quarta-feira, 6 de maio de 2015

Mais um Sampaio para a colecção




Eu também escutei o discurso de Sampaio da Nóvoa, impressionada com o aparato da casa cheia para a sua apresentação, com gente grada e séria a apoiá-lo, em espectáculo intimidante, a gente grada estando ali por conta dos seus pergaminhos de antigos e novos construtores de uma nova nação que ultimamente fora quase direi sodomizada pela gente má de uma governação apenas pagadora, não de promessas mas de dívidas poderosas deixadas pela gente impante do “coma agora e pague depois, se puder, e se não puder não pague, que a nós nunca nos passou pela cabeça fazê-lo, abotoados que fomos, graças a Deus, com as espórtulas que nós próprios colhemos, como era nossa ânsia, na mudança que fizemos”. Escutei o discurso, precedido da habitual tentativa malandra do jornalista na cauda de Soares, que fingiu não o ver, mas lá se dignou responder, protegido pelos seus – a vaidade da oca exibição sobrepondo-se, para o registo universal -  à pergunta sobre a eficácia do seu candidato, com outra pergunta sobre o que pensava o jornalista disso, como sempre vergonhosamente caprichoso, amorfo e vão.
Mas o discurso de Sampaio da Nóvoa foi aquilo mesmo que Vasco  Pulido Valente tão esplendidamente descreve, de ostentação de um “déjà vu”, é certo, comum ao de todos, na pretensão de a todos ser superior, sem, todavia, explicar como. Não, ele não irá “assistir impávido à degradação da vida pública”, o seu grande objectivo será o de “reforçar a democracia”, que foi sempre o chavão dos discursos que conciliam os grupos da esquerda, e eles estavam lá, na ameaça de tudo fazer para destruir o país, como sempre têm feito, agora com um novo Sampaio à cabeça, este, professor universitário, de discurso florido, num maneirismo não de professor mas de aluno servil de uma balofa demagogia infrene.
Vasco Pulido Valente os descreve a todos, com saber perfeitamente escalpelizador da sociedade desses e de todos nós que uma vez mais nos vergamos, intimidados pelas presenças do fausto antigo, títeres uns e outros na comédia antiga, que uma luz bruxuleante de honradez e trabalho iluminou  temporariamente, em luta contra a sua vacuidade. Vejamos:

Degradação
01/05/2015
Tacticamente tudo se percebe. Do ponto de vista da baixa táctica política até a coisa parece habilidosa.
Desde 2011 que nenhuma sondagem dá maioria absoluta ao Partido Socialista. Donde se segue que para aguentar um governo minoritário – principalmente um que se pretende reformista – é preciso um Presidente cúmplice, muito mais cúmplice do que foi Cavaco com o CDS e o PSD. Mas para ser elegível esse Presidente não pode ter a mais leve animosidade do PC, do Bloco e da poeira dos pequenos grupos da extrema-esquerda. Ora, como ao fim de 40 anos não há gente dessa, a franja radical do PS acabou por inventar uma não-pessoa, um saco vazio onde venha donde vier qualquer militante ou simples simpatizante não se importará de meter o seu voto: no caso o sr. Sampaio da Nóvoa.
Meia dúzia de homens de músculo político agarraram na criatura e resolveram enfiar a dita sem grande cerimónia pela goela aberta de um povo miserável e de uma “classe dirigente” sem destino ou vergonha. Claro que os socialistas nunca na vida mostraram o menor escrúpulo em organizar esta espécie de operação. Basta lembrar que o dr. António Costa tomou o partido de assalto com uma grande dose de brutalidade e demagogia, perante a equanimidade e o deleite dos seus queridíssimos camaradas. Agora, a ideia é fazer o mesmo com o país: a tradição ajuda. Soares como Sampaio estão ali para o trabalho sujo. Sampaio com o vácuo de uma cabeça onde nunca entrou nada; Soares com ar rusé, de quem continua a puxar os fios da intriga. E Manuel Alegre com a sua insofrível jactância e pretensão moral.
O candidato, esse, não conta. Cita Sophia de Mello Breyner, “Zeca” Afonso e Sérgio Godinho, e com esta mistura de um lirismo torpe faz declarações sem propósito ou consequência. Promete (imaginem só) não se “resignar” à “destruição do Estado Social”, à pobreza, ao desemprego, à “exclusão” ou à mais leve força que “ponha em causa a dignidade humana”. Como tenciona fazer isto, não confessa. Promete “agir” com “integridade e honradez”, coisa que deve tranquilizar a populaça já com muito pouco para espremer. E promete, para nossa perplexidade e espanto, não assistir “impávido” à “degradação da nossa vida pública”. Não percebe ele que a sua própria candidatura, fabricada por meia dúzia de maiorais do PS, à revelia dos portugueses (que nem o conhecem), é o mais grave e humilhante sinal da “degradação da nossa vida pública”?

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