quarta-feira, 6 de novembro de 2013

Não há pai

  • Sempre me pareceu verdade de tipo axiomático – incontornável, adjectivo mais ao jeito de agora – a ideia de que era ao Estado, entidade abstrata, por intermédio dos seus governantes concretos, que competia zelar pela educação dos cidadãos do país a que esse Estado pertencia.
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  •  Havia colégios, nos meus tempos, mas os alunos desses colégios tinham que se submeter às mesmas provas “nacionais”, para terem direito a singrar pelas mesmas vias de ascensão por etapas, segundo a vida evolutiva de cada um, embora sem descurar as excepções dos que em todos os tempos singram mais pela competência alheia. Era, pois, ao Ministério da Educação, organismo do Estado, que competia a organização da rede escolar, dos quadros de professores, dos exames nacionais e tudo o mais que assentava nos tais postulados de responsabilidade e gestão escolar. Tal tessitura organizativa não obstava a que outros organismos particulares fossem contribuindo para o desenvolvimento social, pelo desporto, pelo concurso, pelos jogos didácticos estimulantes, como vemos em todos os países.
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  • O 25 de Abril liberalizou um pouco o esquema de rigidez donde provínhamos. Lembro-me de que, em 74/75, chegada de África, na avalanche, tive a sorte de trabalhar como professora de Português e de Francês, em curso particular na escola onde posteriormente leccionei. Era um curso organizado à pressa, à noite e nos sábados à tarde, para os alunos que quisessem fazer, em um ano, os três anos do curso geral ou os dois do complementar para efeito de progressão nas suas carreiras. Lembro, entre outros alunos, os professores primários que desejavam obter, pela licenciatura, o mesmo estatuto dos professores secundários, terminologia já obsoleta. Foi um êxito aquele ano de 75, para os meus alunos, pois não houve uma única reprovação, tanto em português como em francês. Era trabalho sério, os objectivos definidos por gente responsável, eu ganhava 5 contos mensais, precioso auxílio do vencimento de África. Nunca percebi como pôde ser emprestado provisoriamente – só durou esse ano – o edifício escolar a pessoas que sempre admirei como beneméritas, pois possibilitaram que muita gente, anquilosada nos seus trabalhos, singrasse a partir daí para novos horizontes.
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  •  Entretanto, com o 25 de Abril houve um renovar de entusiasmo para a formação pedagógica, e muitas foram as transformações sofridas pelo ensino que os manuais escolares traduziram esplendidamente, de forma a melhor orientar alunos e professores, com as propostas de trabalho e preparação neles contidas, estudos condicionados, é certo, pela indisciplina, que a abertura democrática dos sucessivos governos elegeu como bandeira da sua liberdade.
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  • A par desses factos, houve a fundação de mais colégios e universidades particulares, no entusiasmo tão positivo de abertura para a formação superior. Em muitos casos, é certo, com histórias de escândalos em espaços desses, cujos donos aproveitaram os dinheiros de empréstimo para fins menos esclarecidos, segundo o costume. Lembro uma pessoa de família a quem uma dessas universidades falidas ficou a dever milhares de contos – euros - de uma docência vilipendiada, como coisa dos nossos hábitos progressivamente inflacionada.
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  • Mas o Estado responsável, o Estado pai, segundo axioma das mentes atávicas, resolve, ao que parece, alijar mais esta sua tarefa de responsabilidade, “vendendo” o Ensino a particulares, indiferente ao que pode suceder, com tais medidas, a uma pátria que já nem isso parece, onde patrões exploram como nunca se viu, onde as dívidas ficam por saldar, onde se usam truques diversos para enganar, onde os desempregados se aglomeram para o subsídio de desemprego, onde cada um se desenrasca como pode e chora a bom chorar, onde a Justiça parece não existir…
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  • O Ensino… E que vai suceder aos professores e aos seus direitos, se os novos estabelecimentos de ensino particular procurarem os professores segundo as suas conveniências ou amizades, sem o controlo superior de um Estado de Justiça? Que vai suceder aos alunos recém-formados, se deixarem de entrar para as listas controladoras dos seus direitos de formação e tempo de serviço?
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  • Tanto que se pode dizer! Mas outros o dirão melhor.

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