«Mau vento»
é como Vasco Pulido Valente intitula o seu artigo do “Público”,
de 26/4/15, que resume bem as nossas vidas saracoteantes, imagem do nosso “estar”,
do nosso “ser”, do nosso “parecer”, do nosso “continuar”, que convergiu, por
ora, no caso Tap, de gentinha com muito poder, espicaçada pelo sindicalismo da
desordem, da arruaça costumeira, ou antes da superioridade do bem-estar, que provoca
nela o narcisismo tosco, para o bota-abaixo do governo, e indiferente aos males
que irá causar nos colegas implorantes
em particular e no país em geral, talvez mesmo com inclusão da própria gentinha,
cujo “orgulho e preconceito” - com honesta imploração a Jane Austen de que me
desculpe, como criadora de uma sociedade que nada tem a ver com esta descrita
por Pulido Valente – cujo orgulho e preconceito, repito, a faz marrar na greve,
sem recuo nem autocondenação.
Vento mau que convergiu no caso Tap, tendo começado –
neste artigo de Pulido Valente – pelo Otelo Saraiva de Carvalho, atacado com
aversão pelo articulista, que, todavia, afirma, não sei se com fundamentação de
historiador, que « maioria dos portugueses sempre
gostou de Otelo», sentindo-me eu picada por ter
sido (e continuar) da minoria quando, nos idos de 74 escrevi, ainda não como
retornada, um breve texto que se iniciava assim: «O cérebro do 25 de
Abril: Chama-se Otelo Saraiva de Carvalho, é brigadeiro depois de
ter sido cérebro, e mostra-se optimista depois de se ter descartado das
colónias e a nós com elas.”(in «Cravos Roxos»)., mas julgo que outros
haverá como eu que não lhe suportavam a verborreia insípida e acéfala (mau
grado a criação cerebral citada), dos seus arrotos verbais. Outros se lhe
seguiram, igualmente de arrotos, e entre eles o tal Vasco Lourenço que «Diz,
por exemplo, que os militares têm hoje tanta legitimidade para se liquidar a
República como tinham em 1974.», Pulido Valente mostrando-se, todavia,
pesaroso pelo insucesso do convite: - «Infelizmente, este estranho
apelo à rebelião armada não comoveu ninguém.» - o que de certo modo nos
deixa perplexos pela antinomia entre a expressão do pesar subentendido no
advérbio e a caracterização crítica que o adjectivo traduz, o que mostra à
evidência o grau de saturação de Pulido Valente pela gentinha em geral, que merece
baioneta, arma antiquada embora, mas a condizer com o nosso atraso e mais
eficiente presentemente do que a espingarda, que definitivamente renasce,
invisível, em cravos rubros, em cada ano que passa, pelo menos até o vento de
loucura que “sopra por aí”, o permitir. E Vasco Pulido Valente conclui o
seu raciocínio, desta vez mais virado para o ataque ao governo: «A
“Associação 25 de Abril” continua pacificamente a promover as suas causas com o
beneplácito do governo e o concurso de uma esquerda sem melhor abrigo.»
Pergunto-me, contudo, o que queria Pulido Valente que o
governo fizesse contra os cravos vicejantes da tal associação, se os quisesse
eliminar. Sem dúvida que cairia o que resta do Carmo e ainda mais a Trindade e
o próprio Pulido Valente se insurgiria contra o governo, mais do que costuma, pela
medida antidemocrática, profundamente reprovável, que representaria a exclusão
do beneplácito republicano.
Segue-se a tal infantilidade dos partidos do centro-direita.
propondo a sua manipulação da televisão durante a campanha, medida que Pulido
Valente considera como resultante de “transtorno mental”. Para
mim, o que os tais partidos pretendiam era boicotar os festins e as despesas
que se vão seguir, e já começaram, de gente berrando ou rindo ou mastigando, ou
beijando-se carinhosamente. No fundo, julgo que pretendiam fazer a coisa mais
discretamente, sem tanto estardalhaço terceiro-mundista.
Compreendo a tristeza de Vasco Pulido Valente, mas julgo que
o mal é todo de uma nação que, alardeando a universalidade da sua língua,
começa por ser o primeiro a ultrajá-la, como resume Vasco Graça Moura, em poema
publicado hoje, no “A Bem da Nação”:
LAMENTO
É o teu
país que te destroça
O teu
próprio país quer-te esquecer
E a sua
condição te contamina
E no seu
dia a dia te assassina
E desde
ti nos deitas a perder
E fazes
com que fuja o teu poder
Enquanto
o mundo vai de nós fugindo:
Ruiu a
casa que é do nosso ser
E este
anda por isso desavindo
Connosco,
no sentir e no entender.
Mau vento
O
sr. coronel Vasco Lourenço não é o velho e venerando histrião Otelo Saraiva de
Carvalho, que de quando em quando larga uma barbaridade para impressionar os
vizinhos.
Em
primeiro lugar, a maioria dos portugueses sempre gostou de Otelo e nunca gostou
especialmente de Lourenço. Em segundo lugar, Otelo está retirado e Lourenço é
um político no activo, com tabuleta e porta para a rua, e não pode dizer o que
lhe passa pela cabeça. Mas diz. Diz, por exemplo, que os militares têm hoje
tanta legitimidade para se liquidar a República como tinham em 1974.
Infelizmente, este estranho apelo à rebelião armada não comoveu ninguém. A
“Associação 25 de Abril” continua pacificamente a promover as suas causas com o
beneplácito do governo e o concurso de uma esquerda sem melhor abrigo.
A
megalomania de Lourenço não impressionaria muito se fosse um caso isolado. Mas
também o CDS, o PSD e o PS deram esta semana provas de um transtorno mental,
que não anuncia nada de bom. Não se sabe como, nem porquê, entrou em certas
cabeças destas distintas entidades a ideia de censurarem (e dirigirem) a
televisão e a imprensa durante a campanha eleitoral para as legislativas.
Perante o berreiro, os responsáveis juraram logo que se tratava de uma
brincadeira. Seja como for, resta que três criaturas sem coisíssima nenhuma que
as recomende acharam sensato e permissível suspender a seu benefício uma
liberdade fundamental. Pior ainda, o dr. Passos Coelho e o dr. António Costa
alegaram uma angélica ignorância sobre o que se passava nos seus próprios
grupos parlamentares e lavaram as mãos do episódio, sem uma palavra de aviso
aos prevaricadores.
São
azares da vida, não é? Como a extraordinária greve dos pilotos da TAP, que os
vai deixar na rua de triciclo. Claro que a TAP acorda o que há de pior nos
portugueses. Basta substituir a expressão corrente “companhia estratégica” por
“companhia colonial” para se perceber o histerismo que a história
invariavelmente provoca. Os portugueses, coitados, quanto mais pobres ficam,
mais se querem dar ares de grandes senhores. A TAP e a lusofonia são as muletas
tradicionais da miséria interna: a lusofonia, de facto, não existe e a TAP está
falida. Não importa: a nossa putativa importância no mundo continua a ser um
bom pretexto para o sentimentalismo de cançoneta e algumas palhaçadas na praça
pública. O contribuinte, esse, que se lixe.
Sopra
por aí um vento de loucura.
Nenhum comentário:
Postar um comentário