Festejou o Público desde 5 de
Março – «Lisboa Especial Aniversário» - a domingo, dia 8, as suas bodas
de prata, simultaneamente incluindo, nessa edição grátis especial, os cem anos da teoria do
Einstein e o Ano Internacional da Luz. Foi o primeiro
número entregue a João Magueijo, como “Director por um dia”, sob o
título “Dar tempo ao tempo”, o qual propôs, como tema para o seu
número - ANO XXVI / nº 9090 – o seguinte desafio: “Como seria um jornal se o
tempo fosse mais como o espaço, algo com recantos e cantinhos por explorar? Um
cataclismo narrativo, por certo. Ou talvez não».
Ele próprio pegou no tema, no
seu Editorial intitulado «25 anos sem dormir”, espécie de
biografia dos seus últimos 25 anos em Inglaterra, aproveitando a síntese para
mais uma vez desancar no snobismo inglês, tal como o fizera no seu livro “Bifes
mal passados” e lançar simultaneamente referências negativas ao seu/nosso
país e às mulheres dele.
Na curiosa crónica seguinte, “Dar
tempo ao tempo” alerta para a relação entre espaço, luz e tempo:
Celebra-se
o centenário da teoria da relatividade geral, neste ano denominado "da
luz", mas oculta-se do pudor público o lado negro dessa bonita arte
mágica. A relatividade geral pode ter dado femininas curvas ao espaço e ao
tempo, atribuindo-lhes maleabilidade e vida própria, mas o que raramente se diz
é que essa nobre ciência também retirou ao tempo o seu predicado mais óbvio:
o fluir.
Ao
embrulhar na mesma trouxa o espaço e o tempo, negando-lhes natureza
independente em favor de um híbrido – o espaço-tempo –, a teoria da
relatividade roubou ao tempo o seu brotar. Da mesma forma que o eixo
do xis (esse terror que aprendemos na escola) não “flui”, o tempo da
relatividade também não escorre. Ao longo de uma linha espacial há ordem – há o
equivalente da organização de um presente, passado e futuro –, mas não há nada
que se assemelhe a um ponto particular e único que se vai escoando ao longo
dessa linha, o equivalente do presente. Dando direitos e deveres iguais ao
espaço e ao tempo, amalgamando-os num ser único, a relatividade nega igualmente
a existência de um presente que flui activamente do passado para o futuro.
Ordem, sim. Fluir, não. Esse tempo, meus amigos, morreu.
É
pois singular que num ano de efemérides e de luz nos procuremos encavalitar na
teoria da relatividade, demolidora como ela é do comum tempo. A própria luz –
esse andaime absoluto da teoria da relatividade – só pode ter um papel
orientador porque está fora do tempo. A luz equilibra-se na fronteira entre o
espaço e o tempo, portanto o tempo está paralisado ao longo de um raio de luz.
E o pior é que analisando a relatividade geral mais de perto encontramos
horrores ainda piores lá escondidos. Até a ordem desse tempo que não flui pode
ser destruída pela curvatura espaciotemporal e levada a aberrantes
contradições. Maliciosas máquinas do tempo consentem-nos dar um tiro na
avozinha antes de a nossa mãe ter nascido. Laçadas espaciotemporais
permitem-nos ser pai e mãe de nós próprios, um exagero de minimalismo familiar
e incesto. A ordem e a lógica são ameaçadas pela curvatura do espaço-tempo.
Proteja-se de contradições: evite espaços-tempos com um rabo demasiado
ondulado.
Claro
que nesta pasmaceira em que vivemos, longe de buracos negros e Big Bangs,
ninguém se deve preocupar indevidamente com tanta patologia. Mas o mal está
feito – a nossa metafísica está minada pela dúvida. Como funcionaria um jornal,
se o tempo acabasse amanhã? Ou se o tempo começasse a andar para trás mais
logo, quando a lua cheia nascesse e a maré mudasse? Ou se fôssemos uma linha já
prefigurada e sem fluir, sem edições matutinas e vespertinas? Como seria um
jornal, se o tempo fosse mais como o espaço, algo com recantos e cantinhos por
explorar? Um cataclismo narrativo, por certo. Ou talvez não. Esta edição o
dirá.»
No texto seguinte – «Cem
anos a deitar a língua de fora” – refere a busca dos “Einsteins” da
actualidade a tentar criar sem êxito uma nova teoria que ultrapasse a da
relatividade.
O Público pegou, pois,
no tema, em textos vários de muito interesse, de que cito a síntese «História
do Universo em treze momentos», por Teresa Firmino (texto) e Cátia
Mendonça (infografia, que acompanha aquele desde o BIGBANG até o Homem nas
explorações espaciais), e entre os quais se retoma a luz e Einstein - como o do
professor Carlos Fiolhais – “A Luz de Einstein” - com a seguinte
informação introdutória:
«Se a teoria da
relatividade restrita de 1905 tinha juntado a matéria à energia (falamos de
matéria-energia) e o espaço ao tempo (falamos de espaço-tempo), a teoria da
relatividade geral reúne todos esses conceitos ao afirmar que a matéria-energia
deforma o espaço-tempo.»
Assinados por S. J.
A, surgem datas e informações curiosas como a seguinte, reportada a 1990:
«WWW: São três
letras cuja real importância ninguém podia perceber de início, mas representam
uma das maiores revoluções no que é a dimensão de espaço e de tempo: WWW.
As três letras significam WORLD, WIDE, WEB e foram e são a chave para abrir
o que se convencionou chamar “auto-estradas da comunicação”, ou seja,
são o suporte tecnológico que, com a sua linguagem informática própria,
constrói uma rede ou uma teia (WEB) que permite “navegar na Net”
e chegar aqui e agora a todo o lado, quebrando as barreiras do espaço e do
tempo.» S. J. A.
Muitos dados históricos são
fornecidos e mais outros de carácter científico, sociológico, ecológico, político,
nestas páginas para reler e guardar. Pareceu-me que ninguém respondeu
cabalmente à proposta do “Director por um Dia”, João Magueijo, “Se o tempo fosse
mais como o espaço, como seria o jornal…” Esqueceu-se João Magueijo de que
existe um tempo psicológico, sem conta, peso nem medida, e um tempo
de memória mais rápido do que o próprio WWW. E de que existe um “O
tempora o mores” moralista e sentencioso dos tempos clássicos, que os
Cíceros do nosso tempo exploram com argúcia, tal como o farão os críticos do
jornal futuro, por muitas voltas que os cientistas pretendam atribuir a um
tempo mensurável em coligação com outras matérias. Também a relatividade se reporta
ao tempo, é claro, e no fim de contas, por muita expansão que tenha havido no
universo, e no Homem correlativamente, é tão pobre de luz o nosso universo
pátrio, que em absoluto concordo com o “O tempora o mores” de Vasco
Pulido Valente, no texto do Público de 8/3/15, sem esperança de grandes mutações,
a não ser para pior. E daí que repegue na lenga-lenga infantil dos meus tempos,
que mergulha num passado certamente que bem anterior ao da teoria da relatividade:
«O tempo pergunta ao tempo quanto tempo o tempo tem. O tempo responde ao
tempo que o tempo tem tanto tempo quanto tempo o tempo tem.» E assim retomamos a nossa beatitude, sem receios nem juízos de valor. Mas, sim, relativizando...
Eis o texto – intemporal e
atemporal – de Vasco Pulido Valente, para todos os efeitos menos assustador do
que estes dos estudos científicos que prevêem a extinção dos mundos:
Folias do nosso tempo
08/03/2015
Basta ligar a televisão para se perceber o estado de
indigência intelectual e política a que chegou o país. A informação, que já foi
sofrivelmente sensata, embora parcial e sumária, tem hoje o critério editorial
do antigo semanário “O Crime” e da imprensa cor-de-rosa e desportiva.
Para
começar, os portugueses são presenteados com horas do que antigamente se
chamava “casos crapulosos”: a facada, o tiro, o roubo, a violência doméstica,
histórias de tribunal, considerações de réus, de testemunhas, de advogados, de
“populares”, da polícia e de um ou outro comentador de serviço. Depois do
“crapuloso” vem o “acidente” e a catástrofe: desastres de avião e de automóvel,
incêndios, tempestades de vento ou neve, inundações, tudo o que meta feridos,
mortos, miséria e sangue.
Isto
ocupa muito mais de metade do noticiário médio. O resto consiste numa
pseudo-reportagem desportiva, ou seja, no dia-a-dia do futebol. A televisão não
perde um jogo ou um golo que possa interessar a meia dúzia de fanáticos
de um clube qualquer. Segue os treinos. Esclarece sobre o “plantel” da equipa A
ou da equipa B, sobre os lesionados, sobre os castigados, sobre os “duvidosos”.
Entrevista treinadores na véspera e no minuto seguinte aos “clássicos” e não-
“clássicos” do campeonato. Jorge Jesus, por exemplo, é seguido com uma
persistência e um zelo com que não se segue nenhum ministro, o
primeiro-ministro ou Presidente da República (agora tão retirado que o boato da
sua prematura morte já corre pela província). E, através de tudo isto, Ronaldo,
sempre Ronaldo, infinitamente Ronaldo.
O
tempo que sobra (e o jornal da TVI, para só falar nele dura uma hora e meia)
vai para festas: festas de cozinha, festas de vinho, festivais da alheira, do
presunto e do chouriço, de quando em quando as prodigiosas fabricações do chefe
A ou do chefe B e, continuamente, o sabor e o aroma dos tradicionais produtos
deste nosso querido Portugal (que não se vendem nos supermercados, nem nas
mercearias de Lisboa). Não admira que neste banho cultural, a política tenha
pouco a pouco adoptado a natureza da televisão. Com um esforço sublime consegue
concorrer, e colaborar, com os “valores” que regem os noticiários e não pára de
nos dar novos motivos de interesse e estima: a barafunda Sócrates, a barafunda
BES, os mistérios do “Visa Gold”, o velho incumprimento fiscal de Passos
Coelho, a prisão de um inspector da polícia, a mentira impenitente e descarada
no parlamento e fora dele. Portugal acaba com certeza por se transformar num
“filme negro” (anos 40), sem Bogart, nem Bacall. E nós, pachorrentamente,
assistimos na nossa cadeira.
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