Por qualquer motivo que
transcende as minhas competências, e, olhando-me por olhos alheios - desses muitos
Pulidos Valentes da nossa praça – (ressalvadas as eméritas virtudes de escritor
e analista satírico, deste que é Vasco) – todos eles enfiados no mesmo saco da
indiferença pela pátria antiga que Salazar prezou – olhando-me pelos olhos
desses, repito, atribuo o motivo da minha incompreensão a uma burrice congénita,
sem desejar com isso ofender o bendito animal que docilmente conduziu a Família
Sagrada para o Egipto, para salvar o Menino das mãos assassinas de Herodes,
permitindo que uma religião se fundasse posteriormente, alastrando pelo mundo,
graças também à sua divulgação por tantos missionários viajando nas naus que
abriram os tais caminhos desconhecidos. Tudo isso feito com muita miséria à
mistura, que a História Trágico-Marítima relata e a Peregrinação de Fernão
Mendes Pinto descreve de forma bem picaresca, sem cuidar de heroísmos nem de
orgulhos, mas que documentos como a Carta de Pero Vaz de Caminha ao rei D.
Manuel sobre o achamento do Brasil confirmam sobre o valor dos feitos. Feitos
com esses tais resultados de formação de colónias, ou mais elegantemente
províncias ultramarinas, de que os Pulidos Valentes da nossa praça se
desfizeram esfuziantemente, progressistas ferrenhos na compreensão dos outros, somente
dos donos desses continentes, jamais dos que pertenciam à raça dos navegadores e
que não tiveram tempo, nem desejo de se libertarem da mãe-pátria, como outros
mais espertos tinham feito, das Américas à Oceania.
Águas passadas, mas que voltam
à baila em afirmações que revelam bem o total desprezo pela pátria pluricontinental,
na ironia de ditos como “atracção pela falsa grandeza que as colónias
nos davam”, o respeito pela história pátria
e pelo povo que trabalhava nessas colónias perfeitamente soterrado no ódio
contra o “ditador” e na cobardia própria, como factor fisiológico capital nas
nossas decisões de timoratos compulsivos. Refiro, é claro, os que tomaram as
decisões, as classes da inteligência, porque muitos jovens conheci que “cumpriram”,
como homens, o dever que lhes fora pedido: “A Tap é um produto do
Império: Sem o império e a guerra colonial não existiria”. Um bom slogan para a Tap, criado por Vasco Pulido
Valente e que confirma os meus dizeres sobre a “valentia” da tal inteligência.
Quanto à “falsa grandeza” que as colónias nos davam,
penso que mais do que grandeza foi, naturalmente, uma certa riqueza que serviu
algum tempo ainda, julgo, depois das descolonizações, para o “rectângulo” poder sobreviver. Acabada a “mama”, veio o recurso ao empréstimo
do exterior, e para pagar tudo isso, vamos continuar a vender, como se tem
feito. Os pilotos da Tap não têm razão nas suas greves, nisso dou toda a razão
a Vasco Pulido Valente, mas acho que não é por patriotismo que fazem greve, bem
pelo contrário. O sindicato deles manda e os sindicatos nunca se revelaram especialmente
patriotas, pois fazem os possíveis por destruir a pátria, nem sei bem se às
ordens de qualquer outro mandatário, mas sempre a coberto de uma bondade
enternecedora.
Mas nada disto tem grande relevância, por muito que
Vasco Pulido Valente se esforce por nos elucidar. Brilhantemente, sempre, por
vezes com ressalvas:
As
cenas da TAP
A
TAP é um produto do império. Sem o império e a guerra colonial não existiria. O
amor que os portugueses supostamente têm à TAP não passa de uma atracção pela
falsa grandeza que as colónias nos davam e que gerações de portugueses
partilharam, mesmo depois do “25 de Abril”.
É
por isso, e só por isso, que a “privatização” provoca sempre uma certa
exaltação nacionalista, muito próxima da idiotia. A conversa sobre o “valor
estratégico” da TAP assenta na fantástica premissa de que Portugal é uma
potência com um papel no mundo; e a “lusofonia” em interesses de algumas
empresas sem um mercado decente, na emigração para África de alguns portugueses
e numa língua, alegadamente comum, que se vai degradando a cada tentativa para
a tornar oficial (como sucedeu com o acordo ortográfico).
O
turismo em constante crescimento ajudou a manter a companhia durante as parcas
décadas da II República (ou III, se quiserem), mas não chega para a manter
contra a concorrência do low cost e dos grandes conglomerados que cobrem o
mundo. Não chegou na Suíça, não chegou em Itália, não chegou em Espanha e por
aí fora. Mas, desgraçadamente, este simples facto não entrou na cabeça dos
governantes, nem na da gentinha que se exalta com as “vitórias” do futebol ou
do sr. João Santos que ganhou o campeonato da Europa de caligrafia. Para esses
representantes do amolecimento cerebral da Pátria, a TAP é um bocadinho de Portugal
no estrangeiro e, não se percebe porquê, uma ajuda para extorquir dinheiro ao
Brasil, a Angola ou até a Moçambique. Com um balcão da TAP e uma hospedeira
portuguesa, a saloiice indígena rejubila.
Foi
neste ambiente que os srs. pilotos resolveram exigir o que em circunstâncias de
tranquilidade e realismo nunca ocorreria àquelas duríssimas cabeças: 20 por
cento do capital da companhia e o pagamento das “diuturnidades” que em
princípio lhes deviam. Não interessa discutir aqui os méritos da reivindicação
dos pilotos, nem as formidáveis perdas que uma greve de 10 dias nesta altura do
ano irá trazer à TAP e à economia do país. Claro que os pilotos levarão a
companhia à ruína e à sua venda por um preço vil. Mas se é esse o sacrifício
que temos de fazer para curar a megalomania doméstica (pelo menos, neste
capítulo), o sacrifício vale a pena. Também saímos de África e não ficámos
pior. As cenas da TAP ou por causa da TAP acabam por nos prejudicar muito mais
do que depender de um serviço estrangeiro organizado e fiável. E os srs.
pilotos que depois tratem de si como puderem. Nós já estamos fartos do assunto
e dos penduras patrióticos que nos querem meter a mão na algibeira.
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