Maria
João Avillez está preocupada e tem razões para tal. Embora se compreendam os motivos de Marine Le Pen e do povo que a apoia, saturado de penetração
estranha, de terrorismo, e desejoso de tranquilidade e retoma de uma vida mais
normal e produtiva, a verdade é que a espécie de aliança com as teorias de
repulsa anti islamista ou tão só racista de Trump, do Reino Unido, que se libertou
da U.E. pelo Brexit, ou de tantos que vão observando a degradação a vários
níveis, a que se chegou, nem sequer compensada pela melhor distribuição da
riqueza - a miséria aumentando e a desigualdade social, apoiadas, contudo, no
progresso das assistências sociais, que mais inferiorizam os povos e os reduzem
a um estado de dependência esmoler pouco saudável - apesar, pois, desses
discursos xenófobos virulentos, de Marine Le Pen, Maria João Avillez
também não está tranquila com os discursos de Emmanuel Macron, bem
intencionado nas promessas mais sensatas, mais, on ne sait jamais…
E
esses são mesmo os candidatos da segunda volta, Macron com probabilidades de
apoio dos candidatos perdedores será certamente o próximo Presidente da
República Francesa. Prossigamos,
pois, como sempre: Le Roi est mort! Vive le Roi!
OBSERVADOR, 20/4/2017
Quem - por acção, intenção, omissão, inação - permitiu
a fecunda sementeira da árvore lepenista e outras árvores venenosas? Sim: só
perguntas. Mas alguém tem respostas?
1. É um desconhecido conhecido. Está
na política mas diz se “de fora”, utiliza frases de “efeito”, é prolixo, nunca
foi provado na arena política, não tem currículo, nem programa , nem partido.
Foi um ministro “jovem promessa” com lugar cativo nos palcos mediáticos. Ou
seja, está no sistema, auto-proclamando-se porém fora dele. (“Fui sempre um
apaixonado pela política mas nunca gostei da sociedade política. Não são as
pessoas mais interessantes, há muito cinismo nelas”.)
Veio
da banca (Rothchild), é jovem, enche auditórios, recruta candidatos na Net,
casou com uma professora muito mais velha (mãe do seu maior amigo) e foge-lhe o
pé para desabafos desconcertantes nos confessionários da media: “A poesia é
mais importante que a acção que “l’on porte”, a acção sem poesia torna-se na
brutalidade, não soa bem”; “para mim a política é criar, criar as formas de “liberté
première…”.
Não
sei o que fará a França desta espécie de banalidades enceradas.
2. Chama-se Emmanuel Macron, tem 39
anos, nunca disputou eleições mas pode ser o próximo Presidente da França. O
abismo entre uma campanha carburada por auditórios repletos e sondagens felizes
e a quase impossível liderança (sem tropas!) de um país exangue e em cujo mapa
partidário se esvaem os partidos ditos tradicionais e de onde se sumiu o
conceito de centro político não parece impressioná-lo. Não me lembro de combate
eleitoral tão simultaneamente incerto e tão tremendamente determinante para o
futuro francês e para o nosso, europeus amarrados uns aos outros, numa união
tremelicante e indecisa.
Há
muito que não se vivia momento sulfuricamente tão perigoso como o que se vive
hoje, em França, na Europa, nos Estados Unidos e em tanto mundo, embora me
pareça não haver ainda a consciência da perturbante incerteza que são os dias
que correm (para o abismo, certamente)
3. E no entanto (pequeno
entre-parêntesis) há optimistas. Um estudo recente de uma empresa de sondagens
(IFOP) mostrou que 71% dos franceses que pensam votar Le Pen dizem-se
“pessimistas” quanto ao futuro do seu país, enquanto com o eleitorado de Emmanuel
Macron (maioritariamente de esquerda e de centro) sucede o oposto:
72 /% confessam “optimismo” e fé na França.
Trevas
versus luz? Ressentimento versus esperança? Medo versus confiança ? Instalação
versus abertura? Vale o que vale que é nada ,mas o interesse reside no facto de
o optimismo do eleitorado de Macron não ser geracional. Isto é, este
“optimismo” tão expressivamente confessado, vai dos 18 aos 65 anos.
4. Tudo porém no puzzle
francês parece contaminado pela iminência do perigo, todas as combinações
políticas nos surgem marcadas pelo selo da imprevisibilidade. E quando são
já realidades, metem medo: a Frente Nacional de Marine Le Pen está a
crescer. Se aumentar substancialmente o seu número de deputados (risco
talvez não totalmente inverosímil), a FN poderá assumir o comando parlamentar
da Assembleia. E depois? Que fará com isso e face isso outro Presidente da
República que não a líder da FN?
E
já agora… como me proibi a mim a mesma de não descartar nenhuma hipótese por
mais absurda ou indigesta que ela se coloque no panorama político francês e
europeu, já agora que seria da França a arder na fogueira dos extremismos?
Entalada entre a líder lepennista — amparada numa confortável base politica
–, e um presidente de extrema-esquerda como Mélenchon?
Claro
que é demasiado inverosímil para ser verosímil, mas nas mais imprevisíveis — e,
repito, perigosas — eleições francesas de que há memória, eis o radical Mélenchon
galgando velozmente os degraus na escada das intenções de voto (supostamente
com alguma direita a ajudar à subida). E mesmo sabendo nós como as pessoas
mentem nessas “auscultações”, eis ainda o dito Mélenchon a poder “de repente”
ver-se catapultado para uma segunda volta das presidenciais. Deixando muito
atrás o socialista Hamon e a sua efémera glória de modesto vencedor das
primárias do PSF (suspeito até que a esta hora, face às ruínas socialistas,
haja alguém no PS francês a pensar que as eleições primárias são capazes de não
ter sido uma ideia assim tão boa).
5. François Fillon
também se tornou num caso: não pelos casos que arrasta e para onde o arrastaram
mas por ter logrado o feito de se manter no cartaz eleitoral e não apenas como
figurante, antes o oposto. É um sobrevivente de si mesmo. Mas mesmo que vá
longe (é como lhes digo, nada descarto) tem às costas um partido incapaz,
fratricida e rancoroso que é hoje quase infrequentável. Ao contrário do que
de relance — mas só de relance — possa parecer, não é só a social-democracia
como a conhecemos e com a qual coabitámos durante décadas que agoniza: quem
“compraria” hoje os “Les Republicains” de François Fillon, Sarkozy e os outros,
mesmo que estivessem em saldo?
6. Por tudo isto e
para muitos, a vitória de Emmanuel Macron pode ser um alívio só porque mete
menos medo e porque é um moderado civilizado e pró-europeu (embora ninguém
saiba o que ele quer politicamente. nem o que pensa sobre o que quer que seja).
Mas… com que partido ganhará autoridade, peso, influência e um governo para a
França – tudo enfim o que faria dele o “chefe” que não é – se só tem adeptos?
Sem tropas próprias e em terreno tão minado politicamente, que poderá fazer
para garantir a sobrevivência do próprio regime e combater a ameaça de implosão
da V República que tanto agradaria a alguns? Dizer risco é ainda dizer pouco.
No
plano externo, o mínimo: uma forte convicção europeia, a fé no euro, a
confiança na revitalização do papel da França no mosaico europeu. No resto, a
imprevisibilidade, a simultaneidade, a natureza dos actuais conflitos em cena —
como actuará o inexperiente e francês Macron? Com que prioridades e parceiros?
Sim,
não nos restam senão perguntas.
Tão
grave quanto a origem tóxica do que hoje ameaça o mundo, há aquilo que Alain
Touraine resumiu há dias em Lisboa: “um vazio no pensamento social e político”.
Um vazio tão grande e tão vazio que não se vê quem possa saltar do palco
presidencial francês (ou seja de que palco for) e começar a trocar as perguntas
por respostas.
7. Que teve que
acontecer à ex-gloriosa pátria francesa, hoje fragmentada, abstencionista e
decadente, para chegar a esta terra política inabitável? Quem — por acção,
intenção, omissão, inação — permitiu a fecunda sementeira da árvore do lepenismo
e outras árvores venenosas?
Sim:
só perguntas. Peço desculpa. Mas alguém tem respostas?
Extractos da Internet:
Contexto
O
Presidente da República Francesa
é eleito para um mandato de cinco anos num sistema de dois turnos promulgado
nos termos do artigo 7º da Constituição. Se nenhum candidato obtiver a maioria
absoluta (isto é, incluindo as cédulas em branco e nulos) de votos no primeiro
turno, um segundo turno será realizado duas semanas mais tarde entre os dois
candidatos que receberam mais votos. Em 2017, o 1º e 2º turnos estão
previstos para 23 de Abril e 7 de
Maio, respectivamente.
Resultado das Eleições Presidenciais em França, em
23/4/17
23 Abr, 2017, 22:48
Quase
47 milhões de franceses foram este domingo chamados a votar na primeira volta
das eleições presidenciais francesas.
Emmanuel
Macron e Marine Le Pen foram os dois candidatos mais votados na primeira volta
e passam à derradeira votação. François Fillon e Benoît Hamon
anunciaram já que apoiam o ex-ministro socialista.
Candidatos
do En Marche! e da Frente Nacional de novo a votos a 7 de maio.
Hamon e Fillon apelam ao voto em Macron.
Notas da Internet:
Segundo
as estimativas do instituto Ipsos, o centrista Emmanuel Macron é o vencedor
da primeira volta, com 23,7%, seguido de Marine Le Pen, líder da Frente
Nacional, com 21,7%. Ambos vão à segunda volta, a 7 de maio, com
todas as sondagens realizadas até hoje a darem uma larga vitória ao fundador do
En Marche! face à líder da FN.
Em
terceiro lugar, empatados, surgem François Fillon e Jean-Luc Mélenchon, com
19,5%. O socialista Benoît Hamon não vai além dos 6,2%. Os restantes candidatos
não vão além dos 5%.
Depois
de saudar os apoiantes a caminho do palco, Emmanuel Macron começou por dizer
"Voilá!". Dirigindo-se aos "caros compatriotas", o
candidato do En Marche! lembrou que neste 21 de abril, o povo francês foi votar
em massa. E "decidiu levar-me à vitória na primeira volta" deste
escrutínio.
O
candidato do En Marche! chegou à Porte de Versailles de mão dada com a mulher,
Brigitte. Mostrando-se "honrado" com a escolha dos franceses,
o ex-ministro saudou os dez rivais, nomeando-os um a um.
Recebido
com gritos de "Macron, presidente!!!", disse que quer
"reconciliar a França para ganhar dentro de 15 dias e amanhã governar o
país". E promete ser um presidente que "protege, transforma e
constrói".
"O
desafio a partir desta noite não é ir votar seja contra quem for", afirmou.
"O desafio é que todos possam encontrar o seu lugar em França e na
Europa". O candidato prometeu criar uma nova maioria de governo, feita
de "novos rostos".
"Não
há várias Franças. Há apenas a França dos patriotas", garantiu,
acrescentando: "Quero ser o presidente dos patriotas face à ameaça dos
nacionalistas", antes de admitir ter pela frente uma tarefa
"imensa".
Um
pouco antes, Marine Le Pen já tinha reagido aos resultados. "Chegou
o momento de libertar o povo francês", disse. Afirmando-se como "a
candidata do povo", a líder da Frente Nacional apelou a todos para se
juntarem a ela na segunda volta a bem do "interesse superior do
país". Garantindo estar em jogo "a sobrevivência da França",
Marine Le Pen recordou que a grande questão destas eleições passa por travar
a "mundialização selvagem que ameaça a nossa civilização". Agradecendo
aos franceses por lhe terem permitido passar a "primeira etapa que deve
conduzir os franceses ao Eliseu", a líder da Frente Nacional
considerou o seu resultado como "um acto de orgulho francês, o de um
povo que volta a erguer a cabeça, certo dos seus valores e confiante no
futuro".
Pouco
antes, fora François Fillon a reagir. "Não há outra
escolha a não ser votar contra a extrema-direita. Votarei a favor de Emmanuel
Macron", anunciou o candidato da direita. O ex-primeiro-ministro e
candidato d'Os Republicanos admitiu que não o fará "de ânimo leve",
mas explicou ser necessário "escolher o que é preferível para o nosso
país". Recordando o passado de violência da Frente Nacional, Fillon
explicou ainda que com Marine Le Pen no Eliseu, França iria à falência,
sublinhando que "o extremismo só pode trazer infelicidade".
Também
Alain Juppé, o ex-primeiro-ministro derrotado por Fillon nas
primárias da direita, apelou a votar Macron. "O nosso país precisa
de reformas corajosas para reconstruir um Estado forte, voltar ao pleno
emprego, voltar a colocar a educação e a formação no centro das políticas
públicas. Espero que Emmanuel Macron restabeleça a credibilidade de França no
cenário europeu e mundial, e que dê à juventude de França a esperança num mundo
novo".
O
primeiro a reagir foi Benoît Hamon. "Falhei,
falhei!", afirmou o candidato da esquerda, sublinhando que esta
foi "uma derrota moral para a esquerda, toda a esquerda".
Afirmando-se "orgulhoso" de ter feito uma campanha
"positiva" que "voltou a dar esperança aos jovens do país",
o ex-ministro garantiu no entanto que "a esquerda não está morta".
Apesar
de considerar Macron um adversário político, Hamon apelou a votar no
candidato do En Marche! para "abater a extrema-direita". Também
o primeiro-ministro socialista Bernard Cazeneuve pediu aos franceses para irem
às urnas a 7 de maio votar em Macron "para bater a FN, para travar o
projeto desastroso [de Marine Le Pen] de regressão da França e de divisão dos
franceses".
O
presidente François Hollande, que decidiu não se candidatar a um
segundo mandato, já ligou a Macron a felicitá-lo.
No
Twitter, Manuel Valls juntou-se ao apoio socialista ao candidato do En
Marche!. "Como na primeira volta, votarei Macron a 7 de maio. Cada
um deve medir a gravidade do momento e fazer tudo pela união. Pelo França.",
escreveu o ex-primeiro-ministro, derrotado por Hamon nas primárias da esquerda.
Estas
são as primeiras presidenciais a decorrer em estado de emergência, que foi
declarado em novembro de 2015 após os atentados de Paris. A segurança foi
garantida por 50 mil polícias e gendarmes e sete mil militares da Operação
Sentinela (antiterrorista).
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