Contei do
desastre de parapente e da corajosa ida
do pai de 83 anos – Francisco Gomes de Amorim – também no mesmo transporte – e pela
primeira vez - acompanhado por outro piloto, lançar as cinzas do filho sobre os
mesmos espaços brasileiros – Pedra Bonita - que o filho Tiago Cobra - o
primeiro piloto de speed fly a descolar do Corcovado, segundo foto e
legenda publicados no A Bem da Nação – costumava percorrer.
Deixei-me até comover na referência, mas de repente
levantei a cabeça numa risada, ao ouvir a frase da nossa amiga “Deviam
acabar com estes espectáculos porque quem está cá em baixo leva com eles “,
lançada a contar dos desastres de avioneta – dois desastres recentes seguidos,
um em Inglaterra e outro na América - que tinham colhido pessoas, a nossa amiga
completamente alheia às minhas emoções, e pondo na mesa os seus rancores contra
os causadores aéreos de mortes terrestres.
Ainda referi os causadores terrestres de muitas mortes
inesperadas – creio que em número superior - mas a minha amiga já estava
lançada noutros panoramas da nossa incredulidade actual:
- E aquele homem que mata três vizinhos por causa do
cão! A gente está onde? Isto é de cavar!
Outros exemplos foram referidos, até noutras partes do
mundo, de que o nosso pequeno país é referência enorme nesse capítulo das matanças,
mas a conversa descambou de repente, com outras fofocas sobre a “Hola”
espanhola cheia de fotos belíssimas de mulheres e palácios de arrasar, contou a
minha irmã a quem a filha Ana leva as revistas que projectam para mundos de
sonho, e que logo apontou, como contraste, as gentes afogadas no Mediterrâneo,
ou outras que escapam no terror de um mundo de perdição que sobre todos desabou,
a querer escapar ao inexplicável de tanto mal repentino.
E a nossa amiga aproveitou para mostrar que leu um
pouco do sermão de Vieira que lhes impingi:
- Eu só pergunto o que diria o padre António Vieira se
vivesse nestes tempos.
Fiquei lisonjeada e só me ri, engolindo o comentário
sobre os males no mundo de todos os tempos, e sem conserto, por muito que o
Jeová ou outros se esforçassem por mostrar o caminho – Jeová castigando, Cristo
socorrendo e abençoando, mas ele próprio sofrendo, sem culpa.
A conversa rodou sobre os futebóis, falou-se do Jesus
que é “um pavor” para a minha irmã - e para mim, assim que lhe ouço a voz ou
vejo a figura, mas desvio, embora encontre muitas vezes simultaneidade temporal,
na referência e no retrato, nos diversos canais nacionais. A minha amiga não se
convenceu, de trocadilho a descambar para o cinismo:
- Mas está benzinho! Os benfiquistas perderam-no, a
ele que está todo benzido.
Também a minha irmã deu a seguinte informação:
- Os do futebol estão a descambar. É o Mourinho, a perder
jogos, o Ronaldo a perder p´ró Messi …
E logo a nossa amiga rancorosa:
- A riqueza é tanta que não faz diferença. Aí, não
tenho pena.
Lembrei o Pinto da Costa, hospitalizado, numa operação
qualquer e logo ouço:
- O Pinto da Costa ainda vai fazer muitas operações.
Fico admirada, mas a minha amiga continua, em olhos de
serena compostura:
- Ele casou. Foi ao Brasil casar. Ela está rica. Casou
com um velho rico…
E disse mais, mas acabámos rindo com as nossas
coscuvilhices, que se centraram, a seguir, na Sara Carbonero que põe a milhas,
em beleza, a Irina, que anda com um americano, enquanto o Ronaldo fica deitado
nas pedras, mas com uma casa brutal no Monte Estoril… Eu mal sigo estas
informações e a minha irmã dá gargalhadas de surpresa pelo nosso desplante
fofoqueiro inabitual.
Para mim, pelo menos, generosa que sou, e
desconhecedora dessas particularidades existenciais da nossa aristocracia
capitalista, todos esses dados foram surpresa bem vinda. Fiquei, sobretudo,
contente por saber que o Ronaldo comprou uma casa perto de nós, talvez mesmo
com possibilidade de nos tirar do anonimato, com tão importante presença no
Monte Estoril. Até me lembro dos banhos da realeza no século passado que tanta
nomeada trouxeram a Cascais, embora a gente permaneça apenas na linha, a minha
irmã há mais tempo, e nós, por desordens inesperadas da nossa história
nacional, e a quem ela deu uma mãozinha aquando da nossa vinda.
Mas a conversa deu outra volta. Falou-se dos
brinquedos de agora, a propósito dos nossos netos que se entretêm – tão
destramente, é certo! – com esses brinquedos, quando, na nossa infância,
jogávamos e corríamos pelos passeios e ruas, em verdadeira liberdade. Agora
chega-se ao extremo de reuniões familiares com telemóveis ou tabletes ao pé,
num desligar de afectos familiares, na diversão a distância, com os amigos.
E a minha irmã comentou:
- Os brinquedos de outrora são para os velhos: «Põe
ali o pino!” ouvi eu num jogo de velhos.
E a nossa amiga concluiu:
- O mundo está dentro de uma maquineta. Aquela
caixinha não tem sentimentos.
De facto.
Mas com Álvaro de Campos ganhemos confiança:
Que
importa tudo isto, mas que importa tudo isto
Ao
fúlgido e rubro ruído contemporâneo,
Ao
ruído cruel e delicioso da civilização de hoje? (Ode Triunfal)
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