Entre
os nomes dos recreantes do Coliseu dos Recreios, citados por Alberto
Gonçalves, na sua Crónica de 22/3/15 – Agitação Social -que ali
foram para se exprimirem e exibirem as suas competências, em função de uma causa
comum – desfeitearem o Governo para uma possível substituição por eles
próprios - encontro um nome – Carlos Mendes – que tenho visto num
programa musical de António Victorino de Almeida – Pianíssimo -
intercalando umas dicas que pretendem ser cultas, e não passam de mastigações snobes
sobre arte, acompanhado de uma senhora de idade no papel de pateta ignorante, recebendo
as interpelações trocistas do seu cicerone, ignorante farfalhudo que nada explica,
muito à maneira portuguesa, pretendendo ser engraçada e sendo apenas de uma
gesticulação e elocução reles e atrevida. Não compreendo como se pôde macular de
sketches grotescos os programas de um maestro e compositor de valor, nas deambulações
acompanhadas que faz às cidades dos grandes compositores austríacos ou outros, contando
da sua arte, dos seus destinos, das suas biografias e não raro exemplificando os
seus ensinamentos com breves concertos demonstrativos ou mesmo com os
magníficos concertos dados por uma excelente pianista austríaca. Se tal esquema
programático partiu do próprio maestro português, que todos vêem como folgazão,
parece-me um erro grave, que ofende a arte e os espectadores que não
compreendem a ordinarice da segunda deambulação - a de Carlos Mendes e da sua
acompanhante “doméstica” – aviltante e burlesca, sem respeito nem graça, não
sei se para o compositor se elevar aos olhos do público, pelo contraste, se
para rebaixar o próprio público português, na mistura indiferente de bom gosto e
de ausência dele. Não me admira, contudo, que seja mais uma graça deste homem
de valor mas ressabiado, a quem, nos idos da revolução de Abril, ouvi explicar
que o hino nacional devia ser substituído, o que me chocou muito na altura, apesar
de o meu pai lhe seguir religiosamente os programas de então, também
itinerantes e de bengala, e ainda sem Carlos Mendes.
Troça,
sim, merecida, é a do texto de Alberto Gonçalves a respeito de mais uma das reuniões
feitas pela esquerda, no Coliseu dos Recreios, em demonstração de que o país
não dorme, atento aos desmandos, com o pensamento nos que sofrem e
instigando-os no sentido de revoltas que definitivamente apeiem o Governo. E
aponta as figuras salientes dos participantes, que lá foram discursar ou
recitar poemas ou cantar tristes baladas ou outros cânticos condizentes com a seriedade
dos protestos, nos trocadilhos do mais baixo nível como esse do “Não TAP os
olhos”, na mediocridade de doestos há muito repetidos, instigando ao ódio, numa
prova de falso amor.
Riamos
com Alberto Gonçalves, não só no artigo sobre a consciência cívica dos
portugueses, mas nos seguintes, sobre a participação nas claques ou sobre a
vasta história do mundo da esquerda com a respectiva ambição da nossa:
Agitação social
por ALBERTO GONÇALVES22 março 2015
Exagera-se
muito quando se acusa os portugueses de falta de consciência cívica. Só esta
semana houve três admiráveis exemplos da nossa apetência para colocar o dedo na
ferida, pôr os pontos nos is e repetir clichés. O primeiro foi o Congresso da
Cidadania, Ruptura e Utopia, organizado pela Associação 25 de Abril, para
pensar o estado do país. Naturalmente, pensou-se que o país vai mal. Entre os
participantes, brilharam nomes como Marinho e Pinto (é um único indivíduo),
Sampaio da Nóvoa (autodesignado "presidenciável"), o Sr. César dos
Açores, o penteado de Paulo Morais e aquele rapaz do partido Livre. Melhor é
difícil. Mas não impossível: o tal Dr. Nóvoa confessou dever a Abril tudo o que
é (?) e declarou chegado "o tempo da coragem e acção". Garcia
Pereira, aplaudido com entusiasmo, mostrou--se contra a prisão de José Sócrates.
E Vasco Lourenço, promotor da coisa, exigiu a "autoridade moral de quem
nos dirige" e prometeu pela enésima ocasião nova insurgência, armada ou
não. Em suma, ou o povo desata a votar nas sugestões deixadas pelo Congresso da
Cidadania, Ruptura e Etc., ou o povo será endireitado à força. Se a democracia
não aprendeu os democráticos valores de Abril, a democracia precisa assaz
compreensivelmente de uma lição.
O
segundo exemplo de indignação justa prende-se com o movimento Não Tap os Olhos,
trocadilho que diz tudo e que só por si merecia um prémio de criatividade. O
movimento juntou no Coliseu dos Recreios artistas que se opõem à privatização
da companhia aérea. Uma fadista explicou que a TAP não pode ser privatizada
porque é um "valor de bandeira". Um fadista esclareceu que a TAP não
pode ser privatizada porque um cunhado dele trabalhou lá. Carlos Mendes, Jorge
Palma e Sérgio Godinho desfilaram sucessos. Maria do Céu Guerra cometeu a
leitura de um poema. António-Pedro Vasconcelos falou em "delapidação do
património", ficando por apurar se se referia ao património da TAP ou ao
dos contribuintes que a financiam indirectamente e ao dos passageiros que
directamente pagam várias vezes o preço de um bilhete low cost. Certo é que
cabe a cada português assegurar que os artistas citados não descem à ignomínia
de viajar em empresas estrangeiras. Caso contrário, os artistas juntam-se aos
restantes e hipotéticos 75 mil subscritores de uma petição à AR e, de modo a
provar que não brincam com o dinheiro alheio, compram a TAP só para eles.
Porém,
o maior exemplo de levantamento popular e espontâneo, até pela grandeza da
causa, é o menos noticiado. Falo evidentemente do Movimento Cívico José
Sócrates, Sempre, com vírgula e tudo. O MCJS,S foi fundado por um reformado da
PSP, uma funcionária autárquica, uma antiga professora e o inevitável
empresário da Covilhã, cujos filhos andaram, julgo que de livre vontade, ao
colo do ex-primeiro-ministro. O grupo convenceu-se de que Sócrates é um
"preso político", encarcerado por um "plano da direita" e mantido
fechado por "forças ocultas". Nem de propósito, respondem com um hino
de apoio que inclui versos tão belos quanto: "Liberdade não morre/Nem
silêncio pesado/De um povo a entristecer/Por te saber tão magoado".
Afinal,
sob as grilhetas da troika e a opressão reaccionária, Portugal agita-se. E só
um desmancha-prazeres diria que, para isto, mais valia estar quieto.
Domingo, 15 de Março
Claques
Ao
comentar os comentários de um comentador da bola, o treinador do Porto garantiu
que, "se fosse português, estaria preocupado, porque esse senhor foi
ministro". Não conheço as circunstâncias de Espanha e, evidentemente, o
Sr. Lopetegui não conhece o nosso país, já que inúmeros sujeitos que andam
pelas televisões e pela imprensa a passear o estatuto de adeptos fanáticos
foram ou são ministros, secretários de Estado, deputados, juízes, advogados,
médicos, etc. Todos acham normalíssimo acumular uma profissão de alegada
responsabilidade com um discurso próprio dos Super Dragões, dos No Name Boys
ou, em prol da equidade, da Juve Leo. E nenhum português se preocupa.
Sexta-feira, 20 de Março
O poder da fé
Se
não contarmos com a Revolução Francesa, ou os joviais tempos do Terror, no
princípio foi a URSS. Depois, todo o Leste Europeu. De seguida, Cuba, China e
outros pedacinhos da Ásia. Nos anos 1960 e 1970, eram os movimentos de
"libertação" africanos. Mais recentemente, a Venezuela e o Brasil.
Agora, a Grécia. A extrema-esquerda passa a vida com esperanças de que desta
vez é que o comunismo vai ser um sucesso. E é sempre um fracasso catastrófico,
por regra coroado com genocídios e, nos casos moderados, com ópera bufa e
abundante miséria. Mas se as recorrentes derrotas do comunismo no confronto com
a realidade teriam o efeito de convencer pessoas normais de que a realidade talvez
esteja certa, a extrema-esquerda não desanima à primeira. Nem à trigésima, de
facto. Neste exacto momento, as atenções da rapaziada começam a voltar-se da
comédia grega para Espanha, à espera do Podemos. Então não haviam de poder?
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