«E eis que eu estou convosco, todos os dias, até à
completude do Tempo» (28: 20)
I
1- Autoria: Texto
anónimo: Em nenhum dos seus 28 capítulos o autor do texto se identifica.
2- Histórico:
a)
O nome do Apóstolo
Mateus, ex-cobrador de impostos e discípulo directo de Jesus não o
identifica com o narrador do Evangelho segundo Mateus.
b) Não
obstante, autores lhe atribuem a autoria do Evangelho segundo Mateus:
Eusébio, historiador da Igreja (séc. IV); Ireneu
(séc. II), segundo o qual o texto fora escrito para hebreus na sua própria
língua.
c) A ideia
geral da identificação do evangelista com o discípulo de Cristo é seguida
até meados do século XX.
d) Situação actual: Segundo a maioria dos actuais
estudiosos do Novo Testamento, tanto o Evangelho segundo Mateus,
como segundo Marcos e Lucas são atribuídos a uma fonte comum que
partiu de contactos e informações junto dos que conheceram Jesus (o que
igualmente provocaria evangelhos apócrifos – de Pedro e Tomé – de
quem se fez passar por aqueles discípulos, para maior credibilidade).
3- Literário:
«Nas
palavras de Graham Staton “entre os evangelistas, o supremo artista
literário é indubitavelmente Mateus”. É facto que a releitura contínua
deste texto extraordinário revela a riqueza impressionante tanto da sua
coerência como das subtilezas da sua arquitectura. É uma obra de uma
intencionalidade fortemente focada; e tanto a sua abrangência temática como o
sopro arrebatado da sua redacção justificam plenamente a circunstância de, ao
longo de dois mil anos, este texto se ter constituído como Evangelho
favorito da(s Igreja(s) e dos cristãos.»
4- Língua original:
«Opinião
comum hoje: «O Evangelho de Mateus não
mostra o mínimo sinal de ter sido traduzido de uma língua semítica.»
«Mateus utiliza a língua helénica do seu tempo com notável
expressividade e perícia, além de ser um profundo conhecedor da
Escritura judaica na versão grega dos Septuaginta».
5- Data aproximada para a sua redacção:
a) - Para muitos leitores – opinião compartilhada por
F.L. - existe um «conjunto de passagens que dificilmente poderia ter sido
escrito antes da destruição de Jerusalém, no ano 70 da nossa era: 22:7;
23:36-38; 24:2.
Ex: (24:1,2):
(Jesus anuncia a destruição do templo, a perseguição dos discípulos e a
destruição de Jerusalém): 24:1-2
«E Jesus, saindo do templo, estava para ir embora quando os seus discípulos
vieram para lhe apontar as construções de templo. «Mas ele, respondendo,
disse-lhes: “Não vedes todas estas coisas? Amém vos digo: não deve ser aqui
deixada pedra sobre pedra que não será desmoronada.»
- «Por outro lado, Mateus
escreveu depois de Marcos, que, como se depreende de Marcos 13: 14-20,
deverá ter escrito após a destruição de Jerusalém; e depois de Lucas,
como se vê por Lucas: 19: 41-44; 21: 20-24:
«Ex: ”21:20-24: Mas quando virdes Jerusalém sitiada
por exércitos, ficai sabendo que a sua desolação está próxima. Então, os
habitantes da Judeia que fujam para montanhas; os que estiverem dentro da
cidade que se retirem; e os que estiverem no campo não voltem para a cidade, pois
dias de punição são estes e de se cumprirem todas as coisas que estão escritas.
Ai das grávidas e das que estiverem a amamentar naqueles dias! Porque haverá
uma terrível angústia na Terra e ira contra esse povo. Cairão pela boca da
espada e serão levados cativos para todas as nações; e Jerusalém será calcada
pelos pagãos até que se cumpram os tempos dos pagãos.»
b) - Pelo laconismo do Evangelho
segundo Marcos, deduz-se que Mateus se
baseou naquele, dando-lhe um cunho “mais desenvolvido e apurado em
termos de redacção”.
c)- “No
caso da relação entre Mateus e Lucas, a questão é mais complexa,
pois não se poderia afirmar de modo algum que o Evangelho de Lucas está menos
bem escrito do que o de Mateus, ainda que, comparativamente ao de Mateus, seja
um texto menos completo, no que toca ao seu conteúdo, quando esse conteúdo intercepta
material que está em Mateus. Basta compararmos o Sermão da Montanha de Mateus
com o Sermão da Planície de Lucas;
ou as duas versões do Pai Nosso. Afigura-se-nos quase impensável
que, se conhecesse o texto de Mateus, Lucas não se tivesse esmerado mais nestes
e noutros exemplos.
Ex: O Pai Nosso segundo Mateus: 6:9-13: Rezai então assim: «Pai nosso nos céus, /
seja santificado o teu nome. Venha o teu reino, / faça-se a tua vontade; / assim
como no céu também na terra. / Dá-nos já hoje o nosso pão de
amanhã. / E perdoa-nos as nossas dívidas, / tal como nós perdoamos aos nossos devedores;
/ e não nos leves para sermos postos à prova, / mas livra-nos do iníquo.»
Ex: O Pai Nosso segundo Lucas: 11: 1-4- Disse-lhes então Jesus: Quando orardes dizei: «Pai, /Seja santificado o teu nome, / Venha
o Teu reino / Dá-nos cada dia o nosso pão de amanhã, / E perdoa os nossos erros
/ Pois também nós perdoamos a quem nos está a dever. / E não nos leves para a
tentação.»
d) 1ª Conclusão (seguida por vários
estudiosos actuais do NT): “Foi
Marcos que usou o material de Lucas e não vice-versa.”
e) 2ª Conclusão: “O
facto de o texto de Mateus depender de modo tão claro de Marcos e de Lucas refuta
a possibilidade de o seu autor ter sido um dos doze apóstolos, testemunha
ocular da vida de Jesus”.
6- O público alvo, com hostilidade recíproca:
a) O
Evangelho de Mateus é caracterizado por ser escrito para judeus.
Como prova disso, a preocupação na referência à lei de Moisés (Ex: 5: 17-19: “Não julgueis que vim para
anular a lei ou os profetas. Não vim para anular, mas sim para cumprir. Pois
amém vos digo: até que passe o céu e a terra, não passará um iota ou um pontinho
da lei, até que todas as coisas aconteçam. Aquele que afrouxar um dos mais
insignificantes destes preceitos, e assim ensinar as pessoas, será chamado o
mais insignificante no reino dos céus. Quem, por outro lado, os praticar e os
ensinar, este grande será chamado no reino dos céus”.); «ou pelo
facto de Jesus proibir os discípulos de levarem a boa-nova a não judeus» (10:
5-6): «Estes foram os doze que Jesus enviou, instruindo-os com estas
palavras: Dirigi-vos de preferência às ovelhas perdidas da casa de Israel.», -
«proibição essa somente revogada no penúltimo versículo deste evangelho»: (28:
19-20): Indo, pois, tornai discípulos todos os povos, baptizando-os no
nome do Pai, do filho e do espírito santo, ensinando-os a cumprir todas as
coisas que vos mandei.»
b)-
«A impressão que a leitura deixa, é, contudo de uma permanente hostilidade
manifestada para com Jesus por parte das autoridades judaicas, ao mesmo tempo
que as críticas mordazes na boca de Jesus contra fariseus e saduceus, escribas
e sumos sacerdotes (assim como o retrato inteiramente negativo que destas
figuras é feito) nos levam a suspeitar que este Evangelho, alegadamente escrito
para destinatários judeus, estaria talvez mais apto a ferir susceptibilidades
nas cabeças dos seus leitores judaicos do que a suscitar a sua adesão. É claro
que o retrato negativo das autoridades judaicas é transversal aos quatro
Evangelhos; mas num texto que é tantas vezes descrito como o Evangelho
destinado aos Judeus, esperar-se-ia porventura menos polémica e mais
contemporização relativamente ao povo de Israel.
7- Só em Mateus:
“Quem
lê os Evangelhos pela ordem canónica (Mateus, Marcos, Lucas e João)
encontrará em Mateus e Lucas uma abundância de material
que já lera em Mateus. No entanto, há um conjunto significativo de elementos
que ocorre apenas no Evangelho de Mateus: - A adoração dos Magos; -
A fuga para o Egipto; - O massacre dos inocentes; - O Sermão da
Montanha;
-
«Só em Mateus encontramos certas imagens
que se tornaram proverbiais , como as pérolas deitadas a porcos, ou
a separação do trigo e joio ou de ovelhas e cabras;
-
«Só em Mateus é que Jesus diz que não é sete vezes que devemos perdoar mas setenta
vezes sete;
-
«Só em Mateus é que Pedro tenta caminhar sobre a água, ou Judas
se enforca, ou Pilatos lava as mãos;
-
«Só em Mateus as dez virgens são impedidas de assistir à boda.
-
«Contrariamente ao que lemos nos outros Evangelhos, as quantias de dinheiro
referidas por Mateus configuram somas verdadeiramente astronómicas (milhões
de euros em moeda actual: ver 18: 24: “Tendo ele começado a fazer
as contas, veio ter com ele um devedor de dez mil talentos (Nota: Um
talento em moeda actual: cerca de 250 000 euros). «Talvez por isso
se tenha afigurado plausível, durante tantos séculos, a sua identidade como
alguém ligado à cobrança de impostos? Quem sabe?
II
Síntese dos capítulos, segundo os títulos de Frederico
Lourenço:
1- Genealogia;
A gravidez milagrosa de Maria; O nascimento de Jesus em Belém. 2- Os magos; o massacre dos inocentes; A fuga o Egipto;
José Maria e Jesus estabelecem-se na Nazaré. 3- O baptismo de Jesus. 4- Jesus tentado no deserto; Início do ministério de
Jesus. Chamamento dos primeiros discípulos; Jesus taumaturgo. 5- O sermão na montanha. 6- O sermão na montanha (continuação). 7- O sermão na montanha (conclusão). 8- Jesus cura vários doentes; O discípulo que quer primeiro
sepultar o pai antes de seguir Jesus; Jesus acalma a tempestade; Os possessos e
a vara de porcos. 9- Jesus
cura um paralítico; o chamamento de Mateus; Jesus ressuscita uma menina que
acabara de morrer; Jesus cura vários doentes; a compaixão de Jesus perante os
sofrimentos da multidão. 10-
A eleição dos doze; Antevisão das perseguições futuras; Jesus ensina que não se
deve temer nada. 11- Jesus
elogia João Baptista; A falta de Fé; A revelação escondida dos sábios e
inteligentes. 12- Jesus e o
sábado; Jesus e Belzebu; A árvore e os seus frutos; O sinal de Jonas; A mãe e
os irmãos de Jesus. 13-As
parábolas do semeador; do trigo e do joio; do grão de mostarda: do fermento; do
tesouro e da pérola; Da rede; Jesus rejeitado em Nazaré. 14: Sobre a morte de João Baptista; O milagre da multiplicação
dos pães e dos peixes; Jesus caminha sobre as águas; Jesus cura doentes em
Genesaré. 15 – Jesus e os
preceitos da religião; Jesus e a mulher cananeia; Nova multiplicação de pães e
peixes. 16 – O fermento dos
fariseus; Pedro como pedra; Primeiro anúncio da Paixão: “Que se negue a si
próprio e levante a sua cruz”. 17- Transfiguração de Jesus; A vinda de Elias; O jovem epiléptico; A fé
que move uma montanha; O segundo anúncio da Paixão; O tributo do templo. 18-
Quem é o maior no reino? Escandalizarmos a outrem e a nós mesmos; A ovelha
tresmalhada: «Se o teu irmão errar…»; “Onde estiverem dois ou três reunidos em
meu nome…”; O perdão. 19:
Jesus é interrogado a respeito
do divórcio; Os três tipos de eunucos; O jovem rico; O valor de
deixar casa e família em nome de Jesus. 20- Os trabalhadores da vinha; O terceiro anúncio da
Paixão; Servir os outros; Os dois cegos de Jericó. 21- Entrada de Jesus em Jerusalém; Os vendilhões do
templo; A figueira estéril; Jesus contestado no templo pelos sumos sacerdotes;
O homem que tinha dois filhos; Os vinhateiros assassinos. 22- Muitos são chamados; mas poucos, escolhidos; “Dai a
César o que é de César”; A ressurreição dos mortos; Os mandamentos do amor;
Cristo, filho e senhor de David. 23- Jesus condena o farisaísmo; Lamentação de Jesus sobre
Jerusalém. 24- Jesus
anuncia a destruição do templo, a perseguição dos discípulos e a destruição de
Jerusalém; Os falsos Messias; A vinda do Filho da Humanidade; O sinal da
figueira; O escravo fiel. 25-
A parábola das dez virgens; A parábola dos talentos; O juízo final. 26-
A unção de Betânia; Judas vende Jesus
por trinta moedas; A Última
Ceia; A tristeza de Jesus em Getsémani ; Jesus é preso; Jesus em tribunal; Pedro
renega Jesus 27- Jesus e Pilatos; Judas enforca-se; Jesus no tribunal
romano; O povo escolhe poupar a vida de Barrabás; Jesus coroado de espinhos;
Calvário e Crucificação; Morte de Jesus; José de Arimateia; A sepultura de Jesus. 28- O sepulcro vazio; O suborno dos guardas; Aparição de
Jesus ressuscitado na Galileia; Jesus promete acompanhar os seus seguidores até
ao fim dos tempos.
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