Uma das questões educativas que a democracia trazida
pelo 25 de Abril impôs, para grande estupefacção minha, habituada a respeitar
as regras de compartimentação dos diversos Serviços que impediam a
interferência alheia no foro de cada um, foi a sucessiva intervenção da família
no âmbito escolar, a que não fora habituada. Educada para ensinar as disciplinas
da minha preparação técnica, (que a multiplicidade de experiências anuais, com
as várias turmas e anos escolares, além de cursos de formação do meu interesse,
naturalmente iam fazendo progredir em competência e diversidade, com o auxílio
precioso dos manuais escolares apetrechados de orientação específica),
parecia-me atrevida interferência no meu trabalho essas reuniões que punham em
confronto pessoas a ele alheias, embora, evidentemente, aceitasse a reunião
ocasional individual com o encarregado de educação para qualquer problema
específico relacionado com o educando.
Mas parece que agora o Ministério da Educação pretende
transferir a responsabilidade do ensino para as diversas câmaras municipais de
cada área, e aqui vamos nós, de velas enfunadas, navegando e entrechocando, num
ensino cada vez menos rigoroso em preceitos unificadores, sujeito ao capricho e
à competência nem sempre comprovada, de cada presidente de câmara.
Estamos na época do ruído, da interferência popular,
da massificação, das discussões infindáveis em torno dos jogos futebolísticos,
do embrutecimento generalizado. Mas parece que os próprios treinadores e seleccionadores
dos clubes não admitem assim tanto as interferências alheias no seu trabalho,
em que são reis. Podem exprimir-se bem ou mal, com educação ou sem ela, mas as
televisões os destacam, elas próprias ajudando ao maralhal da deseducação
nacional. São reis no seu trabalho e alguns ganham de forma obscena, a condizer
com a sua realeza. Não é o caso dos professores, é facto assente, cada vez
menos autónomos, lacaios de mandatários de um ministério de um governo que
assim se vai desresponsabilizando das pastas que não dão dinheiro, tal como das
postas que, ao que parece, nas suas vendas, ajudam a curar as pústulas trazidas,
há muitos anos já, nas pistas do enriquecimento próprio…
E tudo isto a propósito de um artigo que li no Jornal
I, de Mário Bacelar Begonha, (12/8/2015), com o qual concordo
inteiramente: «Enfim, se por razões economicistas
querem entregar a gestão das escolas às câmaras, nós então contrapomos que é
mais eficaz entregá-las às “mercearias”, controladas pelo Jerónimo Martins, ou
à outra do Continente. É que esses não brincam em serviço e são 100% eficazes.
Se
querem brincar, vão para o sítio próprio, mas não provoquem quem sabe do que
está a falar e ensinou durante 60 anos! Não brinquem com coisas sérias e tenham
juízo. Estudem os problemas e perguntem a quem se preparou a vida inteira para
poder responder.»
Qual municipalização das Escolas?! O Continente é que
está a dar! O Pingo Doce também:
«Educação nas câmaras municipais»
Por
Mário Bacelar Begonha, Sociólogo.
Escreve quinzenalmente à
quarta-feira
Jornal
I, 12/8/2015
«Não
foi por acaso que espíritos cultos e avisados, no passado, denominavam por
Ministério da Instrução aquilo que anos mais tarde alguns “optimistas”
resolveram chamar da “Educação”, sem cuidarem de saber se a escola é o sítio
próprio para receber educação ou instrução! É que a educação
implica instrução, mas esta pode existir sem aquela, o que é altamente
inconveniente e prejudicial a um país.
Significa
isto que a educação deve ter um carácter global, enquanto a instrução abrange
apenas um aspecto da educação, sendo, pois, parcial.
A
questão “filosófica” que se coloca é saber como será possível educar sem
formação adequada e, por outro lado, procurar definir qual o “sítio”, próprio e
adequado, para formar quadros para educar, ou será que estamos condenados a ter
apenas pessoas que vão tão-só “instruir” outras?
Na
faculdade procura-se instrução, conhecimento, saber, mas não educação. Na
faculdade procura-se chegar à verdade, mas esta faz parte da educação que
deveria conter a instrução, embora seja caricato admitir que esta possa
prescindir da verdade.
No
entanto, seria desejável que os cursos universitários com a vertente “ramo
educacional”, ou seja, destinados ao ensino, tivessem a educação como
elemento preponderante do curso, mas afinal estão apenas a falar de
pedagogia, o que quer dizer apenas a arte de ensinar, de transmitir
conhecimentos.
Ora
a verdadeira educação terá de ser ensinada, primeiro, em casa, no seio
familiar, na tenra idade (infância), e depois complementada na escola.
Significa
isto que é a escola que deve ter um papel importante na educação da juventude,
mas por esta (educação) deve entender-se cultura; usos, costumes e tradições.
Será
educação uma senhora levantar-se para cumprimentar um homem? Será educação
comer a fruta à dentada, como se vê nas cantinas universitárias? Será educação
cuspir no chão, na rua, na via pública? Será bem educado ou não todo aquele que
se levanta quando toca o hino nacional? Será educação levantar-se para beijar o
pai que chega a casa, quando o filho já tem 60 anos? E vice-versa?
São
todos estes aspectos que deveriam ser ensinados, transmitidos na escola, na
faculdade, mas como será isso possível se lá tal não é ensinado, até porque a
maioria dos que ensinam não receberam essa educação?!?
Ora
aqui está uma excelente oportunidade para ensinar as pessoas a serem pessoas
através da prática do desporto, já que ele tem uma pedagogia própria e exige
disciplina e regras que têm de ser observadas, sob pena de se sofrerem danos,
alguns irreversíveis.
É
evidente que as gerações pós-25 de Abril não sabem quão honroso e educativo era
o serviço militar obrigatório que, só por si, educava o povo que por lá passava
e substituía, positivamente, a escola quando ela não podia cumprir parte da sua
missão, por não ter recursos humanos à altura (da missão).
O
que está aqui em causa é a avaliação da possibilidade de a educação passar para
as câmaras municipais. Ora não conseguimos entender a falta de sensibilidade
de certas pessoas, ou talvez de cultura, para não perceberem o ambiente que se
vive numa câmara municipal, que tem mais a ver com a vida empresarial de uma
cidade, de negócios, de terrenos, de licenças, de planos directores, etc., etc…
e nenhuma vocação ou preparação para questões educativas.
Por
outro lado, todo aquele que se preocupa com questões de ensino e de educação,
por regra, morre pobre. Já o mesmo não se pode dizer de alguns que vão para as
câmaras e que, quando as abandonam, não conseguem justificar o património que
possuem! Perguntem ao Paulo Morais, que sabe da poda e é um exemplo de
dignidade.
Enfim,
se por razões economicistas querem entregar a gestão das escolas às câmaras,
nós então contrapomos que é mais eficaz entregá-las às “mercearias”,
controladas pelo Jerónimo Martins, ou à outra do Continente. É que esses não
brincam em serviço e são 100% eficazes.
Se
querem brincar, vão para o sítio próprio, mas não provoquem quem sabe do que
está a falar e ensinou durante 60 anos! Não brinquem com coisas sérias e tenham
juízo. Estudem os problemas e perguntem a quem se preparou a vida inteira para
poder responder.
Só
o Ministério da Educação tem vocação, e recursos, para gerir problemas ligados
à educação, e portanto é lá que ela deve permanecer. Perguntem também ao
Conselho Nacional da Educação, que tem obrigação de se pronunciar.»
Um comentário:
Mais fácil do que entregar às câmaras e juntas de freguesia, em que existe muita falta de instrução, seria entregar o ensino à Vodafone, à NOS (Nus), à MEO (Mel em brasileiro) ou à Fónix… qualquer delas estaria apta a fornecer megafones aos profs para se fazerem ouvir na turma, ou oferecer portáteis para os alunos passarem a ter aulas muito remotamente. Tão remotamente que pudessem tê-las na praia ou no campo...
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