«Dias Contados»
mais uma vasta crónica no FORUM do DN, de 8/6 da autoria de Alberto
Gonçalves, que abrange vários temas, com a graça habitual. Consta o 1º - «A
Selecção Censurada» - da dimensão mediática em torno da “tendinose da
patela” no joelho de Cristiano Ronaldo,
com as graves consequências de tal maleita sobre a Selecção, além de outros
diversos interesses jornalísticos de uma “dimensão” risível ligados à problemática
futebolística, que não resisto a transcrever:
«A Selecção Censurada»
«O
Tribunal Constitucional continua a fazer política, sabotar a economia, irritar
o senhor primeiro-ministro e desencadear trapalhadas que talvez terminem, sem
terminarem, em eleições antecipadas e num segundo resgate? Pedimos desculpa,
mas neste momento a atenção do povo volta-se para o joelho de Cristiano
Ronaldo, que consta padecer de uma tendinose na patela. Ao longo dos últimos
dias, os portugueses correram para o Google a procurar "tendinose" e
"patela". Os portugueses menos letrados correram a procurar
"joelho". Nenhum precisou de procurar "Cristiano Ronaldo".
Vale
que as televisões se empenharam por tratar o assunto. Desgraçadamente, só
conseguiram transmitir cerca de 471 reportagens e debates em volta da lesão e
das eventuais consequências da lesão. E se Ronaldo, vulgo CR7, não puder jogar?
E se Ronaldo não puder jogar contra a Alemanha? E se Ronaldo só puder jogar
depois da fase de grupos? E se Ronaldo jogar, jogará a 100%, 70% ou apenas a
52,44%? Na falta de esclarecimentos cabais da FPF, médicos, curandeiros, xamãs
e peritos avulsos aliviaram-se de opiniões sensatas. Esporadicamente, um
comentador punha o dedo na ferida e lembrava que nem tudo se esgota em Ronaldo:
ainda há Pepe, Coentrão, Moutinho, Meireles e os demais heróis, aliás recebidos
pelo Prof. Cavaco antes do início da epopeia - em Belém, conforme é tradição
das nossas gestas.
Também
aqui valeu a ajuda das televisões, que contra ventos e marés e em prol do
grande jornalismo escoltaram o autocarro da selecção entre um hotel e o palácio
presidencial, e de seguida entre o palácio e a Portela, onde desfrutámos de
magníficos planos dos jogadores às compras no duty free. Desde que Abraham
Zapruder filmou a morte de J.F.K. que não via imagens tão dramáticas quanto as
de Nani a apreçar barras de Toblerone. Porém, tamanho "furo" é raro.
A
época vigente arrasta-se sob o signo do zelo dito "securitário". E
não, não me refiro às cautelas alfandegárias dos EUA, lugar escolhido para a
selecção estagiar antes do estágio final. Refiro-me ao abusivo sigilo praticado
pela FPF, que não apenas impede às câmaras o acesso integral aos treinos como
não permite a partilha das radiografias, ecografias e angiografias ao joelho de
Ronaldo, deixando o povo a especular acerca da evolução da maleita e do estado
do tendão patelar. E o tendão é mero exemplo: é igualmente inaceitável, por
exemplo, a ausência de microfones nas palestras do treinador e a escassez de
"apontamentos informativos" nos quartos e nos jacúzis ocupados pelos
atletas, privando de dados vitais uma nação ávida dos mesmos. Já me aconteceu
fazer zapping às três da manhã e não descobrir um único "directo"
alusivo ao "mundial". Não havia sequer um Bruno Alves disponível para
afiançar que o grupo está unido?
Ao
contrário do que se usa dizer, a culpa não é dos jornalistas, em geral
conscientes do seu papel na elucidação do público (quando a FPF lhes veda o
acesso aos heróis, os intrépidos repórteres desatam a interrogar os transeuntes
mais à mão e a obter momentos de enorme interesse noticioso). O problema são as
condições de trabalho com que os jornalistas se deparam, a mentalidade tacanha
que favorece a ocultação e o secretismo.
Esperemos
que durante o campeonato as coisas mudem. Se a selecção é de todos nós, é
natural desejarmos saber tudo o que ali se passa. O que não é natural é a
censura, a explícita da Federação e a dissimulada de quem anseia por distrair
as massas com criancices. Basta de encher "telejornais" com
chouriços, "chumbos" do TC, "chicana" política. A política
de um patriota é o trabalho: o trabalho de apurar em definitivo a situação de
Ronaldo, de acompanhar a recuperação de Beto, de dissecar o plano B de Paulo
Bento, de perceber se Nani já deglutiu os Toblerone. Um país que não define
prioridades não vai a lado nenhum, excepto ao
Brasil.»
É igualmente apelativo o 2º tema - «O fantasma de
Louçã» - e a troça em torno de uma figura, que tendo já assumido
preponderância oratória - de arreganho catilinário – em tempos passados, ao
constatar o rombo que sofreu o seu BE nos resultados eleitorais, tenta manobras
delatórias revanchistas – contraditórias e insensatas, que levam o articulista
a outras hipóteses de propostas ainda mais absurdas, para constatar a morte do BE:
O fantasma de Louçã
Depois
de sempre se ter oposto à saída de Portugal do euro, cujas consequências
considerava "terríveis", Francisco Louçã regressou do Além
"trotskista" para ir à Mesa Nacional do Bloco de Esquerda colocar na
dita mesa a hipótese de Portugal sair do euro. Além disso, ou também por causa
disso, hoje defende a aproximação ao PCP.
O
volte-face surge na sequência da derrota do BE na "europeias", por
sua vez já uma sequência da derrota do BE nas "autárquicas" e uma
presunção das derrotas que hão-de vir. Não é preciso ser profeta para prever
que ao longo dos próximos actos eleitorais o BE reagirá a cada rombo na
popularidade através de uma radicalização progressiva. Se nas legislativas
voltar a perder 50% dos votos e dos deputados, o Dr. Louçã aparecerá a sugerir
que o País abandone a União Europeia e assuma protocolos institucionais com o
regime de Gaza. Quando um dia perder qualquer representação parlamentar, o Dr.
Louçã aconselhará a luta armada e a reabilitação moral de Otelo. No momento em
que o eleitorado do BE não ultrapassar em muito o número de membros da
liderança bicéfala, o estado-maior do partido poderá ser encontrado no Parque
de Monsanto, a cozinhar húmus e a revolução.
Ou
é isso ou a possibilidade agora apresentada por Ana Drago - e logo rejeitada
pelos seus pares: a abertura de um "diálogo à esquerda" (eles dizem
"esquerdas") com o Livre, o movimento 3D e o PAN. Se levarmos em
conta que o Livre é o pseudónimo de um ex-eurodeputado do BE, que o 3D
representa dois ou três dissidentes do BE e que nem a internet imagina o que
seja o PAN, é fácil concluir que o BE morreu. E, embora por razões mais
ligadas ao humor do que à política, deixará saudades. »
O 3º tema - Um
país à escala do Rato – sobre o medo que a direita tem da possível
substituição de Seguro por Costa na direcção do PS - revela a inanidade de
pensamento de uns e outros:
Um país à escala do Rato
Uma
história engraçada a correr por aí é a do medo que António Costa suscita na
direita. Em primeiro lugar, não sei o que se entende por "direita",
se os partidos no Governo ou se as pessoas que não apreciam um Estado
intrometido e salteador (ambas as instâncias parecem-me algo incompatíveis). Em
segundo lugar, garantiram-me que uma sondagem "interna" coloca o
portentoso "carisma" do Dr. Costa um ou dois pontos percentuais acima
do pobre rival nos gostos do eleitorado em geral. Por conveniência, admitamos
que PSD e CDS andam assustadíssimos e que as facções empenhadas em enxotar o
Dr. Seguro têm razão.
Ainda
assim, não é esse o ponto. O ponto é a tese que resume os apetites dos
insurgentes no PS: trocar o líder A pelo líder B é vital na medida em que A não
é capaz de devolver os socialistas ao poder (ou o poder ao partido) e B talvez
o faça. Pelo menos a franqueza é louvável. Claro que todos os partidos actuam
em benefício daquilo que os coloca próximos do mando, mas costumam disfarçar a
cobiça sob o simulacro de um debate interno e vagamente ideológico. O PS do Dr.
Costa, ou que se serve do Dr. Costa, não disfarça. Ali não existe a menor
intenção de distinguir o pensamento do autarca lisboeta do pensamento do
secretário-geral, tarefa de resto impossível na medida em que nunca qualquer
deles revelou possuir semelhante excentricidade. B é preferível a A porque sim.
Marx,
o bom e velho Groucho, esclarecia: estas são as minhas convicções; se não
gostarem, arranjo outras. No PS não há convicções nenhumas, excepto a certeza
de que se está mais confortável a decidir orçamentos do que a votar contra
eles, a satisfazer clientelas do que a pedir-lhes paciência, a afundar a
economia do que a acusar Pedro Passos Coelho do mesmo. Não ocorre aos
socialistas que à margem das intrigas há alguns milhões de cidadãos, certamente
cansados de austeridade e provavelmente abismados com o brutal egoísmo dos que
lhe prometem o fim da austeridade. Em suma, discute-se o melhor para o PS como
se se discutisse o melhor para o País. Por acaso, e por norma, costuma
funcionar ao contrário. Nesse sentido, e só nesse, o Dr. Costa mete medo.
Termina a página com o retrato de António Costa em
destaque, com direito a foto de punho erguido, a “MOBILIZAR PORTUGAL”, e um
breve texto intitulado «O que ninguém tinha coragem de dizer”:
«Os
que acusavam António Costa de vacuidade engolem em seco. No Porto, além da candidatura
à chefia do PS, o homem apresentou a receita para salvar a pátria: Uma nova
agenda para Portugal. Ingredientes: “sustentabilidade demográfica”, “sustentabilidade
energética e ambiental”, “sustentabilidade financeira”, “sustentabilidade
económica”, “sustentabilidade de modelo social”,. “sustentabilidade do Estado”.
Modo de preparação: “reunir vontades”, “construir compromissos”, “mobilizar energias”
e depois “levar ao forno”. Polvilhar com “europeísmo” que não seja “auto-ingénuo”(sic).
Há quanto tempo o país não era sacudido por abalo filosófico tão profundo? Pelo
menos desde os programas do chef Silva»
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