“Colocar o engano no centro da política” é um
artigo de José Pacheco Pereira, saído no Público de 8/3,
de que transcrevo a parte introdutória, que subscrevo, não podendo afirmar o
mesmo relativamente à crítica à política do actual Governo, particularmente a sobre
Passos Coelho. Quando Pacheco Pereira apregoa o despudor do Primeiro Ministro
relativamente à verdade nula das suas frases sucessivamente desmentidas, ou à
sua indiferença egoísta pelo depauperamento económico gradual da população,
julgo que o próprio Pacheco Pereira usa de dolo na sua crítica aparentemente expressiva
de grande sensibilidade pelo sofrimento geral, mas realmente de uma argumentação
especiosa, pecando por unilateralidade, ao esconder factores justificativos da
tal actuação política governativa. Armado do seu vasto saber, fascina um
público leigo, mas a sua violência unilateral e despeitada não escapa às
exigências de honestidade de um pensamento sem parti pris. É lamentável
uma tal sanha superior, que repete afirmações sobre o oportunismo de uma
juventude criada à sombra dos grupos estudantis universitários, protegidos
pelos partidos políticos, que os lançam na vida política por compadrio, que
merece a devoção partidária, mais do que por reais qualidades de cultura e
saber.
É possível que assim seja, em
muitos casos, o interesse prevalecendo à partida sobre a dedicação pelo saber,
com que o ser humano se vai preparando para a vida, através dos seus estudos. O
interesse virá depois. Mas ao rever tantas figuras que passaram no tablado da
nossa política, mesmo as inegavelmente de superior consistência cultural, ou
outras para quem o curso serviu apenas de protagonismo vaidoso e oco e nulo na
governação, ou ainda outras que abusaram de truques de corrupção que reduziram
o país a um pântano escorregadio, e ao ver a forma relativamente serena mas
obstinada com que o Governo pretende fazer o país sair desse pântano, eu
discordo das afirmações de Pacheco Pereira e acredito em Passos Coelho e no
grupo que ele chefia, com a coragem de uma imprescindível hombridade. E amor
pátrio também.
Eis a primeira parte do texto de
José Pacheco Pereira, que, essa sim, subscrevo:
“Colocar o engano no centro da política”
Sempre escrevi contra o moralismo
em política.
Não quero saber se o político A
ou B engana a mulher, ou tem uma filha que esconde do público, se fez ou não um
aborto, se é homossexual e está dentro do “armário”, ou se fuma qualquer droga
leve, e, consequentemente minta e oculte qualquer destes comportamentos
privados em público. Detesto a exposição que a comunicação social
anglo-saxónica faz da vida privada dos políticos e acho inaceitáveis as teses
que para aí circulam de que existe um direito natural de violar a vida íntima
de um político porque ele é político, e que se confunda deliberadamente o maior
escrutínio sobre aspectos da sua vida pessoal quando esta toca o espaço
público, o que é aceitável, com a devassa generalizada da sua vida privada e
íntima. A esfera da intimidade é para mim inviolável por regra, mesmo que possa
haver limitações em certos aspectos muito restritos da privacidade. Não aceito
a tese, que também circula na esquerda, de que se um político andar a fazer
campanha eleitoral com a mulher isso dá direito aos jornalistas de revelar que
ele tem uma amante, ou se for mulher e falar contra o aborto, não pode ter
feito um aborto, ou a tese muito comum na imprensa cor-de-rosa de que, ao usar
para sua publicidade a exposição do jetset, isso obriga alguém a “assumir” (como
eles dizem) “namoradas” umas a seguir às outras e a não ter vida privada.
A privacidade foi uma tão difícil
conquista do modo “burguês” de viver, ou seja do progresso material de muitas
pessoas nos últimos duzentos anos, da sua saída do mundo asfixiante das
aldeias, onde todos sabem tudo de todos, que a última coisa que quereria repor
esta era em nome de uma outra aldeia ainda mais pastosa, a “aldeia global”.
Privacidade é liberdade, é uma forma peculiar de liberdade que permite a cada
um ter uma identidade e uma efectiva capacidade de decisão “moral”. Exige, é
certo, alguma cultura e alguma riqueza material, não está ao alcance dos mais
pobres, mas a defesa da privacidade é um upgrade civilizacional, como a
anestesia.
Isto serve de intróito para dizer
que não considero que haja necessariamente uma impregnação dos “maus”
comportamentos privados na vida pública, e detesto a máquina de tornar flat os
políticos matando qualquer espessura psicológica que não suporte a pressão para
a exposição total. Churchill não aguentaria um mês com os critérios de
exposição moralista actuais, mas Hitler tinha uma vida privada sóbria e frugal.
Já é outra coisa falsificar um currículo para anunciar títulos académicos que
não se tem, usar de bens e recursos públicos para se “pagar” a vida que se tem,
quando ela é mais complicada, assumir comportamentos pré-criminosos ou
socialmente inaceitáveis como seja a violência doméstica. E, claro e como é
óbvio, aceitar a corrupção.
Feita esta fronteira,
há uma discussão sobre a moralidade em política de outra natureza e penso que
ela é crucial nos dias de hoje. É quando a imoralidade, a mentira, o engano, o
desprezo pelas pessoas comuns, o fácil pisar dos mais frágeis, torna a decência
mínima que a política deve ter em democracia, um bem precioso e a indecência um
veneno quotidiano. …………….»
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