segunda-feira, 23 de dezembro de 2013

Razões, alvitres… nada



É justo que Vasco Pulido Valente escreva sobre Passos Coelho como escreve. É inteligente e sabe traçar o perfil, como tantos fazem, do homem que não se compromete, que é duro no caminho que traçou, que é inconsequente e inconsistente nas afirmações que faz. Todos nós queremos respostas imediatas sobre as expectativas que ora são criadas, ora são desfeitas, sabendo nós que o pobre Passos Coelho gira ao sabor das ondas que lhe são impostas, e no interesse primeiro de se desfazer de uma dívida sem o que, ficaremos de mãos e pés e corpo atados para prosseguir num caminho de escrúpulo e rectidão de que nunca deveríamos ter saído. Mas entristece-me que Vasco Pulido Valente não demonstre mais compreensão na defesa de um homem que, ao que parece, foi imprescindível na libertação de um país afundado na iniquidade, e alinhe na violência e garotice dos que o vão cravejando com as suas setas venenosas, muito sabedores, pouco generosos, não querendo compreender, parecendo ficar extasiados com as descobertas das suas próprias inteligências sobre os procedimentos dos do governo, que logo definem como ridículas ou de ocultos propósitos eleitorais, em tudo vendo inépcia e crime, felizes nas suas definições e nas suas troças, sem reflectir que as dívidas são para se pagar, por muito que as directivas europeias pareçam injustas, violentas e discriminatórias, e que é esse o propósito primeiro de políticas que visam dar credibilidade ao país para que se possam aplicar as do desenvolvimento e da desobstrução.
Todos nos extasiámos por o Tribunal de Contas ter chumbado a proposta do corte orçamental que Passos Coelho se propunha efectuar. Mas já muitos se encarniçam à volta da próxima alternativa governativa para satisfazer o compromisso salvador da nossa estabilidade, dispostos a preteri-la, com manobras de arreganho para fazer rolar as cabeças cimeiras e mutilar mais o país. É ouvi-los e vê-los, cheios de razões de violência contra os governantes, num vomitório sem nexo, pois sabem bem quanto são falazes os discursos de vitupério nas condições que vivemos, de exigência de pagamento pelos do FMI, sem cedências de facilitação!
Por isso, o artigo de Vasco Pulido Valente, - “O futuro a Deus pertence – por muito certeiro que pareça na caracterização do PM e das suas reticências esclarecedoras ou atitudes ambíguas de animal acossado e manietado, segue uma via de negativismo com igual efeito perverso ao da dos demais difamadores, cego às consequências destrutivas de um edifício pátrio assente sobre alicerces periclitantes e que, ao que parece, preferimos ver tombar de vez, no inchaço do nosso exibicionismo palreiro ou da nossa avidez de comando. Saiu no “Público”, em 14/12:
«Assisti anteontem, com grande dedicação profissional, e grande paciência, à entrevista do sr. primeiro-ministro à TSF e à TVI. E assisti também ao parlatório das cabecinhas de serviço, que tentaram extrair um vestígio de sentido ao que tinha sido dito e redito pelo nosso adorado guia.
Mas Pedro Passos Coelho, com o seu arzinho de menino que aprendeu bem a lição, não saiu da cartilha do costume, provavelmente para não se meter em mais sarilhos, daqueles que o PS gosta de rilhar no seu covil. Com a maior prudência, não prometeu nada, não explicou nada e nem sequer previu fosse o que fosse. Ficou no quarto escuro da banalidade ou da irrelevância e levou o país com ele; nem uma luzinha, bruxuleante ou não, brilhou naquela deprimente melancolia. O PSD retirou deste estado semicomatoso que o homem estava calmo.
Às perguntas substanciais, Pedro Passos Coelho respondeu sempre que o futuro a Deus pertence. As decisões do Tribunal Constitucional pertencem a Deus, como o défice e a dívida, como o crescimento, como o programa cautelar, como a vida da gente que anda por aí sem vida. O Altíssimo, a seu tempo, resolverá tudo e ele, um simples primeiro ministro, não quer exceder as suas competências. Deixou, por exemplo, de embirrar com o Tribunal Constitucional, coisa que sem dúvida, o tribunal lhe agradece desvanecido. Não comentou a política do dr. Cavaco, ou a ausência dela, para não tocar em tão alta e veneranda personagem. Até o comportamento errático da srª Christine Lagarde não lhe mereceu mais do que o adjectivo moderado de “estranho”, como se a senhora aparecesse com um chapéu novo ou o desafiasse para um passeio a Sintra.
Nem a pequena intriga partidária em que se criou conseguiu que ele acordasse para a realidade. Acha Rui Rio e o resto dos protestatários do partido um magnífico “activo” a não perder. E acha prematuro que se discutam agora as “listas” para a Europa. As relações dele com Paulo Portas são hoje um mar de rosas: nem Portas lhe tenciona criar o mais vago problema; nem ele a Portas. Principalmente a propósito de algumas sinecuras sem consequência. Quanto ao resto, o primeiro ministro pensa que este seu mandato consolidou as finanças, modernizou a economia e nos preparou para voos que espantarão o mundo. Existe, é claro, a difícil questão do desemprego e da miséria geral. Mas basta saber somar e subtrair, como assevera o dr. Medina Carreira: onde imaginava a pátria que ele podia arranjar o dinheiro, senão nos bolsos de quem o tinha? E com certeza um dia destes desaparece: o futuro a Deus pertence.
“Arranjar o dinheiro, senão nos bolsos de quem o tinha”: pergunto-me o que fariam o Dr. Medina Carreira ou o Dr. Vasco Pulido Valente e todos os mais doutores arengadores onde iriam eles colher o dinheiro, que artes e manhas seguiriam, caso fossem governo, a não ser aos bolsos dos contribuintes.
A difícil questão do desemprego e da miséria geral”: não vale a pena empolar tanto a questão da miséria, num país de tantos carros e de carrinhos de supermercado abarrotando, a qualquer hora. Quanto ao desemprego, é bem um fenómeno geral, tem a ver com uma conjuntura mundial migratória também, de povos fugindo às suas próprias misérias. No nosso caso, tem a ver com a velha dívida a pagar. Voltamos ao mesmo.

Nenhum comentário: