Costumo ouvir as entrevistas a Marcelo, na TVI de
domingo à noite. Geralmente dizem-se coisas sábias, chorei a valer com a notícia
chocante, numa análise contida na emoção e revolta, dele e de José Alberto de
Carvalho, acerca da perda que sofrera a sua entrevistadora anterior, Judite de Sousa. Admiro a rapidez de raciocínio
que Rebelo de Sousa demonstra nas entrevistas profusas em assuntos, com, ainda,
o pormenor dos livros referidos, mais as perguntas dos ouvintes, mais as coisas positivas
que ele descobre neste país e que nos dão alegria... A minha mãe não o conseguia
acompanhar nos raciocínios rápidos de quem tudo sabe e o dispara profusamente,
e chamava-lhe “fala-barato”, mas era culpa sua por o não seguir.
Eu gosto geralmente do que diz, embora me assuste a
rapidez do despacho dos assuntos, de quem tudo sabe e resolve, oráculo não
tenebroso mas amistoso e isento.
Não foi assim no domingo passado. Falou de Cavaco
Silva, contou-lhe a história, referiu o quanto Cavaco se distingue dos outros,
por ter tido uma origem diferente dos outros presidentes, dos que viveram bem
desde a nascença, que estudaram bem, sem dificuldades, pertenceram a umas
elites que os projectaram… Cavaco, ao
que parece, nasceu em Boliqueime, que
não é sítio para o nascimento de um PR, e fez-se e conquistou um grande espaço
de governação, numa presença teimosa, que não desiste de impor o seu parecer,
com aplicação e coragem, apesar das críticas de que é alvo, num país mais dado
às críticas do que a qualquer outro esforço de cooperação.
E Marcelo, para
demonstrar a teimosia “bovina” de
Cavaco, referiu uma cena caricata de um Cavaco que fez ginástica perante ele, Marcelo,
para comprovar uma boa forma física, sinónima de uma boa forma espiritual,
segundo os ditames clássicos da mens sana in corpore sano.
Não percebi bem a intenção de Marcelo, se era de
elogio ou de riso a referência a um corpo ginasticado que nunca aparentou
sê-lo. Pareceu-me antes de riso, pela puerilidade, embora ao que parece,
Marcelo também pratique os mergulhos no mar, como Sócrates as corridas pelo
mundo. Nunca a ginástica desfavoreceu ninguém, falo por experiência própria,
corpo que vai enferrujando dolorosamente e preguiçosamente, por falta de exercício.
Não percebi o porquê do retrato de Cavaco feito por Marcelo,
mais de desprestígio do que de bondade. De hipócrita suavidade, me pareceu. Para
não lhe referir as proezas do não se deixar guiar pelos pareceres alheios, na
política de exaltação que vivemos, o que provoca a indignação dos mais directos
atacantes, defensores das sopas e descanso para ele, Marcelo preferiu citar a
questão do exibicionismo muscular de Cavaco, a demarcar-se de maneira original das
críticas dos outros àquele, e a preparar a sua mente sana, para um dia
ter o seu retrato pendurado ao lado de um natural de Boliqueime, por muito corpum
sanum que este tenha.
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