segunda-feira, 8 de junho de 2015

«L’enfer c’est les autres», c'est moi le paradis




Enviou-me o Sr. João Sena um curioso “inventário” de definições em autorretrato de um conservador, com a respectiva descodificação do “outro”, no seu ponto de vista contrário, velha luta de gerações que sempre provocou ódios e incompreensões. O tema é antigo, a própria Bíblia é disso exemplo, no realçar de histórias perversas que lançavam Jeová em contactos permanentes com os terráqueos, tanto para os punir como para os engrandecer.
Não resisto a transcrever do meu livro “O Maravilhoso Mundo das  Lendas de Santos de Eça de Queirós” (Chiado Editora, 2010) um excerto do Prefácio, a propósito da temática da intertextualidade, que prova que a arte é algo com pouco de original, no seu retomar de motivos, concepções ou técnicas, que, todavia, a ciência faz evoluir em novos recortes de execução:
“Por outro lado, a corrupção dos costumes, tema de todos os tempos, tem no “Carmen Buranum nº 6” original expressão de lamentação pela “depravação da juventude e degeneração do ensino”, segundo o estudo “Carmina Burana: Floreabat Olim Studium” realizado por António Rebelo e Margarida Miranda, integrado no mesmo “Boletim” (“Estudos Clássicos”, volume 32 – Edições Colibri). Mas o próprio “Satiricon” de Petrónio, escritor latino do século I, contém crítica didáctica, em frases de expressiva actualidade e tranquilizantes relativamente ao presente, ao mostrar quanto o pessimismo e a incompreensão adultos são pecha antiga e uma constante, próprias do natural “conflito de gerações”: «Hoje as crianças na escola limitam-se a brincar, os jovens caem no ridículo ao subir à tribuna e, coisa mais vergonhosa que tudo o resto, chegadas à velhice, ninguém é capaz de admitir a insensatez dos estudos feitos na juventude»”.

Mas, indiscutivelmente, o progresso vai contribuindo para actualizar os temas dos conflitos sociais, trazendo novos truques de aproveitamentos ideológicos para “cascar” no parceiro, anquilosado nos seus preconceitos.

Eis os “Mandamentos” do conservador que o “progressista” condena. Na realidade, o retrato do “conservador”, é feito a partir de uma autoconvicção de perfeição, o que o torna tão intragável como o seu opositor, pronto a embandeirar em arco os seus pontos de vista definitivos. Afinal, nada é assim tão absoluto, é preciso contemporizar...

«Desculpem-me por ser normal! A vida está difícil!»
*     
«- Nasci branco, o que faz de mim um racista.
- Não voto à esquerda, o que faz de mim um fascista.
- Sou heterossexual, o que faz de mim um homófobo.
- Não sou sindicalizado, o que faz de mim um traidor da classe operária e um aliado do patronato.
- Sou de credo cristão, o que faz de mim um cão infiel.
- Tenho mais de 60 anos, o que faz de mim um velho macacão.
- Sei reflectir, sem engolir tudo o que a imprensa me dita, o que faz de mim um reaccionário.
- Defendo a minha identidade e a minha cultura, o que faz de mim um xenófobo.
- Gostaria de viver em segurança e ver os delinquentes metidos na prisão, o que faz de mim um gestapista, (ou, em honra do convento, um pidesco).
- Penso que cada um deve ser recompensado em função do seu mérito, o que faz de mim um antissocial.
- Fui educado severamente e estou grato aos meus pais, o que faz de mim um carrasco das crianças contrário ao seu desenvolvimento.
- Penso que a defesa dum país é uma questão que abrange todos os cidadãos, o que faz  de mim um militarista.
- Defendo o esforço e o empenhamento pessoal, o que faz de mim um atrasado social.

> Portanto, agradeço aos amigos que ousam ainda visitar-me, apesar de tudo…»

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