Depois de destruídos os
alicerces, na desordem e confusão, é bem de ver que dificilmente se erguerá
novamente o edifício educativo, pois vários são os alvitres numa orientação de
promiscuidade, onde cada um fornece o seu parecer de acordo com os parâmetros
da sua ideologia. Julgo que a maior responsável pelo descalabro é a
massificação, como ponto essencial da nova pedagogia, nos seus necessários
caminhos de bondade/fraqueza, tendo por base a indisciplina, a desordem nos
compromissos pedagógicos, à teoria sobre o autoritarismo expositivo docente de
antes da democracia sucedendo-se a do nivelamento das competências de professor
e aluno, este último não mais um ser manipulado, porque ele próprio um ser de
competências, que lhe vêm da “educação extremosa” que colheu em casa, segundo a
teoria fictícia e cínica dos ideólogos das novas pedagogias da afectividade,
que propositadamente sonegam as múltiplas proveniências dos alunos, e o
acompanhamento familiar de tão diversa origem e dimensão. Felizmente que há
turmas e turmas, algumas são formadas por alunos mais exemplarmente
comportados, como sempre houve os meninos da mamã, turmas destinadas por vezes
a professores “meninos” do director, e que por consequência terão menos
atribulações disciplinares, para a eficiência do seu ensino exemplar. Isto no
ensino público. No particular a coisa processa-se talvez noutros moldes de
obediência e exemplaridade, et pour cause. Creio que o que tem
contribuído para melhorar o processo do “ensino-aprendizagem” dos nossos tempos
são essencialmente os livros escolares, dum modo geral bons orientadores, com
as metas curriculares bem estabelecidas, para orientar alunos e professores,
sem que se lhes acoime o designativo ofensivo de autoritarismo e quantas vezes de
pedantismo por uma questionação rebuscada, de nivelação “por cima”, responsabilizadora.
Santana Castilho expõe os
novos problemas educativos, focando a falta de seriedade dos governantes que
vão às escolas exibir a sua simpatia galhofeira e desconstrutiva pela mimalhice
acéfala, de apelo à irresponsabilidade e deseducação. E expõe sobre as tais
provas de aferição que nem sequer servem para classificar, de resultados
tardios, puro brinquedo dispendioso e inútil, que não compromete as estatísticas.
E repetimos com ele: «A questão é termos
passado de uma pedagogia ferozmente utilitarista, que encarava a Educação como
mercadoria ao serviço da economia de mercado, sem sensibilidade humanista nem
consideração pelas diferenças individuais das crianças em formação, para uma
pedagogia do paraíso, assente na retórica provinciana do “aluno do século XXI”,
do “trabalho de projecto”, da “flexibilidade pedagógica”, do “trabalho em rede”
e dos “nados digitais”, sem considerar o estádio intermédio que resulta da
arbitragem prudente entre o valor intrínseco do conhecimento e a especulação
pedagógica.
Quando se junta a melodia das “aprendizagens essenciais” ao estribilho da
“flexibilidade pedagógica”, os que já assistiram a tantos coros de outros
tempos sabem o que a música vai dar: um desconcerto nacional em que o ascensor
social, que a Escola pode ser, pára uma vez mais.»
OPINIÃO
A Educação rosa
Santana Castilho
Na
equação política do PS, a Educação não conta.
Público, 14
de Junho de 2017
O PS é um partido político que foi perdendo a sua matriz ideológica. Sob a
liderança de António Costa, a aliança à esquerda é meramente circunstancial e
ditada por ser a única forma de ganhar o Governo, depois de perder as eleições.
Para os que legitimamente discordem deste ponto de vista, recomendo a análise fina
das votações da legislatura e a interpretação grossa dos sinais dos últimos
dias (bloco central na TAP, flop na chefia das secretas, imprudente
acolhimento de familiares de amigos e de interesses de amigos, prudente
respeito pelos contratos firmados com os chineses da EDP mas oportuno desprezo
pelos contratos firmados com os professores portugueses).
Para os que concluem o ensino secundário, é hora de exames, onde se joga a
entrada nas universidades e politécnicos. Para alguns dos outros é hora de
brincar às provas de aferição, onde se queima credibilidade, tempo e
dinheiro, porque se trata de provas que foram largamente usadas e abandonadas
por inúteis e porque, ao persistir na asneira, ao menos que fossem aplicadas no
fim dos ciclos de estudo ou feitas por amostragem.
Na equação política do PS a Educação não conta. O ministro é
um bibelot que
acompanha os senhores nas festas e que se mistura com a malta nos recreios,
quando há fotógrafo por perto.
A análise do discurso do secretário de Estado João Costa expõe uma
mistura de postulados gastos, por óbvios, com teorias pedagógicas velhas e
ultrapassadas, que foram abandonadas porque falharam, depois de terem lançado a
confusão no sistema de ensino. É certo que este arauto-mor do “eduquês”
recuperado teve os ímpetos travados e passou das “alterações profundas” e da
sua generalização para a experimentação circunscrita da “flexibilidade
pedagógica”. Mas a verdade é que está destruindo, com o apoio de prosélitos e
oportunistas, o que, apesar de tantas vicissitudes e sacrifícios, os
professores sérios e maduros conseguiram acrescentar aos resultados do sistema
de ensino. E poupem-me os prosélitos à ligeireza do “parece que no tempo
de Crato é que era bom”, porquanto basta ler o que sobre ele escrevi. A
questão é termos passado de uma pedagogia ferozmente utilitarista, que encarava
a Educação como mercadoria ao serviço da economia de mercado, sem sensibilidade
humanista nem consideração pelas diferenças individuais das crianças em
formação, para uma pedagogia do paraíso, assente na retórica provinciana do
“aluno do século XXI”, do “trabalho de projecto”, da “flexibilidade
pedagógica”, do “trabalho em rede” e dos “nados digitais”, sem considerar o
estádio intermédio que resulta da arbitragem prudente entre o valor intrínseco
do conhecimento e a especulação pedagógica.
Quando se junta a melodia das “aprendizagens essenciais” ao estribilho da
“flexibilidade pedagógica”, os que já assistiram a tantos coros de outros
tempos sabem o que a música vai dar: um desconcerto nacional em que o ascensor social, que a Escola pode ser,
pára uma vez mais. Explicitando a
metáfora: Crato mandava
os que chumbavam aprender uma profissão aos dez anos; Costa nivela por baixo e
reserva “as aprendizagens essenciais”, que ninguém sabe o que são nem como se
definem, para os que já chegam à Escola oprimidos pela sorte madrasta de terem
nascido em meios desfavorecidos. Definitivamente, só há um caminho, que não importou a Crato e menos
importa a João Costa: encontrar um currículo e programas correspondentes
equilibrados e adequados à maturidade e desenvolvimento dos alunos e
acompanhá-los, sem diminuições de exigência e rigor, com reforço de meios e
recursos logo que evidenciem as primeiras dificuldades. A inovação
pedagógica do aprender menos não remove o insucesso. Mascara-o.
Os experimentalismos que partem do abaixamento da fasquia não puxam pelos
que ficam para trás. Afundam-nos. O escrutínio sério das políticas educativas
das últimas décadas, que só um pensamento crítico livre de contaminações ideológicas
permite, demonstra-o.
É importante que cada professor saiba bem de que lado quer estar nesta
dialéctica.
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