sexta-feira, 22 de novembro de 2013

Pai com força só na fábula

Os fabulistas foram jovens também.
Foi-o Florian, que bem sabia
Quanto a juventude
Precisa de um pai e de uma mãe
Para ganhar mais virtude
Em cada dia.
Os bons princípios provêm, naturalmente,
Do seio da família,
Mas diz-se que hoje em dia
Tal asserção é menos real
Pois muitas coisas se modificaram
Tantas aberturas se fizeram
Para se fruir em liberdade
De maior capacidade
Individual.
É claro que tanta desenvoltura
Que tantas vezes redunda em amargura
A sociedade contribui para ela
Não só pela sua falta de compostura,
Como pelos efeitos perversos
Que o progresso exerce sobre ela.
Mas no tempo de Florian
Ele não era tão evidente,
Por isso Florian acreditava na moral
Da fábula tradicional,
Como mostra na fábula seguinte
Bem do seu gosto
De homem educado,
Segundo os valores dos seus maiores:

 «O Cavalo e o Potro»

«Um bom pai Cavalo, viúvo, e com apenas uma cria,
Criava-a num prado de pastagem,
Onde águas, flores e sombras da folhagem,
Todos esses bens em simultâneo reunia.
Abusando no seu divertimento
Como é costume da tenra idade,
O potro todos os dias comia
O feno em demasia,
Espojava-se na erva florida
Galopando ao Deus dará,
Banhando-se sem vontade,
Ou descansando sem necessidade.
Ocioso e gordo até mais não,
O jovem solitário aborreceu-se;
De tudo ter em excesso se cansou,
O desgosto dele se apoderou,
Foi procurar seu pai, em acusação:
“Há muito, disse ele, que de bem não sinto nada;
Esta erva é malsã e dá cabo de mim,
Este trevo insípido, a água inquinada
O ar que se respira ataca-me os pulmões,
Em suma, com todas estas razões
Ficarei em perigo
Se daqui não partirmos logo.”
“Meu filho, responde-lhe o pai,
Trata-se da tua vida,
Partamos imediatamente”.
Meu dito, meu feito,
Deixam o lar de seguida,
O jovem viajante a pular de prazer.
O velho, menos contente,
Ia a passo, moderadamente,
Mas guiava a criança e deixava-a trepar
Sobre montes escarpados, áridos, sem erva,
Onde nada o podia sustentar.
Chegada a noite, pasto nem vê-lo;
Passaram sem ele; no dia seguinte,
Como a fome começava a apertar,
Com a ponta dos dentes roeram
Uma silva selvagem;
Não se galopou mais no resto da viagem;
Dois dias depois mal podiam ir a passo.
Julgando então a lição dada,
O pai toma uma via secreta
Que o filho desconhecia,
E, a meio da noite,
Leva-o para a pradaria.
Mal o nosso potro
Encontra uma erva florida,
Lança-se sobre ela: “Ah! Que festim excelente!
Que boa erva! disse ele! Como é suave e tenra!
Meu pai! Não precisamos de esperar
Para encontrar melhor lugar;
Fixemo-nos para sempre
Sobre estes amáveis sítios:
Que terra pode ser melhor

Do que este asilo campestre
Da esfera terrestre?
Enquanto assim falava
Eis que o dia surgiu:
O potro, o prado que deixara
Reconheceu.
Ficou confundido. O pai, com calma bondade,
Diz-lhe: “Meu filho, aprende esta máxima comigo,
Do conhecimento antigo:
“Quem goza demais na vida

Depressa se aborrece de tanta facilidade.
É preciso pensar em regime
Como fonte de felicidade.»

 Também nós aqui
Tivemos o nosso prado
Onde nos repoltreámos livremente.
Mas ao contrário do potro da fábula,
Que se cansou dos excessos de que gozou,
E aprendeu com a lição do pai
A moderação,
Fomos insaciáveis e queremos
Continuar imoderadamente,
No direito como obrigação,
No dever como exclusão.

Não há pai,
Cavalo ou não,
Que assim consiga
Salvar tal nação
Que assim se vai...

 

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