 25 de Abril concebeu
generosamente leis para defender os direitos dos trabalhadores. As intenções
eram boas, mas esqueceu-se de que lidava com seres humanos. Quando um
funcionário sabe que a sua situação não depende da contribuição que dá à
empresa, irá naturalmente fazer o menos possível. Em consequência o patrão
reagirá a essa circunstância, evitando naturalmente o contrato. Entretanto os
privilégios originais, escudados na lei, são fáceis de defender, mesmo perante
fortes medidas de ajustamento. Por exemplo, a mesma RTP tenta agora corrigir o
excesso de empregados através de processos de rescisão voluntária. Mas, como
explicou o ex-director de informação Paulo Ferreira (Dinheiro Vivo, 30 de
Outubro), têm saído os talentosos e ficado os menos capazes.
Tudo isto é natural e
compreensível mas a consequência é a enorme desigualdade actual entre
trabalhadores protegidos e vulneráveis. Este facto, um dos elementos mais
vastos e influentes do nosso mercado de trabalho, é também o mais escamoteado e
oculto. Nos discursos e declarações usam-se teorias, zangas, acusações e
conspirações, para esconder a perversão de um sistema que se pretendia
benevolente. O regime realmente não defende os trabalhadores, mas alguns
trabalhadores. Estes episódios da RTP manifestam um dos grandes bloqueios
nacionais e mostram como ele é camuflado na opinião pública. Segundo a versão
oficial, os dois responsáveis da televisão foram agressores injustos, sendo
devidamente insultados e, num dos casos, perdendo até o posto. As vítimas são
os trabalhadores da estação. O que é estranho, pois a única forma de se
sentirem atingidos seria admitir não fazer nada ou ser incapazes. Em qualquer
caso nunca se fala dos verdadeiros prejudicados, contribuintes, espectadores e
jovens como o meu amigo. Assim se dissimula o privilégio que as declarações
denunciam.
As diferenças de
prerrogativas são sectoriais e estatutárias mas, acima de tudo, etárias. Como o
processo ainda tem poucas décadas, a disparidade acaba por se manifestar num
fosso geracional. Os mais velhos, contratados nos primeiros anos do regime, ainda
gozam das regalias originais, que já não puderam ser estendidas aos seus
filhos. Deste modo se criou precariedade laboral, sobretudo nos jovens,
enquanto os mais idosos estão seguros. O mesmo tema surge noutras áreas, como o
corte nas pensões. A geração da revolução concedeu a si mesma reformas
superiores aos descontos e financeiramente insustentáveis. O desequilíbrio
tornou-se imparável e a redução inevitável. A indignação pelas medidas
recentes é razoável e genuína, mas a culpa é menos da troika e do Governo que
das leis irrealistas que criaram o défice. Os jovens, que pagam hoje e
nunca terão tais receitas quando forem velhos são também aqui vítimas das boas
intenções legais.
Por baixo destes e de muitos
outros casos está o problema central da crise, escondido sob raivas e
discussões. Quando, em nome de direitos e garantias, se estabelecem benefícios
exagerados e injustificáveis, a própria lei torna-se injusta. As duas décadas
de euforia endividada foram férteis em casos destes. Agora o nosso desenvolvimento
está, não só soterrado em dívida, mas travado por interesses instalados.
Leis criadas para nos
defender são a origem do problema. A liberalização da troika não provém de
maldade ou ideologia, mas dos bloqueios e vítimas que esses benefícios geram, e
muitos tentam esconder. É curioso que estes casos surjam na RTP que, juntamente
com as outras televisões, tem sido veículo para a grande operação de ocultação
dos interesses.» 7 de Fevereiro de 2014
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