Foi tema das nossas conversas de
ontem, domingo, no café com a minha amiga e com a minha irmã, o prémio que
Carlos do Carmo recebeu. Recordámos outras vozes de excelência, como a de Adelaide
Ferreira, de Lara Li, de Vítor Espadinha, até mesmo a de Maria Guinot do “Silêncio
e tanta gente”, merecedores de prémios internacionais, além dos nacionais, e
lamentámos o seu afastamento dos palcos televisivos, vã a glória que o tempo
concede, se não trabalharmos para ela. Carlos do Carmo trabalhara e obtivera e
os jornais deram cobertura devida ao prémio “Grammy” que recebeu, mérito seu,
talvez, embora nestas coisas a máquina publicitária seja imprescindível.
Quantos prémios não mereceria a nossa Amália com a sua voz única! Mas o que
importa são os discos que permitem a sua imortalidade e a de todos os outros,
nacionais e estrangeiros, que foram e vão embelezando os dias que por nós
passam.
Mas no DN deste domingo, 6/7,
encontrei “O nosso fado”, da crónica de Alberto Gonçalves que no seu tom
faceto desmistifica todo o empolamento à roda do prémio Grammy e da exaltação que
ele mereceu, como girândola disparada de longe, para nossa glória:
«O
nosso fado»
por ALBERTO GONÇALVES
Mal se soube que o sr. Carlos do Carmo recebera o prémio de
uma associação americana, surgiram as reacções. Uma figura alegórica que passou
pela secretaria de Estado da "Cultura" e gosta de assinar petições em
nome da dita correu a afirmar que o sr. Carlos do Carmo é "um símbolo de
tradição e inovação no património do fado". Uma senhora que dirige um
Museu do Fado falou em "distinção" justa e "inédita no panorama
nacional". António Victorino d"Almeida lamentou que os artistas
portugueses não sejam bem tratados por cá, e consolou-se por serem
"devidamente reconhecidos internacionalmente". Um fadista avulso
ficou contente porque é "amigo do Carlos" e porque o Carlos
"cria imagens com as palavras que diz". O impagável António Costa não
podia falhar os louvores: o prémio "é um novo e decisivo contributo"
para a internacionalização do fado que "enche ainda mais de orgulho a
cidade" de Lisboa. Por fim, o próprio sr. Carlos do Carmo contou que, no
telefonema em que o informaram do prémio - "uma loucura" -, também
foi informado de que é "um dos seis melhores cantores vivos do mundo".
Entre tanta excitação, ninguém se lembrou de explicar
devagarinho que o prémio em questão é um Grammy, ou, mais específica e ainda
mais embaraçosamente, um Grammy latino. Os Grammys normais, atribuídos pela
indústria fonográfica dos EUA, possuem dezenas de categorias e celebram centenas
de músicos por ano, dos ocasionais bons aos atrozes em abundância. Os Grammys
latinos, decididos por uma subdivisão daquela indústria, procedem de igual
forma, com a agravante de que o seu universo está limitado aos países de língua
espanhola e, não faço ideia a que título, portuguesa.
Se os Grammys a sério são justamente considerados os
galardões menos relevantes desde o III Torneio de Futsal Juvenil do Bombarral,
os Grammys latinos nem aos calcanhares do Bombarralense chegam. Em cada cerimónia,
resmas de brasileiros, venezuelanos, dominicanos, colombianos e porto-riquenhos
arrecadam distinções tão prestigiantes quanto a de Melhor Disco de Música
Ranchera e Melhor Disco de Música Sertaneja. Prodígios como Enrique Iglésias,
Shakira, Ricky Martin, Ivete Sangalo e o duo Chitãozinho & Xororó já
mereceram a honra que agora coube ao sr. Carlos do Carmo.
Não se trata de avaliar as qualidades artísticas do homem:
trata-se de perceber que os Grammys não atestam qualidade nenhuma. No máximo,
atestam que inúmeros habitantes de um país periférico não têm nenhuma noção do
ridículo e, na sua quase terna rusticidade, tomam as migalhas alheias por um
banquete caseiro. Numa tentativa de elevar o grau de pureza da patetice, houve
até quem procurasse uma polémica no facto de, ao contrário dos seus
antecessores, Cavaco Silva não felicitar o sr. Carlos do Carmo. Um chefe de
Estado congratular alguém por um Grammy? Isso sim, justificaria um prémio. Do
Guiness Book, secção Rituais do Terceiro Mundo.
Mas Alberto Gonçalves outros temas explorou na sua página de
domingo. Entre esses, “Direitos Humanos” sobre o uso da burka condenado
pelo Tribunal Internacional de Direitos do Homem, violenta sátira contra os
falsos pregadores do multiculturalismo permissivo do crime alheio, como direito
próprio, embora condenatório das violências nacionais, e os quais, pelos seus posicionamentos
contraditórios no conceito de “direitos”, deveriam estar deles excluídos:
Direitos humanos
A propósito da
decisão do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem, que acabou de legitimar a
proibição do véu integral em França, deixem-me esquecer que a obrigatoriedade
de semelhante artefacto nem sequer consta do Corão, que obviamente impõe às
mulheres uma condição subalterna, que representa uma recusa de assimilação nas
sociedades que acolhem imigrantes muçulmanos e que, mais prosaicamente, coloca
problemas pertinentes em matéria de identificação e segurança.
Dito isto, acho
que as seguidoras de Alá deveriam ter todo o direito de usar véu, como os
seguidores de Gaia deveriam ter todo o direito de envergar apenas florzinhas
nas partes baixas. Naturalmente, qualquer outra pessoa também deveria ter todo
o direito em recusar emprego, aluguer de imóveis, conversa e serviços em geral
às senhoras que usam véu, aos familiares das senhoras que usam véu, aos
seguidores de Gaia e, no fundo, a quem entenderem. Já os campeões do
"multiculturalismo", que compreendem nos outros as rodilhas, a
apostasia e a mutilação genital e condenam cá dentro a violência doméstica, a
angústia dos LGBT e a influência da Igreja - esses não deveriam ter direito
nenhum.
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