quarta-feira, 25 de março de 2015

Vulcano



Em apoio a algumas curtas mas certeiras análises de Vasco Pulido Valente, que sempre encantam pelo sabor epigramático das suas definições, este artigo de Teresa de Sousa (Público, 19/3/15), artigo sério, de aluna aplicada, que nos alerta para a eminência de um conflito entre as forças de leste e as de oeste, caso a Grécia saia do Euro e procure o seu Padrinho do leste, esgotados os apoios do seu Padrinho do oeste, que parece não aceitar mais as árias das suas artimanhas para protelar o cumprimento das suas promessas de pagamento. Escudados com o exemplo da digna Penélope, que desfazia de noite o manto que fabricava de dia, para não se comprometer com nenhum pretendente, os representantes do governo grego assim vão jogando às escondidas, entalados em compromissos que não pensam assumir, dando uma laçada e logo a desfazendo. ratos esquivando-se para outros terrenos onde poderão roer até ver.
Diz-se que Putin esteve desaparecido. Quem sabe se para combinar melhor com Tsipras os próximos passos da futura aliança salvadora da Grécia e ateadora da destruição no mundo para cá dos Urais?
Creio que os representantes do povo grego se não ralarão muito com isso, brincando também com o seu fogo próprio, Hefaísto empunhando as suas armas, no fulgor fátuo do fogo de que ele é o deus!

A Europa brinca com o fogo?

Teresa de Sousa


1. Jogo de poker? Berlim faz bluff? Ou é Atenas? As respostas ainda estão à espera de alguns esclarecimentos adicionais.
A primeira, que diz respeito a Berlim, é fundamental. Angela Merkel entregou a gestão da crise grega ao seu ministro das Finanças, através do Eurogrupo. Não quer a Grécia na agenda oficial da cimeira que hoje começa em Bruxelas, mas parece estar disposta a falar com o seu homólogo grego, Alexis Tsipras, à margem da reunião, por forte insistência deste último, e na companhia do Presidente francês e dos presidentes da Comissão e do BCE. Antes tinha confirmado que receberia o seu homólogo grego na segunda-feira em Berlim. Reserva totalmente o jogo. Entretanto, Wolfgang Schäuble eleva a parada, aproximando-se de um ponto de não retorno. Não é apenas a inflexibilidade quanto às reformas. O ministro voltou a colocar o cenário da saída do euro em cima da mesa e acrescentou-lhe outro, ainda mais preocupante: o chamado Grexident (a Grécia pode entrar em default por acidente, tornando a sua saída irreversível).
As interpretações do seu jogo não são unânimes. Para alguns analistas, trata-se de exercer a pressão máxima sobre Atenas para que mantenha os compromissos com as reformas e as metas definidas pelos credores. Para outros, Berlim chegou à conclusão de que uma saída da Grécia não teria um custo demasiado elevado, como teria tido em 2010, graças à menor exposição da banca europeia à dívida grega e à panóplia de novos instrumentos que a zona euro entretanto criou para limitar um contágio. Muitos governos europeus discordam, como discorda totalmente a Comissão Europeia. Aceitam-se apostas
2. Do outro lado, surgem sinais contraditórios que dificultam o entendimento sobre o que tenciona fazer o governo grego. O Syriza encontra-se na posição “insustentável” de ter de “adiar” as promessas que fez aos gregos nas eleições de Janeiro. Calculou mal os apoios europeus e avaliou ainda pior a sua capacidade de pressão sobre Berlim, convencido que o risco de saída assustaria toda a gente. A posição de Alexis Tsipras é extremamente difícil. Continua a insistir que a Grécia não se deixará chantagear. Mas, ao mesmo tempo, move-se quase desesperadamente para encontrar uma solução, indo ao ponto de avisar que os cofres gregos estão perigosamente vazios. Aparentemente, Atenas tem uma escolha difícil: ou paga a dívida que vence este mês ou as pensões e os salários da Função Pública. Nesta situação, Tsipras tem de calcular muito bem os passos que dá sob pena de realizar a profecia da saída “acidental” de Schäuble. Por enquanto, continua a jogar com um pau de dois bicos. No dia em que a chanceler aceitou recebê-lo em Berlim no dia 23, o Governo grego anunciou a sua deslocação a Moscovo no dia 8 de Abril. É, mais uma vez, uma jogada arriscada que surge numa altura em que o efeito “Varoufakis” já não faz rir ninguém e o ar cordato de bom rapaz que Tsipras exibe em Bruxelas também já não conta para muito. Ontem, os únicos aliados de que dispõe, Juncker e Pierre Moscovici, o comissário responsável pelos assuntos económicos e monetários, revelaram o seu desânimo quanto às negociações, aumentando também eles a pressão sobre Atenas.
3. Se era preciso mais algum sinal de que a questão grega envolve riscos enorme, mesmo que de outra natureza, ele veio de Washington. O Presidente Obama tem pressionado os responsáveis europeus para que resolvam rapidamente e a bem o problema grego. Decidiu enviar a Atenas Vitoria Nuland, subsecretária de Estado para a Europa e a Eurásia, para avaliar in loco a situação. Para Washington, a questão é fundamentalmente geopolítica. Deixada à sua sorte, a Grécia poderia inclinar-se cada vez mais para Moscovo, quebrando os laços com o Ocidente que a União Europeia garante. “A Rússia tem um grande interesse em ver a crise grega agravar-se”, diz ao Guardian Dimitris Keridis, professor de ciência política na Universidade de Atenas. “Precisamente porque [uma saída] afectaria a zona euro, enfraqueceria a Europa e afastaria a Grécia do Ocidente”. O diário britânico lembra que poucos sítios são tão importantes na região como a ilha de Creta, “onde estão instaladas capacidades de comando e controlo e apoio logístico aos Estados Unidos e à NATO”. “Se a Grécia saísse, a Turquia poderia ir a seguir”.
Pelo menos publicamente, esta preocupação não parece incomodar os europeus, mesmo se a questão mais séria que Merkel quer discutir no Conselho Europeu seja a relação com a Rússia. Há, todavia, entre os europeus outro debate que é mantido quase em surdina e que diz respeito a um outro contágio, mas de natureza política. Muita gente defende que é preciso mostrar que o Syriza acabará por fracassar no seu objectivo de mudar as regras do jogo. O cenário contrário seria uma oferta ao Podemos e ao Cidadãos em Espanha, dando aos movimentos populistas mais um bom argumento para conquistar votos.
O problema é que há coisas “impossíveis” que rapidamente se tornam possíveis. Já ninguém fala da Crimeia, ocupada e anexada pela Rússia, porque uma coisa impossível aconteceu. A saída “impossível” da Grécia pode rapidamente tornar-se possível. Claramente, a Europa não está a conseguir definir aquilo que é o seu interesse fundamental, que permita ver os vários desafios que enfrenta num contexto global. Também não se espera que haja esse debate no Conselho Europeu. As decisões tomam-se cada vez mais à margem das cimeiras por um núcleo reduzido de protagonistas. É também por isso que os extremos ganham força política.
http://s.publico.pt/NOTICIA/1689612http://s.publico.pt/conselho-europeu/1689612http://s.publico.pt/europa/1689612http://s.publico.pt/espanha/1689612http://s.publico.pt/grecia/1689612http://s.publico.pt/russia/1689612http://s.publico.pt/turquia/1689612http://s.publico.pt/angela-merkel/1689612http://s.publico.pt/governo/1689612http://s.publico.pt/eleicoes/1689612http://s.publico.pt/uniao-europeia/1689612http://s.publico.pt/bce/1689612http://s.publico.pt/divida-publica/1689612http://s.publico.pt/mundo/1689612http://s.publico.pt/funcao-publica-975/1689612http://s.publico.pt/comissao-europeia-1029/1689612http://s.publico.pt/berlim/1689612http://s.publico.pt/crimeia/1689612http://s.publico.pt/alexis-tsipras/1689612http://s.publico.pt/bruxelas/1689612http://s.publico.pt/estados-unidos/1689612http://s.publico.pt/wolfgang-schauble/1689612

Nenhum comentário: