segunda-feira, 25 de agosto de 2014

A propósito do livro de Luís Soares de Oliveira «Guerra Civil de Espanha», um comentário



Também tive acesso ao livro “Guerra Civil de Espanha” de Luís Soares de Oliveira, que vou lendo nos espaços de outros momentos do baloiçar da vida. Parece-me um livro sensacional – pela informação, que nos faz rever os nossos próprios momentos de um acordar abrilino para as realidades a que éramos alheios, “protegidos” por manuais de estudo da História omissos nas estreitas relações entre a doutrinação comunista e os movimentos revolucionários de “Frentes Populares” em França e Espanha que só conhecíamos de nome. Este livro esclarece sobre as lutas pelas melhorias de condição dos trabalhadores, e o sindicalismo e o anarquismo, que começaram mais cedo do que aqui, ou pelo menos de forma mais decidida, a nossa primeira República parecendo uma brincadeira de crianças num povo dependente e imaturo, em comparação com o que se passava em Espanha, de povo aguerrido, a caminho da segunda República, em que «A crescente influência da CNT (Confederação Nacional do Trabalho, fundada em 1910) - (a UGT fora fundada em 1889) – junto dos trabalhadores colocou o Estado espanhol nos braços da “tenaz infernal”: corrupção, à direita; terrorismo à esquerda.», retrato perfeito da nossa própria vivência actual - e cujas crises várias, vividas por Afonso XIII, entre as quais a da “peseta”, em 1929, o forçariam a renunciar, a II República proclamada em 14 de Abril de 1931, apesar da descrença nesta, segundo Miguel Unamuno: «Miguel Unamuno afirma que “em Espanha ninguém crê no que diz ser o seu credo: os socialistas não crêem no socialismo. nem na luta de classes, nem na lei férrea do salário e outros símbolos marxistas; os comunistas não acreditam na comunidade e ainda menos na comunhão; os conservadores não acreditam na conservação; nem os anarquistas na anarquia. Povo de pedintes! E crê alguém em si mesmo? O povo cala-se!”» E Soares de Oliveira contesta, com ironia: «No caso, Unamuno pecou por excesso de redução. O embuste na descrição não significava fraqueza de convicções. Havia crenças e fortes: os anarquistas acreditavam no terrorismo, e por mor deste, acreditavam que tudo é possível; o baixo clero nem sob tortura abjurou, e em Marrocos surgira entretanto a crença no valor militar que também iria ter fortes consequências, O problema não seria o cepticismo; seria talvez a multiplicação dos credos. A ética não tolera a diversidade.»
Uma obra para ler devagar, na revelação de factos e nomes e envolvência das histórias, conflitos, participações ou artimanhas de outros povos, um livro de grande elegância expositiva, a par do domínio dos dados de uma história para mim desconhecida ou vaga, que nos interessa sobremaneira. E que nos diz respeito, como bem o afirma Francisco Gomes de Amorim, a respeito das duplicidades de Salazar no conflito intestino espanhol.
Um livro que merece entusiástico Bravo!
O texto de Francisco Gomes de Amorim, do blog A Bem da Nação sobre este livro:

«Ler História Dramática e rir»
A primeira reação de quem ler o título acima, vai ser: este sujeito ou é louco ou masoquista. Rir da desgraça? Pior ainda quando souber que me rio quando vejo a inteligência e astúcia do “patego de Santa Comba”, como lhe chamava o meu sogro, meter no bolso os grandes dirigentes mundiais.
Para grande espanto, e encantamento meu, recebi há dias um presente magnífico de um “amigo” que não conhecia, a não ser de nome, que muito simpático e amável, me ofereceu o livro que acabou de ser publicado pelo Ministério dos Negócios Estrangeiros de Portugal, uma segunda edição revista e aumentada: Guerra Civil de Espanha – Intervenção ou não intervenção Europeia – Uma análise, do embaixador Luis Soares de Oliveira.
Análise sem pretensão de tomar partido de um ou outro beligerante, mas relatando, com base em documentos oficiais, toda a trama que envolveu a horrível guerra civil em Espanha, o modo como se envolveram, ou camufladamente “não” se envolveram, os diversos países europeus.
Muitíssimo bem escrito e minuciosamente detalhado e informado, a sua leitura, para quem conheceu a habilidade de Salazar (é bom ler Kennedy e Salazar - o Leão e a Raposa, de José Freire Antunes, onde é evidente a habilidade do tão querido, odiado e mal tratado dirigente português, em lidar, baseado na sua diminuta dimensão geopolítica com o “rei” do mundo na ocasião, o presidente dos EUA), tem passagens que são uma delícia.
Nos anos trinta, quando a guerra estava para se declarar em Espanha, ou já em andamento, as potências europeias eram a Grã-Bretanha e a França, crescia a força da Alemanha e da Rússia, a Itália também queria impor-se, e Portugal permanecia aquele pequeno retângulo “à beira mar plantado”, mas sabendo-se ameaçado pela União das Repúblicas Ibéricas Soviéticas, que incluía nos seus planos a sovietização da Espanha e, a bem ou à força, de Portugal.
É evidente que Portugal estava a par de toda a trama, e o que ninguém queria era a mentira soviética implantar-se no país, mentira essa propalada pelos jovens aliciados pelo Comintern que acreditavam que na União Soviética não existiam patrões, que os operários viviam na abundância, o que arrastava os idealistas que pensam, alguns ainda hoje, que o comunismo e o anarquismo são os “Elíseos terrenos”!
Os poderosos ingleses faziam da política externa a alavanca para se manterem no poder interna e eternamente. A França dividida entre comunistas, anarquistas, socialistas e liberais, metia os pés pelas mãos e não sabia se devia ajudar abertamente os nacionalistas espanhóis ou entregar a batata quente nas mãos dos ingleses. Queria vender-lhes oficialmente armas, sobretudo aviões obsoletos, e passá-los de contrabando através das fronteiras norte e sul dos Pirenéus.
Este livro tem que ser lido por quem gosta de história. A abrangência ali tratada, as intrigas, as falsidades, os congressos e comités, tudo feito para nada fazer, a nossa tão querida e velha aliada a ver se nos prejudicava, e o Salazar a meter os “caras” todos no bolso: desde os frios e arrogantes britânicos, aos franceses, italianos, russos, nem que seja só para ver essas manobras dum homem de raras qualidades, o livro já merece ser lido.
Mas toda a sua leitura faz-nos compreender a razão por que essa horrenda guerra civil durou mais de três anos e fez meio milhão de vítimas, deixando o país arrasado, roubado e, até hoje, dividido.
Obrigado, embaixador Luis Soares de Oliveira, primeiro por ter escrito o livro, e principalmente... por mo ter oferecido.
Uma bela obra. Voltarei a falar nela.

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