Também tive acesso ao livro “Guerra
Civil de Espanha” de Luís Soares de Oliveira, que vou lendo nos espaços de
outros momentos do baloiçar da vida. Parece-me um livro sensacional – pela
informação, que nos faz rever os nossos próprios momentos de um acordar
abrilino para as realidades a que éramos alheios, “protegidos” por manuais de
estudo da História omissos nas estreitas relações entre a doutrinação comunista
e os movimentos revolucionários de “Frentes Populares” em França e Espanha que
só conhecíamos de nome. Este livro esclarece sobre as lutas pelas melhorias de
condição dos trabalhadores, e o sindicalismo e o anarquismo, que começaram mais
cedo do que aqui, ou pelo menos de forma mais decidida, a nossa primeira
República parecendo uma brincadeira de crianças num povo dependente e imaturo,
em comparação com o que se passava em Espanha, de povo aguerrido, a caminho da
segunda República, em que «A crescente influência da CNT (Confederação
Nacional do Trabalho, fundada em 1910) - (a UGT fora fundada em 1889) –
junto dos trabalhadores colocou o Estado espanhol nos braços da “tenaz
infernal”: corrupção, à direita; terrorismo à esquerda.», retrato
perfeito da nossa própria vivência actual - e cujas crises várias, vividas por
Afonso XIII, entre as quais a da “peseta”, em 1929, o forçariam a renunciar, a II
República proclamada em 14 de Abril de 1931, apesar da descrença nesta,
segundo Miguel Unamuno: «Miguel Unamuno afirma que “em Espanha ninguém
crê no que diz ser o seu credo: os socialistas não crêem no socialismo. nem na
luta de classes, nem na lei férrea do salário e outros símbolos marxistas; os
comunistas não acreditam na comunidade e ainda menos na comunhão; os
conservadores não acreditam na conservação; nem os anarquistas na anarquia.
Povo de pedintes! E crê alguém em si mesmo? O povo cala-se!”» E Soares
de Oliveira contesta, com ironia: «No caso, Unamuno pecou por excesso de
redução. O embuste na descrição não significava fraqueza de convicções. Havia
crenças e fortes: os anarquistas acreditavam no terrorismo, e por mor deste,
acreditavam que tudo é possível; o baixo clero nem sob tortura abjurou, e em
Marrocos surgira entretanto a crença no valor militar que também iria ter
fortes consequências, O problema não seria o cepticismo; seria talvez a
multiplicação dos credos. A ética não tolera a diversidade.»
Uma obra para ler devagar, na
revelação de factos e nomes e envolvência das histórias, conflitos,
participações ou artimanhas de outros povos, um livro de grande elegância
expositiva, a par do domínio dos dados de uma história para mim desconhecida ou
vaga, que nos interessa sobremaneira. E que nos diz respeito, como bem o afirma
Francisco Gomes de Amorim, a respeito das duplicidades de Salazar
no conflito intestino espanhol.
Um livro que merece entusiástico
Bravo!
O texto de Francisco Gomes de
Amorim, do blog A Bem da Nação sobre este livro:
«Ler História Dramática e rir»
A
primeira reação de quem ler o título acima, vai ser: este sujeito ou é louco ou
masoquista. Rir da desgraça? Pior ainda quando souber que me rio quando vejo a
inteligência e astúcia do “patego de Santa Comba”, como lhe
chamava o meu sogro, meter no bolso os grandes dirigentes mundiais.
Para
grande espanto, e encantamento meu, recebi há dias um presente magnífico de um
“amigo” que não conhecia, a não ser de nome, que muito simpático e amável, me
ofereceu o livro que acabou de ser publicado pelo Ministério dos Negócios
Estrangeiros de Portugal, uma segunda edição revista e aumentada: Guerra Civil de
Espanha – Intervenção ou não intervenção Europeia – Uma análise,
do embaixador Luis Soares de Oliveira.
Análise
sem pretensão de tomar partido de um ou outro beligerante, mas relatando, com
base em documentos oficiais, toda a trama que envolveu a horrível guerra civil
em Espanha, o modo como se envolveram, ou camufladamente “não” se envolveram,
os diversos países europeus.
Muitíssimo
bem escrito e minuciosamente detalhado e informado, a sua leitura, para quem
conheceu a habilidade de Salazar (é bom ler Kennedy e
Salazar - o Leão e a Raposa, de José Freire Antunes, onde
é evidente a habilidade do tão querido, odiado e mal tratado dirigente
português, em lidar, baseado na sua diminuta dimensão geopolítica com o “rei”
do mundo na ocasião, o presidente dos EUA), tem passagens que são uma delícia.
Nos
anos trinta, quando a guerra estava para se declarar em Espanha, ou já em
andamento, as potências europeias eram a Grã-Bretanha e a França, crescia a
força da Alemanha e da Rússia, a Itália também queria impor-se, e Portugal
permanecia aquele pequeno retângulo “à beira mar plantado”,
mas sabendo-se ameaçado pela União das Repúblicas Ibéricas Soviéticas, que
incluía nos seus planos a sovietização da Espanha e, a bem ou à força, de
Portugal.
É
evidente que Portugal estava a par de toda a trama, e o que ninguém queria era
a mentira soviética implantar-se no país, mentira essa propalada pelos jovens
aliciados pelo Comintern que acreditavam que na União
Soviética não existiam patrões, que os operários viviam na abundância, o que
arrastava os idealistas que pensam, alguns ainda hoje, que o comunismo e o
anarquismo são os “Elíseos terrenos”!
Os
poderosos ingleses faziam da política externa a alavanca para se manterem no
poder interna e eternamente. A França dividida entre comunistas, anarquistas,
socialistas e liberais, metia os pés pelas mãos e não sabia se devia ajudar
abertamente os nacionalistas espanhóis ou entregar a batata quente nas mãos dos
ingleses. Queria vender-lhes oficialmente armas, sobretudo aviões obsoletos, e
passá-los de contrabando através das fronteiras norte e sul dos Pirenéus.
Este
livro tem que ser lido por quem gosta de história. A abrangência ali tratada,
as intrigas, as falsidades, os congressos e comités, tudo feito para nada
fazer, a nossa tão querida e velha aliada a ver se nos prejudicava, e o Salazar
a meter os “caras” todos no bolso: desde os frios e arrogantes britânicos, aos
franceses, italianos, russos, nem que seja só para ver essas manobras dum homem
de raras qualidades, o livro já merece ser lido.
Mas
toda a sua leitura faz-nos compreender a razão por que essa horrenda guerra
civil durou mais de três anos e fez meio milhão de vítimas, deixando o país
arrasado, roubado e, até hoje, dividido.
Obrigado,
embaixador Luis Soares de Oliveira, primeiro por ter escrito o livro, e
principalmente... por mo ter oferecido.
Uma
bela obra. Voltarei a falar nela.
Nenhum comentário:
Postar um comentário