Não são
caricatura. São retratos de corpo inteiro, de políticos nossos de varapau e
apito – que é como quem diz garganta – que só na facúndia altissonante e mutuamente
acusadora conseguem fazer passar as suas mensagens, para gáudio dos ouvintes
das respectivas facções partidárias. Mas Vasco Pulido Valente, que ultimamente
explora com grande virtude a metáfora beatificante , renega-os no seu artigo do
Público de 8/12, quase os esconjurando num «Deus nos
proteja» de apelo beatífico a uma Providência
cautelar e de desafio e incompreensão, embora
já há muito devesse estar adaptado ao jeito da nossa eloquência tribunícia
– de tribunos da plebe, está visto, que os mais raffinés, do tipo de Vítor
Gaspar, os esconjuramos também, esses sim pela caricatura da estranheza e da pelintra
inveja.
Saborosa
crítica a de Vasco Pulido Valente, de uma expressão simultaneamente subjectiva
e rigorosa de lucidez caracterológica:
«Deus nos proteja»
«Não
gosto nem do sr. Rangel, nem do sr. Assis. Bem sei que há eleições para o
Parlamento Europeu e que tanto um como o outro não conseguem pensar em mais
nada. Mas são os dois símbolos perfeitos de tudo o que a política portuguesa
tem de mais triste e desprezível: o fanatismo de partido, ou, se preferem, para
usar a nojenta linguagem do meio, o “amor à camisola”.
Ora
o “amor à camisola” não me parece qualificação bastante ou recomendável para
representar Portugal na União numa altura de crise para a própria União e para
o país. Quinta-feira, na televisão, o sr. Rangel e o sr. Assis desceram à mais
baixa zaragata a propósito das duas seitas que representam e que, para eles,
parecem resumir o mundo. Sem vestígio de inteligência ou dignidade gritaram
durante quase uma hora com o único propósito de mostrar que eram “combativos”,
como as “bases” querem, muitíssimo capazes de arranjar votos.
Nenhum
percebeu o sofisma em que assenta este comportamento aberrante. Só 14% do
eleitorado acredita nos partidos. Pior ainda: mesmo esses 14% não serão com
certeza determinados pelo espectáculo de injúria e de cólera encenada e falsa
que lhes oferecem os candidatos, venham eles de onde vierem. De resto, o sr.
Rangel e o sr. Assis não trouxeram à conversa o mais vago argumento compreensível,
convincente e novo. Com uma persistência que demonstra a vacuidade das suas
tribunícias cabeças, repetiram a ladainha da praxe. O sr. Rangel acusou o PS da
bancarrota nacional e de trazer a troika para Portugal; e o sr. Assis passou a
culpa da presente miséria para o deliberado “neo-liberalismo” do Governo. Não
falharam um lugar-comum e, depois, discutiram o “consenso”.
Durante
todo o espectáculo não se viu uma sombra de educação genuína, de pensamento
original, ou, pelo menos, de responsabilidade política. Qualquer assunto servia
(por exemplo: a manifestação da polícia), para voltar à sopa requentada da
querela entre o PS e o PSD. É mais do que evidente que o sr. Rangel e o sr.
Assis não percebem que o português comum verdadeiramente não se interessa por
essa repugnante guerra e que, não parando de falar dela, os facciosos de
serviço lhe estão na prática a mentir. Não apareceu até agora uma exposição
séria sobre o estado de Portugal, sobre os quatro anos de troika ou sobre o
futuro da Europa. E pretendem eles que o país lhes dê uma sinecura em Bruxelas,
bem protegidos do desespero e da miséria indígena, em nome dos méritos do PS e
do PSD… Deus nos proteja.»
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