Eu também escutei o discurso
de Sampaio da Nóvoa, impressionada com o aparato da casa cheia para a sua
apresentação, com gente grada e séria a apoiá-lo, em espectáculo intimidante, a
gente grada estando ali por conta dos seus pergaminhos de antigos e novos
construtores de uma nova nação que ultimamente fora quase direi sodomizada pela
gente má de uma governação apenas pagadora, não de promessas mas de dívidas poderosas
deixadas pela gente impante do “coma agora e pague depois, se puder, e se não puder
não pague, que a nós nunca nos passou pela cabeça fazê-lo, abotoados que fomos,
graças a Deus, com as espórtulas que nós próprios colhemos, como era nossa
ânsia, na mudança que fizemos”. Escutei o discurso, precedido da habitual
tentativa malandra do jornalista na cauda de Soares, que fingiu não o ver, mas
lá se dignou responder, protegido pelos seus – a vaidade da oca exibição
sobrepondo-se, para o registo universal - à pergunta sobre a eficácia do seu candidato,
com outra pergunta sobre o que pensava o jornalista disso, como sempre vergonhosamente
caprichoso, amorfo e vão.
Mas o discurso de Sampaio da
Nóvoa foi aquilo mesmo que Vasco Pulido
Valente tão esplendidamente descreve, de ostentação de um “déjà vu”, é certo,
comum ao de todos, na pretensão de a todos ser superior, sem, todavia, explicar
como. Não, ele não irá “assistir impávido à degradação da vida pública”, o
seu grande objectivo será o de “reforçar a democracia”, que foi sempre o
chavão dos discursos que conciliam os grupos da esquerda, e eles estavam lá, na
ameaça de tudo fazer para destruir o país, como sempre têm feito, agora com um
novo Sampaio à cabeça, este, professor universitário, de discurso florido, num
maneirismo não de professor mas de aluno servil de uma balofa demagogia infrene.
Vasco Pulido Valente os
descreve a todos, com saber perfeitamente escalpelizador da sociedade desses e
de todos nós que uma vez mais nos vergamos, intimidados pelas presenças do
fausto antigo, títeres uns e outros na comédia antiga, que uma luz bruxuleante de
honradez e trabalho iluminou temporariamente, em luta contra a sua vacuidade.
Vejamos:
Degradação
01/05/2015
Tacticamente tudo se percebe. Do ponto de vista da baixa
táctica política até a coisa parece habilidosa.
Desde
2011 que nenhuma sondagem dá maioria absoluta ao Partido Socialista. Donde se
segue que para aguentar um governo minoritário – principalmente um que se
pretende reformista – é preciso um Presidente cúmplice, muito mais cúmplice do
que foi Cavaco com o CDS e o PSD. Mas para ser elegível esse Presidente não
pode ter a mais leve animosidade do PC, do Bloco e da poeira dos pequenos
grupos da extrema-esquerda. Ora, como ao fim de 40 anos não há gente dessa, a
franja radical do PS acabou por inventar uma não-pessoa, um saco vazio onde
venha donde vier qualquer militante ou simples simpatizante não se importará de
meter o seu voto: no caso o sr. Sampaio da Nóvoa.
Meia
dúzia de homens de músculo político agarraram na criatura e resolveram enfiar a
dita sem grande cerimónia pela goela aberta de um povo miserável e de uma
“classe dirigente” sem destino ou vergonha. Claro que os socialistas nunca na
vida mostraram o menor escrúpulo em organizar esta espécie de operação. Basta
lembrar que o dr. António Costa tomou o partido de assalto com uma grande dose
de brutalidade e demagogia, perante a equanimidade e o deleite dos seus
queridíssimos camaradas. Agora, a ideia é fazer o mesmo com o país: a tradição
ajuda. Soares como Sampaio estão ali para o trabalho sujo. Sampaio com o vácuo
de uma cabeça onde nunca entrou nada; Soares com ar rusé, de quem continua a
puxar os fios da intriga. E Manuel Alegre com a sua insofrível jactância e
pretensão moral.
O
candidato, esse, não conta. Cita Sophia de Mello Breyner, “Zeca” Afonso e
Sérgio Godinho, e com esta mistura de um lirismo torpe faz declarações sem
propósito ou consequência. Promete (imaginem só) não se “resignar” à
“destruição do Estado Social”, à pobreza, ao desemprego, à “exclusão” ou à mais
leve força que “ponha em causa a dignidade humana”. Como tenciona fazer isto,
não confessa. Promete “agir” com “integridade e honradez”, coisa que deve
tranquilizar a populaça já com muito pouco para espremer. E promete, para nossa
perplexidade e espanto, não assistir “impávido” à “degradação da nossa vida
pública”. Não percebe ele que a sua própria candidatura, fabricada por meia
dúzia de maiorais do PS, à revelia dos portugueses (que nem o conhecem), é o
mais grave e humilhante sinal da “degradação da nossa vida pública”?
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