Um artigo valioso, o que segue, de Teresa Serafim, sobre Encelado
e a descoberta de água líquida e condições de vida nessa lua de Saturno, mais
uma história da infinita capacidade humana de inteligência e pesquisa que nos
levam sei lá onde de descoberta e comportamentos.
Contou ontem a minha irmã que viu e leu num telemóvel, na sua casa, uma
gravação de uma canção, de letra e música compostas – e executadas - pelo seu
neto André, no seu quarto, cá, e o seu irmão David, acompanhando-o musicalmente,
em simultâneo, na Dinamarca. Soltámos os nossos espantos sobre o engenho
humano, sucessivamente revelado nestas realizações cada vez mais
extraordinárias que mostram que já não há distâncias, como, de resto, o próprio
Skype já nos mostrara e a Internet o faz a cada passo. Só o enternecimento da minha irmã perante a beleza do que escutara, ou os
comentários maliciosos ou trágicos da nossa amiga é que nos parecem terreno
conhecido. E os nossos espantos também, é claro, vindos de todos os tempos, nas manifestações humanas naturais ou recriadas através da arte.
Leiamos o artigo de Teresa Serafim, que nos deixa boquiabertos. Que mais nos irá suceder de maravilha "por mares nunca dantes navegados"?
Por que é que a lua
Encelado tem um oceano (escondido) de água líquida?
Uma equipa de cientistas juntou todas as peças das descobertas feitas
sobre Encelado e explica a razão da existência de um oceano líquido nesta lua
de Saturno.
10 de Novembro de 2017
Está na hora de sairmos
do planeta Terra e navegarmos até ao sistema de Saturno. O
planeta orelhudo tem uma lua que nos tem suscitado interesse há já muito
tempo. Chama-se Encelado e é uma pequena bola de 500 quilómetros
de diâmetro com um núcleo rochoso e coberta por uma camada de gelo. Além
disso, e é isso que faz dela uma lua especial, tem água líquida, uma das
condições consideradas essenciais para a existência de vida. Mas o que
permite que Encelado tenha um oceano de água líquida? Um novo estudo, na revista
científica Nature Astronomy, refere que é tudo uma questão de “puxões”
provocados pela gravidade de Saturno, ou seja, um efeito de maré.
Já sabemos que esta lua
existe desde 1789, quando o astrónomo inglês William Herschel a
descobriu. Deu-lhe o nome de Encelado, um dos gigantes da mitologia
grega. Este era considerado o gigante mais fraco, mas o mais inteligente.
Mitologias à parte, Encelado é uma lua interessante. Tivemos imagens
marcantes dela nos anos 80 com a missão Voyager. Mas foi com a Cassini,
uma missão conjunta da NASA, da Agência Espacial Europeia (ESA) e da Agência
Espacial Italiana, que partimos à descoberta do que Saturno nos escondia e,
claro, de Encelado.
A viagem da Cassini
terminou este ano, com um mergulho de despedida em Setembro em direcção ao
planeta, e muito contribuiu para o conhecimento desta lua. Uma série de voos
aproximados a Encelado começou em 2005 e um deles fez-se mesmo a cerca de 50
quilómetros de distância. Percebemos assim que Encelado era muito
complexa a nível geológico: tem um oceano de água salgada onde há actividade
hidrotermal; uma camada gelada de 20 a 25 quilómetros de espessura (no pólo Sul
tem entre um e cinco quilómetros); uma fonte de calor; e compostos orgânicos.
Condições semelhantes a estas existem também aqui na Terra, nas fontes
hidrotermais e nos vulcões de lama submarinos, que permitem à vida existir na
ausência de luz solar.
Outra das imagens (e
descobertas) foram jactos a sair no pólo Sul, lançados no espaço e que têm
vapor de água e moléculas de dióxido de carbono, azoto, metano, amoníaco e
outros compostos orgânicos, assim como por “grãozinhos” de gelo. Por exemplo,
alguns grãozinhos produzidos em Encelado foram parar um dos anéis de Saturno, o
no anel E.
Mas o que faz com que
Encelado tenha estas condições e que se torne assim propícia a ter vida?
Agora, pela primeira
vez, um estudo junta as peças todas e constrói um “puzzle” que liga o
oceano que existe por toda a lua, o aquecimento interno de Encelado, o gelo
mais fino no pólo Sul e a actividade hidrotermal. As primeiras pistas vieram do
material que saía dos jactos, que incluía sais e grãos de sílica, o que sugeria
que se formavam na presença de água muito quente (pelo menos a 90 graus
Celsius), através da interacção entre a água e a rocha porosa do núcleo.
“Estas observações requerem uma grande fonte de calor, cerca de 100 vezes
maior do que é expectável pelo decaimento natural dos elementos radioactivos
nas rochas do núcleo”, lê-se num comunicado sobre o trabalho.
A equipa concluiu que é o
efeito de maré provocado por Saturno que origina os jactos, que por sua vez
deformam a camada de gelo. Simulações realizadas pela equipa, que tem
cientistas da Europa e Estados Unidos, permitiram perceber que o núcleo tem uma
rocha solta, com 20 a 30% de espaços vazios. Esses espaços permitem assim que a
água do oceano entre no interior do núcleo e seja aquecida. Esta actividade
hidrotermal pode atingir o seu máximo nos pólos. Afinal, é aí que a água vinda
do interior é emanada através dos jactos.
“Tem sido sempre um mistério onde é que
Encelado obtém energia contínua para permanecer activa, mas agora examinámos em
grande detalhe como é que a estrutura e a composição do núcleo de rocha da lua
podem ter um papel-chave na geração da energia necessária”, diz o principal
autor do artigo científico, Gaël Choblet, da Universidade de Nantes (França). Mas
a energia produzida graças ao efeito de maré pode não ser suficiente para
manter o oceano líquido, que poderá congelar dentro de 30 milhões de anos,
refere o comunicado.
Os cientistas ainda não
conseguem explicar a diferença entre o pólo Sul e o pólo Norte. Por isso, dizem
que é preciso mais investigação para perceber o que os jactos contêm, assim
como para descobrir se há vida nesta lua. “Futuras missões que analisem as
moléculas orgânicas na pluma de Encelado, com uma precisão maior do que a
Cassini, poderão revelar-nos se as condições hidrotermais podem permitir que a
vida surja”, considera Nicolas Altobelli, cientista da ESA que participou na
missão Cassini (e que não fez parte deste trabalho).
Ler mais:
Os cientistas e
engenheiros da NASA já estão a conceber um novo aparelho que capta ondas
submilimétricas – o Submilimeter Enceladus Life Fundamentals Instrument (ou
SELFI), para um dia ir a bordo de uma sonda estudar a composição do vapor de
água e das partículas de gelo lançadas pelos jactos de Encelado. Através do
estudo dessas plumas, os cientistas acreditam que podem extrapolar qual é a
composição do oceano que se encontra por baixo da crosta de gelo e que pode ter
vida extraterrestre. “O vapor de água e outras moléculas podem revelar alguma
da química do oceano e ajudar a encontrar a melhor trajectória para uma sonda
espacial através das plumas, para fazer mais medições directas”, explica Gordon
Chin, cientista da NASA.
E, mais uma vez, surge a
questão: terá esta lua com nome de gigante alguma forma de vida? E, a existir,
como será ela?
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