Estranhei a minha amiga. Não é que não esteja já habituada
a certas suas insinuações sobre a minha falta de combinação habitual nas cores
do meu vestuário, ditos que por vezes até ferem a minha autoestima, pois uma
pessoa tem a sua dignidade e nem sempre o estado de espírito lhe permite
aceitar esses reparos com a sábia indiferença que põe no espírito os valores de
relevo, pelo menos para si própria. A verdade é que me seduz a beleza, quer
física quer do trajar e por isso fiz o reparo sobre a bonita cabeça da minha
irmã, assim que cheguei, e logo a minha amiga, profusa e ampla de gestos, se
saiu a confirmar que bastava ver a diferença entre as cabeleiras de uma e outra
das irmãs para concordar que a cabeça dela estava inegavelmente muito acima da
minha, de cabelos caindo enxutos, sem armação, sobre a minha caixa craniana,
apesar de também ter ido na véspera à cabeleireira. Realmente não esperava ser alvo
de um confronto tão inesperado, e até me senti meio constrangida com o paralelo,
mas a minha amiga nem notou e continuou a dissertar com o domínio habitual,
sobre os porquês de tais diferenças.
O que vale é que eu tinha mais propostas na manga, e logo
que pude referi a questão das canções do Festival. Ninguém gostara, e falou-se
da Simone, que a minha irmã chegara a ouvir e detestara a sua voz moribunda,
falando a seguir nas canções dos festivais de outrora, que até muitas das que
não ganhavam ficavam no ouvido como a do Jorge Fernandes, “Umbadá”. A minha
amiga confirmou sobre o festival: «- Não tem interesse nenhum o festival. Zero!»,
o que me fez estremecer, pelo cortante do tom, por muito que já estivesse habituada.
Contei então que no sábado à noite vira parte de um programa de evocação da
música francesa de outrora, na TV5, uma vez mais expressão de cultura, requinte,
delicadeza profundidade de interpretação e de sentimentos expressos, de beleza
na melodia e nos gestos, na transposição de canções antigas, que os novos
cantavam, às vezes acompanhados pelos cantores ainda vivos, como Adamo, e
Johnny Hallyday, autênticas paradas de arte e boa apresentação também pelos locutores.
Também tratámos de fofocas, desta vez sobre Alexandra
Lencastre, que a minha amiga admira e a minha irmã acha provocadora, mas eu,
que a ouvi há pouco numa entrevista, achei que ela se estava nas tintas para as
opiniões, por ser bonita e atrair as homenagens masculinas, causa das suas atitudes
desdenhosas, contrabalançadas por um extremo carinho com os deserdados.
-“A Alexandra Lencastre está a fazer um papelão numa
telenovela em Angola, estão encantados com ela, não sei se foca os problemas do
racismo e da lixeira a par da luxúria citadinas “ - defende a minha amiga que
anda sempre a par das questões melindrosas.
Aproveitei a referência a Angola para lembrar, decididamente
votada à cusquice, que a Isabel dos Santos não é nada espaventosa no vestir, e
mansamente a minha amiga concluiu:
- “Ela não se dedica muito à aparência. Só quer é
dinheiro e exposição.”
Mas a Elsa chegou, contou do seu mundo familiar, de
surpresas sempre para nós, o Afonso com as notas máximas sem esforço, como já o
fora na Suíça, a Diana iniciando a sua vida social em festas no Pavilhão Atlântico,
sempre sob o controlo da mãe, compreensiva e exigente, Pavilhão que abarrotara
de malta, provando que a vida por cá também borbulha, e sempre em festival.
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