É certo que se tratava de um programa
feito exprès para ser televisionado, as pessoas entrevistadas para o sketch
querendo aparentar uma postura elegante de discrição, gestos trabalhados para
mostrar um estatuto diferente, nada de exuberâncias críticas anti qualquer
coisa, como as que temos ouvido muitas vezes nas reportagens de rua.
Fora uma jovem trabalhadora que,
achando que o trabalho no exterior era incompatível com a educação que pretendia
transmitir ao filhito, além de que não compensatório remuneratoriamente, mal
dando para as despesas do infantário, decidira abandoná-lo pelo filho e a casa,
acompanhando o filho (creio que lhe não chamou cria, como muitas vezes ouvi às
felizes mães), lendo para ele, brincando com ele e para ele, tratando da casa,
limitada, pois, ao vencimento do marido. Como dantes, só que com mais cultura
do que dantes. E com mais saber pedagógico.
Até achei bonito, exemplo a seguir,
caso o Estado providenciasse em termos de um só vencimento, como na minha
infância – a mãe tratando dos filhos e da casa, o marido provendo ao sustento
da família. Agora, com as mães de família mais cultas, até com cursos
superiores, mas defraudadas nas suas legítimas ambições a um emprego
compatível, a educação dos filhos seria em moldes de educação esmerada, como a
que Sartre recebeu junto da mãe e dos avós, e que conta em , “Les Mots”, como a
que muitas mães dão aos filhos na Europa e no Japão, e noutros sítios atentos,
estimulando assim os saberes dos filhos para a competitividade posterior, caso
os filhos evoluam dentro dos bons princípios incutidos.
Assim, acompanhei a mãe no jardim,
com o filho no baloiço do jardim, a mãe de lado, pareceu-me triste, mas
provavelmente era só pose para o sketch televisivo. Comedida, a mostrar como
deve ser, sem o espalhafato que costumamos fazer em torno das nossas crianças
mimadas. Dentro de casa, ocupando-se dele, a televisão não mostrou tudo. Mas via-se
que era uma mãe ponderada e culta, como já o nosso Verney aconselhava as
mulheres a serem, nos idos do século XVIII, embora sem grande efeito por cá, as
reformas educativas do Pombal mais dirigidas ao elemento viril, como se sabe.
A sociedade evoluiu, vieram as
guerras e as fábricas para os canhões e outros artefactos, as mulheres foram
precisas fora de casa, vieram os liceus e as escolas para os filhos se instruírem,
era um ver se te avias de mulheres na fábrica e posteriormente noutros cargos
mais ou menos necessários, mas em subalternidade de espórtulas, em relação às
dos homens já com mais experiência de finanças.
Chegámos, todavia, a esta época de
trágica situação económica, o homem novo, nascido da revolução, tendo usado a
sua destreza intelectual e prática governativa na formatação ruinosa de uma
pátria de débito e desemprego, como se sabe, para omitir outros dados de
melindre. Por isso esta jovem mulher trocou o seu emprego escasso em
remuneração, que não lhe chegava para o infantário, pela situação de dona de
casa e mãe de família, que, quando bem vivida pode ser muito enriquecedora, até
mesmo do ponto de vista intelectual, mas sobretudo de segura orientação dos
filhos, para a construção de uma sociedade nova.
Todavia, houve uma cena em casa, que
me afectou negativamente: Mãe e filho, sentados a uma mesa baixa, o filho
emperrando no seu brinquedo, sem conseguir pô-lo a funcionar, e logo a mãe
estendendo a mão salvadora e perguntando atenciosamente: Posso ajudar?
Foi então que percebi o porquê de uma
sociedade criada na sofisticação dos gestos e das falas, segundo uma pedagogia
atenta à sensibilidade e personalidade infantis, segundo o conceito de
igualdade que se tornou bandeira para uma sociedade buliçosa de arrogância e
desrespeito.
Ao dar ao filho, de pequenino, o
poder de decisão – apenas, é certo, aparente, porque a mãe estendeu logo a mão
para o brinquedo, não lhe dando o poder real de decidir se queria ou não que a
mãe o ajudasse, está apenas a contribuir para a deformação dessa personalidade,
criada assim na falsidade e snobismo do diálogo só aparentemente construtivo, na
suposição de uma igualdade só verdadeira na família – que acaba, quantas vezes,
por desistir – e dos professores a quem instâncias superiores exigem que se
submetam também ao mesmo critério igualitário. A vida futura se encarregará de
mostrar ao menino, já então adulto, que o respeito pela sensibilidade ou pela
personalidade própria não passa de mera utopia. A menos que essa sensibilidade
venha escudada nas personalidades convincentes, para o seu emprego promissor.
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