«O coração tem razões que a razão desconhece»,
disse-o Pascal e eu repito, para comentar com eficácia racional a argumentação
de João Miguel Tavares a respeito do obstáculo posto pelo PS à exigência
do PSD, de transparência na questão da referida troca de mensagens entre Carlos
César e Mário Centeno. Na sua qualidade de jornalista, mas também na
de cidadão de olhos abertos e de defensor, para o nosso país, de princípios de
inteireza moral, João Miguel Tavares ataca o PS, que põe obstáculos a que a
verdade se apure.
Eu julgo que António Costa e os seus acólitos, em vez
das razões pedidas, ditadas por um espírito cartesiano, que tem a ver com os
meandros cerebrais, envereda pelas vias da sua habitual finura política,
condicionada pelos impulsos sanguíneos do seu batimento cardíaco em
concomitância, é certo, com as razões da sua razão voluptuosa do poder.
Eu só acho que, quanto a isso, nada temos a esperar,
hélas! nem de uns nem de outros. Já desde os primórdios do 25 de Abril se ouvia
falar de transparência, com muita severidade de exigência, acusando-se o regime
anterior de falta dela. Os princípios da moral não estão consignados na
Constituição como regras a cumprir-se. E mesmo que estivessem! Somos povo
pacífico, não de finesse mas de finura na arte de escapar às exigências da
moral. Daí que quem está no poder se favoreça, com os seus biscates de
governança segundo a tal finura eficaz, que proporciona tranquilidade na rede do
poder estabelecido.
Democracia?
Julgo que é sempre a ditadura que nos comanda, mesmo no rotativismo dos
partidos no poder. Tudo como dantes… Aliás, neste momento, é o povo quem mais
ordena dentro da nossa cidade. E estamos a preparar alunos nas escolas para que
seja pior ainda o nosso caos futuro.
De que tem medo o PS?
João Miguel Tavares
Público, 18 de Fevereiro
Confrontado
com o anúncio da constituição de uma nova comissão de inquérito à CGD, desta
vez abarcando o período de administração de António Domingues, o Partido
Socialista respondeu de imediato com um ataque preventivo. Carlos César afirmou
que o PS não irá aceitar diligências numa futura comissão que desrespeitem “o
que diz a constituição”, pois “o cumprimento da lei não está confinado às
circunstâncias políticas”. Adoro quando os políticos enchem a boca de grandes
princípios apenas para justificar intenções rasteiras. Traduzindo por miúdos,
aquilo que César quer dizer é apenas isto: o PS vai fazer tudo o que
estiver ao seu alcance para que nunca seja conhecida a troca de SMS entre
António Domingues e Mário Centeno.
Ora
, até mesmo para quem, como eu, acredita que o que aconteceu na Caixa foi
uma série de equívocos que acabaram por tomar uma dimensão catastrófica, e que
no inicio deste processo ninguém estava realmente mal-intencionado, este fechar
de linhas do PS em torno de Centeno(e de Costa? E de Marcelo?), com o auxilio
do Bloco e do PCP, querendo impedir a todo o custo um direito de escrutínio e
vigilância que é obviamente uma das tarefas fulcrais do Parlamento, já começa a
pisar a linha vermelha daquilo que é
democraticamente aceitável. Como
ontem lembrou o CDS, ainda há uma semana o PS garantia, todo impante,
que as acusações que recaíam sobre o ministro das Finanças eram uma “montanha
que pariu um rato”. Há dois dias, quando o PSD e CDS viram bloqueada a sua tentativa
de aceder aos SMS, com o argumento de que a actual comissão de inquérito não se
debruçava sobre a administração de António Domingues, Carlos César convidou a
direita a criar uma nova comissão protestativa, para averiguar esse período.
Agora que essa comissão é anunciada, regressa o argumento de que o acesso a
comunicações privadas é inconstitucional.
Comunicações
privadas? Mas quais comunicações privadas? Trocas de SMS sobre assuntos do
Estado, entre o presidente de um banco público e o ministro das Finanças, são
comunicações privadas porquê? Por serem feitas por um telemóvel muito
provavelmente pago com os nossos impostos? E por mail já não são privadas? Num
smartphone de última geração, qual é realmente a diferença entre um mail e um
SMS? Ou ainda se exige papel de 25 linhas, carta registada e o timbre do
Ministério das Finanças para uma comunicação ser declarada como oficial? Esta
discussão é patética. Só falta o PS invocar Marshall McLuhan e fazer
cartazes a anunciar: ”O meio é a mensagem”. Sim, o PSD e o CDS
agarram-se à Caixa por politiquice, porque encontraram uma brecha na muralha
governativa fácil de atacar, ainda que o assunto tenha pouca relevância para o
futuro do país. Chama-se a isso “estar na oposição”.
Mas
aquilo que o PS está a fazer chama-se obstrução política, uma
espécie de filibuster “tuga” com o único objectivo de impedir que o Parlamento
e os portugueses saibam aquilo que têm o direito de saber. Mais: tendo em conta
os seis anos de José Sócrates, e a opção de António Costa em reintegrar vários
dos seus ministros, o PS tem particulares responsabilidades em questões de
transparência.
António
Costa não é, felizmente, nem Sócrates, nem na seriedade, nem no modo de fazer
política. Mas esta atitude do PS, e este seu nível de argumentação, é
igualzinho àquele que tivemos de suportar entre 2005 e 2011. Mais disso
não, muito obrigado. Já chega. Quanto mais o PS quer esconder, mais nós
queremos saber.
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