Tem La Fontaine uma fábula
Sobre um carreteiro caído
num fosso
Que ele retirou de Esopo,
- “O Boieiro e
Héracles” –
“O Carreteiro
atolado”
Do fabulista francês,
A quem, solenemente,
Aquele chamou de faetonte
Apesar de se tratar
Não de um coche solar
escaldante
Mas de um carro de palha
trazido do monte.
Como ficou prostrado,
E o carreteiro indignado
Se pôs em suplicante oração,
Ele vem a calhar
À nossa situação
De suplicantes crónicos
Em débitos permanentes
De delinquentes.
Vejamos então:
«O Carreteiro atolado»
«O faetonte dum carro
de feno
Viu o seu carro atolado
numa ravina.
O pobre do homem estava
afastado
De todo o socorro
humano.
Era no campo, perto
De um certo cantão na
baixa Bretanha
Chamado Quimper
Corentino
Buraco perdido onde o
Destino
Enfia as gentes quando
as quer punir.
Deus nos preserve de
tal viagem
Autêntico exílio para
quem quer viver
Na capital da erudição
e do prazer
Que é o Paris da nossa vivência.
Mas voltemos ao
carreteiro atolado
Em tal lugar, sem
qualquer personagem
Que o viesse socorrer.
Ei-lo que se enfurece
E solta palavrões a
esmo,
Contra os buracos,
contra os cavalos
Contra a carroça, contra
si mesmo.
Por fim invoca o Deus,
cujos trabalhos
Tão célebres são no
mundo:
“Hércules, suplica,
ajuda-me,
Se o teu dorso suportou
outrora
A máquina redonda e
potente,
(Em substituição
momentânea do monte Atlas)
Bem pode o teu braço
valente
Tirar-me daqui agora.”
Feita a oração, ele
ouve na nuvem
Uma voz que assim lhe
fala:
“Hércules impõe
primeiro
Que se trabalhe e só
depois
Ajuda as gentes. Vê donde
provém
O obstáculo que te
retém.
Tira em seguida das rodas
Essa infeliz argamassa,
Essa maldita lama
Que até ao eixo se fixou,
E as prendeu.
Pega no sacho e destrói
O calhau que as impede
Enche-me essa cova.
Já está?” “- Sim,” - diz o homem.
“ – Ora bem, vou-te
ajudar. – soa a voz.
Pega no chicote.” – “Já
peguei.
Que é isto? O meu carro
está a andar!
Hércules seja louvado!”
Responde a voz: “Vês
Como os cavalos
facilmente
Se desenvencilharam?
E tu igualmente.
Ajuda-te, o Céu te
ajudará,
Sempre clemente.”
Foi com estas histórias esclarecedoras
E muitas outras dos seus
estudos progressivos
Próprios dos seres
racionais,
Que os povos das zonas
promissoras
De uma Europa empenhada
Foi educada.
Por isso são cumpridores,
Normais,
E antes de pedirem ajuda
aos deuses
Tentam resolver a sua deficiência
Com eficiência.
Nós, pelo contrário,
Resistentes ao esforço
próprio,
Mais adeptos do fadário
Implícito no fado
Segundo a sina rezada
Nas linhas traçadas na
nossa mão,
Usamos provérbios
Que nos apoiam na
extravagância
Da nossa indolência,
Como o que afirma
“Não é por muito madrugar
Que amanhece mais cedo”,
Que confirma as injustiças
Das muitas cobiças.
Embora tenhamos também
Provérbios apoiantes
Da tese da fábula antiga,
Incitando-nos a produzir
Antes de pedir:
“Fia-te na Virgem e não corras!”
“Fia-te na Virgem e não corras!”
Ou esse de antiga
homeopatia
Pela alegria:
“Deitar cedo e cedo
erguer
Dá saúde e faz crescer”…
Mas isso era antigamente
Antes da Internet.
Lidamos melhor com a cunha
Não tenho dúvida nenhuma.
Nenhum comentário:
Postar um comentário