De António da Cunha Duarte Justo,
saído no blog “A Bem da Nação”:
BARBARIDADES CONTRA A LÍNGUA PORTUGUESA
O Brasil
pretende acabar com o “h” no princípio das palavras e substituir o “ch” pelo
“x”
A actual
discussão no Senado brasileiro sobre a simplificação da ortografia revela-se
contraprodutiva em relação ao acordo ortográfico. A crença de Ernani Pimentel e
do ‘Movimento Simplificando a Ortografia’ de que "a simplificação
ortográfica é a porta para a eliminação do analfabetismo”, revela-se como
despiste ou desorientação. A iniciativa pretende inverter o desenvolvimento
linguístico ao copulá-lo com a camada social menos desenvolvida; enfim, uma
posição decadente tendente a que as árvores passem a ter a rama na terra e as
raízes no céu.
Os
Diálogos Lusófonos, tal como outros meios de comunicação brasileiros têm vindo
a referir que o senador Cyro Miranda, presidente da Comissão de Educação,
lidera um projecto da Comissão conducente à simplificação da ortografia da
língua portuguesa. O projeto “propõe a extinção da letra "h" no
início das palavras e a troca de todas as expressões com "ch" pelo
"x", passando palavras, tais como ‘homem e hoje’, a serem escritas
com a grafia ‘omem e oje’ e palavras como ‘macho’ a serem escritas ‘maxo’. Exemplos
das intenções em vista: Flecha Flexa, Analisar Analizar, Blusa Bluza, Exigente
Ezigente, Exame Ezame, Amassar Amasar, Açúcar Asúcar, Moço Moso, Deuses Deuzes.
Segundo
intenções dos mentores do projecto, este poderia ser aplicado em 2016, após
consulta aos países de língua portuguesa.
É
estranho que o Brasil queira fazer equivaler a língua escrita à língua oral
quando escreve dia e pronuncia dʒja ou dja. A língua não
pode ser
posta à disposição arbitrária de ideologias (socialismo mal-entendido) nem de
lógicas a que falta a supervisão racional abrangente. Sem respeito pela
linguística, atacam a ortografia, a etimologia, a conexão entre palavras
cognatas.
Depois
do tao discutido acordo ortográfico da língua portuguesa aprovado em 16 de
Dezembro de 1990 que pretende criar uma ortografia unificada e em vigor desde
2009 parecem forças radicais quererem colocar-nos na fase antes dele; na
realidade pretendem o desacordo agora incentivado em nome de uma massa anónima
‘não consumidora de cultura’.
Ainda o
acordo ortográfico não se encontra aplicado e já surgem novas propostas de
tendências partidárias e nacionalistas a pretender novas mudanças em nome de
uma democracia que quer ver a inclusão social dos seus povos à custa de
simplificações arbitrárias e desaferidas, como se a produção intelectual,
artística e científica se devesse orientar, pelo princípio do menor esforço,
como parece pretender o ‘Movimento Simplificando a Ortografia’. Pretende um
nível simplista que evite o analfabetismo e que reduza o tempo de ensino da
ortografia para impedir reprovações no currículo de aprendizagem. Esquece que
as suas razões de liberdade, igualdade e economia teriam como consequência mais
lógica a extinção da educação e das escolas ou a emigração de grupos mais
conscientes para o ensino particular. Na sequência ter-se-ia de acabar com o
estudo da História e de muitas coisas mais; sim, até porque, na realidade, em
termos imediatos cultura não enche barriga.
Querer
motivar a mutilação do português, com argumentos de que grande parte do povo
brasileiro tem dificuldade em “escolher a letra adequada entre x/ch, j/g,
s/x/z, s/ç/c/ss/sc/sç/xc/xç, presença/ausência de h inicial”, seria desconhecer
a história e a lógica da língua e desqualificar o ensino brasileiro e a
capacidade de aprendizagem de um povo que é tão inteligente como outros países
lusófonos que parecem ter menos dificuldades com a ortografia da língua.
Por trás
da problemática em torno da ortografia, esconde-se também uma falta de
sistemática na aprendizagem da língua e de um ensino que domine os rudimentos
da língua mãe (o latim).
Não é
certamente por falta de tinta mas talvez por protagonismo político de
interesses ideológicos que se equivoca ao qualificar rigor de qualidade
intelectual com “alienação do povo” . Por trás de uma identificação com os
interesses da pretensa massa popular esconde-se a atitude paternalista de que o
povo simples deve ser poupado de elucubrações complexas querendo apresentar a
língua como produto fácil e barato à altura do porta-moedas de um mercado
orientado pelo poder da oferta e do mais barato.
A
questão da língua não pode ser equacionada em perspectivas meramente políticas,
geralmente de vistas reduzidas a mentalidades condicionadas a períodos
eleitorais quatrienais ou quinquenais e a ideologias de massa anónima sem
consideração pelos processos de individuação e diferenciação inerentes à
evolução individual e colectiva.
A
evolução da língua também não pode ser abandonada a pessoas, talvez de boa
vontade mas que não têm a mínima ideia do assunto nem o respeito advindo do
conhecimento do evoluir da língua.
Para
trás anda o caranguejo!
A
iniciativa é absurda e prejudicial porque para corresponder às necessidades
imediatas de gente simples, opta por cortar os ramos frondosos da árvore
linguística pelo facto de se estar com o sentido na sua madeira ou porque se
quer fazer da árvore um arbusto para que qualquer gaiato possa subir a ela sem
o mínimo de esforço ou dificuldade. Deixem-na continuar a ser uma grande árvore,
uma casa grande onde todas as espécies de pássaros, grandes e pequenos, possam
fazer o seu ninho, segundo as suas capacidades e potenciais.
Seria
disparate cortar as asas às aves grandes para que todas possam viver nos
primeiros ramos da árvore. Se a natureza e o desenvolvimento se deixassem reger
apenas por princípios de massa ou democráticos não teria produzido a
humanidade, para nos manter na igualdade do estádio das amoebas ou das medusas.
A
estratégia de comunicação anunciada pelo senador, de tencionar chegar a acordo
com os outros países lusófonos, através de videoconferências, é testemunho de
método manipulador de quem quer forçar a sua ideia de legitimação dúbia fruto
do arbitrário para evitar a discussão nas legítimas instituições científicas competentes
para a língua. Nestas coisas precisa-se tempo, calma, independência e
ponderação para se evitar confundir um pirilampo com uma estrela. A iniciativa
não passa de uma tentativa de desorganização e de desinformação no sentido de
desviar as energias do último acordo ortográfico.
A
reforma da língua é assunto para linguistas e disciplinas afins atentas às
massas e aos diferentes interesses dos países lusófonos, longe de qualquer
interesse hegemónico ou de estratégica particular. O resto corresponde a uma
perspectiva minimalista e míope de que sofre em grande parte o nosso sistema
democrático. O nivelamento da cultura por baixo tem sido um facto tendente a
desacreditar e banalizar a democracia (de interesse comum a um capitalismo e a
um socialismo radical); a democracia não deveria merecer tal
desconsideração. Imaginemos que, para acabar com o racismo, os brasileiros
determinavam manipular o gene da sua pele, de modo a todos os brasileiros
conseguirem uma cor neutra para os seus habitantes! A intenção que se
encontraria por trás do objectivo seria boa mas a estratégia e os meios para o
alcançar seria inadequada, indiferenciada e de consequências catastróficos.
A ideologia, por muito potente que seja, não deve desprezar as leis da evolução
nem a variedade da realidade integral. Para trás anda o caranguejo!
A
ignorância e a precaridade não podem constituir motivo de desenvolvimento
cultural e linguístico. Os programas correctores de língua em via na internet
serão um grande serviço para aqueles que confundem o ‘ch’ com o ‘x’.
A língua
portuguesa não existe isolada no mundo e, também por isso, não deve ser
avaliada por critérios proletários simplistas nem pela dimensão populacional de
uma nação! É óbvio que se mantenham os critérios de qualidade. O seu desenvolvimento
não pode ignorar a riqueza atingida pelas línguas latinas nem o seu rico
contexto. Tão-pouco poderá ser critério da afirmação de identidade de um país a
negação da História nem o estádio cultural de um grupo social. Tal proposta,
como o emprego de energia unilateral e exagerada na integração do galego no
mundo lusófono só complica e ajuda a desmotivar a reflexão e a aplicação do
acordo ortográfico em via.
O
Português não é uma língua difícil. É uma língua muito rica e como tal
complexa, com moradas para todos os estados do desenvolvimento social e
intelectual até hoje possível e conseguido. Na riqueza de uma língua e na sua
complexidade se reflecte o desenvolvimento de um povo. Tentar
aniquilar as leis da evolução pode ser democrático mas não natural nem
razoável. A existência de favelas e de casas sem jardim não pode ser o motivo
para se destruir os palácios e os jardins. O objectivo será construir acesso
aos jardins e aos palácios para todos.
Sem
querer negar a luta de classes e de interesses, precisamos primeiramente de
sociedades adultas que discutam os problemas do seu desenvolvimento e daquilo
que constitui a sua identidade, com realismo, sem complexos de superioridade
nem de inferioridade.
Um breve
comentário:
E assim o Brasil vai pontapeando a
velha mãe decrépita, já incapaz de resistir, que faz chichi (xixi?) na arrastadeira e permanece
inerte e receosa de desamparo, ante as alarvidades ultrajantes da moçoila desonesta
e vaidosa do seu viço, esfregando o Acordo Ortográfico, que rasgou com donaire
e desprezo, nas ventas da mãe e das irmãs, “brotinhos” apenas ainda em potência,
que não fazem brecha (brexa?) nos seus caprichos (caprixos?) de libertinagem.
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