Quando penso naqueles que se metem de moto próprio numa
aventura de destino desconhecido, largando pátrias e lares em busca de uma vida
diferente, muitos por medo, muitos por ambição, quantos por desejo de arrasar,
infiltrando-se, os alicerces de uma cultura e uma religião que não é a deles, para impor,
pela força, a do seu radicalismo islamita, lembro aqueles tempos em que também
nós, os da distância marítima, fomos forçados a fazê-lo, alguns tudo largando,
outros conseguindo trazer os restos dos haveres que julgavam necessários para o
seu recomeço num destino incerto. Mas tínhamos aviões ou barcos que nos
largaram no solo pátrio, e por vezes o braço familiar tão necessário para o
recomeço, a própria pátria nos acolhendo, dentro das responsabilidades que
entendera ter para com os que também lhe pertenciam por direito, apesar da má
vontade de muitos dos que aqui estavam de raiz. Vejo-os a esses outros,
caminhando rápidos, despojados de tudo, com as crianças pequenas ou maiores,
sorrindo, apesar de tudo, apesar das lágrimas de muitos, de uma coragem e
ousadia que admiro, por ser tão incerto o seu futuro, tão sem condições o seu
presente, sujeitos, para mais, a uma aventura marítima quantas vezes trágica,
como fora a nossa na ida, por mares desconhecidos, na ambição da riqueza e na
fé de espalhar o cristianismo pelo mundo.
E a seguir leio textos do nosso medo – os de Vasco
Pulido Valente e de Alberto Gonçalves – retomando os dados das
nossas lutas intestinas, na caricatura da nossa governança e dos que pretendem
arrasar, sob falsos argumentos de compor, o que foi feito, em princípio para
fazer melhor, sem pejo de si próprios, sabendo quão necessária seria uma coesão
autêntica entre as forças partidárias, para vencer esta crise a que se chegaria
forçosamente, tanto foi o esbulho e a má reconstrução num esbanjamento de
toleima dos empréstimos consentidos pelos “maus da fita”, na designação irónica
de Salles da Fonseca referindo-se aos emprestadores do dinheiro, com a sua
filosofia kantiana da “ética de dever fundamentada na racionalidade humana” distinta
do “hedonismo que, sem esforço, tudo quer já”, sendo que “o trabalho
é uma obrigação para qualquer alemão; o trabalho é um direito para quase todas
as nações. Os alemães produzem; os outros consomem»
Pulido Valente mostra-se bem preocupado com a atitude
de Costa recusando-se a “alinhar” com Passos Coelho na questão da viabilização
do orçamento do Estado. Alberto Gonçalves põe um pouco água na fervura, achando
que quando Costa for governo, Costa viabilizará o OE. Mas são muitas as
sentenças, muito o pretensiosismo, muita a tropelia, muito o arreganho, muito o
ódio, afinal. Por cá.
Pobres de nós
O dr. António Costa sabe que se perder em 4 de Outubro
acabou politicamente. Depois de ter assaltado o PS e corrido à má cara com
Seguro para ganhar à coligação, se não ganhar todo o azedume que contra ele se
criou no partido virá ao de cima e ele não se conseguirá aguentar uma hora como
secretário-geral.
A
gente com que ele correu não esquecerá nem a brutalidade e a arrogância do
método, nem que ele foi eleito pelo voto dos “simpatizantes” socialistas
(um categoria indefinível) e não pelos “militantes” (uma categoria, pelos
menos, tradicional). Além disso, há Sócrates que, com razão ou sem ela, se
sentiu “posto ao lado” (José Lello) e traído e que só espera uma boa
oportunidade para o liquidar.
A
política não é um jogo pacífico e António Costa, que o sabe muito bem, não
se ilude com certeza sobre os perigos da sua situação. Uma única coisa o
pode salvar: conseguir a maioria absoluta para o PS. Mas presumivelmente,
e apesar da propaganda que se fez sobre o debate com Passos Coelho, não
parece que chegue lá. Não admira que perante o que, para ele, é a ingratidão e
a cegueira dos portugueses, Costa ameace agora arrastar o país consigo.
Sem surpresa nenhuma para mim, que estava à espera de um golpe destes, o
admirável candidato do PS anunciou anteontem solenemente no Seixal que não
tencionava “viabilizar” (ou sequer negociar) o orçamento de Estado da
coligação. Ele não ignora as consequências desastrosas para os
portugueses desse acto suicida. Pelo contrário. De qualquer
maneira, prefere um desastre com ele do que um desastre sem ele. Suceda o
que suceder.
A
Constituição não permite ao Presidente Cavaco dissolver a Assembleia até
ao fim do seu mandato; ou que a Assembleia seja dissolvida nos primeiros
seis meses do dela. O que significa que Portugal será obrigado a viver sem
orçamento (e por duodécimos) no mínimo até Junho-Julho do ano que vem. O
que lançaria as finanças públicas num caos, sem falar nas reformas de
qualquer tipo, que teriam de ser metidas numa gaveta durante oito meses.
Pior ainda, os mercados que hoje nos sustentam a juros razoáveis não
tornariam tão cedo a emprestar um tostão à irresponsabilidade indígena.
Desde
a I República que não aparecia um cacique da envergadura do dr. Costa na
cena política portuguesa, pronto a meter o país no fundo por vaidade pessoal
ou conveniências partidárias. Apareceu anteontem. Pobres de nós.
Um dia teremos saudade da troika
por ALBERTO GONÇALVES
DN, 20/9/15
Com a pompa digna de um Watergate, o Público divulgou
uma carta de Passos Coelho a Sócrates em 2011 e explicou que o então líder do
PSD "exigiu" ao então primeiro-ministro "que pedisse apoio
externo para resolver os problemas financeiros do país". A pompa é
exagerada. A divulgação é redundante (a carta era conhecida). A explicação é
desastradamente falsa.
Na carta em questão, não há - nem poderia haver -
qualquer exigência: há a verificação de que o país estava na iminência da
bancarrota, de que era fundamental impedir a dita e de que, "se essa
[viesse] a ser a decisão do governo", o PSD não deixaria de "apoiar o
recurso aos mecanismos financeiros externos". Embora, dado o
"enquadramento", o jornal quisesse provar o contrário, Passos Coelho
sai do episódio como o sujeito responsável que, ao invés de Sócrates, observou
os interesses nacionais à frente dos privados. A propaganda assumida ou
"amiga" de António Costa soma desastres.
Nenhum desastre, porém, se compara ao que sucederia a
Portugal na ausência da troika. Numa campanha em que tipicamente não se discute
quase nada, discute-se muito a autoria do convite à troika. Andará tudo doido?
É uma possibilidade. Por esta altura, até uma criança deveria saber que a
troika veio a pedido formal do PS, para alívio dos quatro quintos da população
que não anseiam pelo caos e para desgosto de Sócrates, que, a exemplo de dúzias
de estadistas notáveis pelas piores razões, preferia espatifar a pátria do que
cair antes dela. Graças à insubordinação de Teixeira dos Santos, ainda bem que
a troika veio. Ainda bem que Passos Coelho compreendeu a necessidade dessa
vinda. Ainda mal que a coligação aproveitou tosca e parcialmente a
oportunidade.
A única acusação mais bizarra do que culpar o PSD pelo
advento da troika é acusá-lo de, no poder, ter excedido as respectivas
exigências. Ou, no jargão das cabecinhas ocas, de ter "ido além da
troika", a outra obsessão infantil da semana. É claro que, por opção
própria ou ordem da Sagrada Constituição, o governo ficou aquém da troika,
cujas condições sugeriam implicitamente as reformas que não se fizeram ou
fizeram pela rama. Com a ajuda do fisco, lá se cumpriram os arranjos genéricos e,
sob o verniz, manteve-se quase tudo na mesma. De vez em quando, aterravam por
aí uns estrangeiros a constatar o progresso escapatório das
"medidas". No prazo previsto, foram à vida deles, convictos de que as
nossas não têm salvação.
A questão, insisto, não é condenar quem chamou ou
apoiou a chegada da troika, mas quem a deixou partir. Sozinhos, ou soberanos de
mão estendida, não vamos longe. E, com o PS mortinho por anular o pouco que a
troika remendou, nem iremos perto.
Quinta-feira,
17 de Setembro
Festa rija
A
Festa do "Avante!" é uma amostra pequena mas representativa do que
seria o país caso os comunistas mandassem: solidariedade, convívio,
participação, música, copos, petiscos, respeito, humanismo, delegações de
grupos exóticos e terroristas, testemunhos de homossexuais insultados e
espancados, comunicados a negar os espancamentos e a aludir a sexo oral,
saudações fraternas de "camarada" e "paneleiro", em cada
esquina um amigo ou um jagunço pronto a calar dissidências ao pontapé. De botas
cardadas, como na outra cantiga. Um dia tenho de imitar o Prof. Marcelo,
abdicar dos meus preconceitos e provar tamanha alegria.
Sábado,
19 de Setembro
O verdadeiro estratega da coligação
Em
dois ou três dias, António Costa conseguiu: a) mostrar que não faz a mais pequena
ideia sobre as "contas feitas" de que orgulhosamente se vangloria por
aí; b) queixar-se à mamã de que a "direita" é feia e obrigar a pobre
senhora a discursar não sei onde; c) provar que só a irascibilidade e a
educação débil o separam de Jerónimo de Sousa; d) trazer para a campanha
questões relevantíssimas como as taxas da IVG, ou "aborto" em
português de gente; e) lançar suspeitas para cima do percurso profissional de
Passos Coelho, o qual passou a carreira em partidos e empregos oferecidos por
amigos, ao invés de muitas pessoas que não se chamem António Costa; f) garantir
que, no que depender dele, o Orçamento de 2016 já está chumbado, o que é o
mesmo que interromper a gravidez ainda antes da fecundação - e com taxas
altíssimas.
Acerca
do último ponto, porém, é exagerado criticar o homem pela eventual
ingovernabilidade da pátria. Como acontece em relação a tudo o que diz num dia,
no dia seguinte o Dr. Costa aparece a explicar melhor: obviamente, limitou-se a
garantir que chumbará qualquer OE da autoria da coligação. Nada disso implica
que, se o PS vencer as eleições, o Dr. Costa não esteja disponível para
viabilizar um OE socialista. Sempre é um descanso, e um balde de água gelada
nos que pensavam que o Dr. Costa faria implacável oposição até a um governo
liderado pela sua insigne figura.
Não
é uma hipótese absurda. Até aqui, ninguém se esforçou tanto quanto o Dr. Costa
para derrotar o PS. Em dez meses, demoliu com bravura o avanço do partido nas
sondagens. Em vésperas de campanha, começou a afocinhá-lo nas ditas. Espera-se
que a campanha sirva para desgraçar o PS de vez. Caso contrário, o Dr. Costa
terá o país inteiro sujeito ao seu prodigioso talento - e aí a desgraça será
nossa.
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