Texto de Kai Littmann
saído no blog “A Bem da Nação”.
OLFGANG SCHÄUBLE: QUEM É O SENHOR
AUSTERIDADE?
Wolfgang
Schäuble é na política o que o «Bayer Leverkusen» é no futebol: o eterno número
2, que nunca chega ao título
É
o dele, ainda mais do que o da Chancelerina Merkel, o rosto da política
austeritária alemã. Mas quem é ele? Sabemos que é o ministro das Finanças da
Alemanha. Sabemos que se encontra entre os «falcões» da política alemã. Sabemos
que se desloca numa cadeira de rodas. Sabemos também que é jurista, pai de
família e deputado pelo Ortenau, a região que faz fronteira com a cidade
francesa de Estraburgo. Quanto ao resto, sabemos pouco sobre este homem que,
desde há várias décadas, anseia pelo poder na Alemanha, sem jamais tê-lo
verdadeiramente conquistado. Razão para nos perguntarmos se a intransigência da
sua política na cena europeia não constituirá uma espécie de «vingança» por um
destino pessoal com razões de sobra para amargurar um homem.
Nascido em 1942 em Friburgo, Wolfgang
Schäuble chegou cedo à política. Seguramente inspirado pelo seu pai, Karl
Schäuble, deputado da CDU no parlamento regional de Baden (1947–1952, até à sua
fusão com Wurttemberg), Wolfgang abraça a política a partir de 1961 e torna-se
membro da «Junge Union», organização de jovens conservadores. Numa época
marcada pela revolta da juventude contra a geração da guerra, Wolfgang Schäuble
posiciona-se nos antípodas da «geração de 68» – os valores que defende são
conservadores.
Em 1972, aos 30 anos, depois de ter concluído
com brio os seus estudos em Direito, torna-se deputado ao Bundestag [o
parlamento alemão] – era o início de uma carreira política assaz excepcional
que, no entanto, jamais o levaria lá aonde queria: ao topo do poder. Com Helmut
Kohl, Schäuble torna-se ministro sem pasta (de 1984 a 1989) e influente chefe
da Chancelaria, antes de se tornar Ministro do Interior (de 1989 a 1991 e de
2005 a 2009). Foi ele quem teve a seu cargo as negociações do contrato de
reunificação com a RDA, juntamente com o seu homólogo de leste Günter Krause.
Mas os anos do seu maior sucesso político foram também os anos dos seus maiores
fracassos pessoais.
Primeiro, foi vítima de um terrível atentado.
Em 12 de Outubro de 1990, ou seja, imediatamente após a reunificação alemã (3
de Outubro de 1990), um doente mental (que não pôde ser julgado, por
inimputabilidade, e acabou internado num hospital psiquiátrico) disparou sobre
Schäuble quando este estava num evento eleitoral pela sua região em Oppenau.
Malgrado os ferimentos, Schäuble, paraplégico, regressava à política, pois era
ele o sucessor que havia sido designado por Helmut Kohl, cujo reino de 16 anos
chegava por esses dias ao fim.
Schäuble estava tão perto do seu objectivo,
mas um escândalo relacionado com o financiamento do seu partido iria afastá-lo
sem apelo. Foi assim que se viu obrigado a assumir ter aceitado em 1994 um
donativo de 100 000 marcos, em numerário, entregues pelo comerciante de armas
Karlheinz Schreiber – um montante que nunca apareceu nos relatórios de contas
do seu partido. Durante muito tempo, Schäuble havia negado ter recebido esse
donativo, antes de confessar tudo e de se desculpar no Bundestag por ter
«transgredido a lei». Esse escândalo aniquilaria os seus planos de sucessão a
Helmut Kohl, que nesse momento o preteriu em favor de uma jovem promissora
provinda da antiga RDA – Angela Merkel, de quem Schäuble se tornaria um
subordinado até hoje, 43 anos volvidos desde o início da sua carreira no
parlamento alemão (um recorde), cujos últimos dias Schäuble vive neste momento.
Talvez o drama de Wolfgang Schäuble seja
justamente o ter sempre estado na sombra de outra pessoa qualquer – e talvez
seja isso mesmo que azedou este homem que parece ter prazer em impôr sofrimento
aos povos do sul da Europa. A reunificação alemã em 1989/90 não lhe foi jamais
atribuída, mas ao seu patrão Helmut Kohl, e na corrida pelo poder na Alemanha,
que no entanto lhe parecia destinado, chegou sempre em segundo lugar. É um
pouco como o Bayer Leverkusen no futebol, que está sempre entre os melhores mas
que nunca chega ao título.
Nas relações franco-alemãs, Schäuble
mostrou-se bastante discreto, e no entanto, enquanto deputado pelo Ortenau,
região fronteiriça franco-alemã, poderia e deveria ter-se empenhado bastante
mais nessa cooperação no coração da Europa. Sucede que Schäuble teve sempre os
olhos postos em Berlim, Bruxelas e Estraburgo, e nem tanto na sua própria
região.
Em termos de política interna, o ministro dos
Assuntos Internos Schäuble foi considerado um «falcão», sempre a tentar fazer
do Estado alemão uma espécie de Estado vigilante, e cujas propostas radicais em
matéria de Segurança Interna chocaram muitos alemães. No mês de Outubro de
2009, foi atribuído a Schäuble o «Big Brother Award», pela «sua obsessão em transformar
o Estado de direito democrático num Estado autoritário»: recebeu nessa data,
com a reeleição de Angela Merkel, a pasta das Finanças. Quanto ao resto,
Schäuble será recordado pelas numerosas iniciativas legislativas de tal forma
duras que até mesmo o seu próprio partido tentou por várias vezes demarcar-se
dele.
A empatia é uma palavra que não figura no
vocabulário de Wolfgang Schäuble, um homem que dedicou a sua vida inteira à
política, ao seu partido, à sua carreira – uma carreira que no entanto nunca
lhe dedicou a ele a glória tão desejada. A frustração daí resultante
pressente-se no seu discurso, por vezes no limite da malícia, e sempre na mais
absoluta intransigência. Quererá Schäuble partilhar o insucesso da sua vida
política com o resto da Europa?
Schäuble faz parte de uma geração de homens e
mulheres profissionais da política que, felizmente, estão a aproximar-se a
largos passos da aposentação. Aos perto de 44 anos de vida como parlamentar,
contando já com 43 anos de jogos de poder, 43 anos de luta para chegar aonde
nunca conseguiu, um terrível atentado, os escândalos, Schäuble teve direito a
uma vida política das mais interessantes do seu tempo, mas é agora tempo de
deixar o seu lugar a uma outra geração, que compreende melhor o que está em jogo
na nossa época. Aos 73 anos, parece totalmente dissociado do mundo de hoje e
seria desejável que deixasse o seu posto antes de fazer ainda mais estragos à
Europa e aos povos europeus.
Wolfgang Schäuble, pesadamente condecorado,
figura entre os responsáveis pela transformação da Europa numa espécie de zona
de jogos para o capitalismo financeiro, em detrimento dos 500 milhões de
europeus e europeias. Schäuble teria gostado de figurar nos livros de História
enquanto arquitecto de uma nova Europa – mas se algum dia vier a estar nessas
páginas, será mais por ter sido um dos coveiros dos valores humanistas
europeus. E no entanto, podemos partir do princípio de que Schäuble tinha à
partida as melhores intenções relativamente à Europa. Certo é que em todos os momentos-chave
da sua carreira, ao nível da construção europeia, Schäuble também não foi capaz
de alcançar o seu objectivo. Eis pois a tragédia do homem – que faria melhor se
parasse agora de se vingar na Europa por ter falhado os seus objectivos
pessoais.
Comentário:
No
caso português, pelo menos, essas teriam que ser as políticas a seguir, pois há
muito andávamos a comer em gamela alheia, e houve alguém ainda jovem que
procurou lutar para salvar a nação da desonra, resgatando uma dívida que a
abafava. Pena é que nele – país - se esforcem muitos para deitar abaixo esse
que nos deu uma lição: uns em traficâncias significativas de miséria moral, destruidoras
da economia, outros em gritos de ataque grotesco e sem qualquer decência, ou em
falsas vozes de doçura sibilina, a sugerir ingerências criminosas desses que
eles pretendem acima de tudo responsabilizar para atirar fora. Imagem das
peixeiras gritando e escamando e estripando, eis o que, de facto, parecemos. E
ao contrário do povo germânico, que reconhece o valor a Shäuble e o mantém no
governo, apesar de em cadeira de rodas, nós, o que pretendemos - talvez, todavia, generosamente, somos de brandos costumes - é
chutar o nosso “Shäuble”, antes que ele fique na cadeira de rodas que lhe vamos
preparando.
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