Dois artigos a não perder – de
Vasco Pulido Valente e de Alberto Gonçalves – que procuram servir
de alerta às consciências de um país que
se digladia em ira contra o Governo, em falso entusiasmo por um ridículo PS, a
socorrer-se de truques e de apoio nos anciãos que procuram vir à baila da
notoriedade, mais pelo seu passado “democrático” do que no desejo de salvar o
presente de que muitos desses “passados” são responsáveis, que todos comeram na
gamela do aproveitamento pessoal. Um país que passeia a sua má criação acentuada através também das
moças do estilo Louçã, quer a soturna Mortágua quer a maternal Martins,
senhoras do seu ódio, da sua demagogia, merecedores do culto paroleiro ou
simplesmente juvenil nacional, porque jovens ainda, podendo seduzir com os seus
discursos de serenidade e bonomia aparentes, sem tanto espumar viperino do
estilo do seu antecessor, mas certeiro na penúria da argumentação assestada
para o bota-abaixo do radicalismo unilateral, que se me desculpe a redundância:
Há
milagres?
O espectáculo da campanha já não se aguenta. Não deve
haver ninguém em Portugal inteiro que não esteja farto de abraços, de frases,
de jantares e dessa inovação que se destina a caçar à má-fé o cidadão
desprevenido e que se chama “arruada”. Nenhum dos políticos que por aí se
mostram diz nada que possa remotamente interessar ao país. Só varia o tom.
Passos Coelho exibe a sua voz doce com uma
inacreditável paciência. Costa passou do estilo Messias para uma agressividade
crescente e crescentemente disparatada. Esta semana foi buscar o BPN e o
negócio dos submarinos (que tem 20 anos). Por que não os crimes de Calígula
ou os pecados de Salazar? Ele grita, ele ameaça, ele promete e até dá
pulinhos de entusiasmo como um índio para convocar o espírito da guerra.
Entretanto, caso muito estranho, as conferências de
peritos na televisão discutem ardorosamente as razões por que ele vai perder. Estão a pôr as barbas de molho? Acreditam mesmo que
percebem Costa e o seu bando? O próprio Costa acredita ou dá a impressão de
acreditar. Um dia declara que não tenciona aprovar o orçamento da coligação
(que ele, de resto, não conhece). No dia seguinte, anuncia que impedirá um
eventual governo da direita, porque ele é o único homem capaz de criar um
consenso nacional e garantir a estabilidade. Não se sabe se trouxe estas manias
da Câmara de Lisboa ou se o ataque de nervos foi recente. Mas muita gente abre
a boca de espanto com estas novas pretensões do homem que dividiu o PS e
laboriosamente se afastou da esquerda radical com um grosso programa, que dez
sábios lhe fabricaram por amor.
Seja como for, os seus fiéis lamentam que ele, a
última esperança antes do desastre, ande tão sozinho. Os novos “barões” do
partido (que o país nunca viu) aparecem pouco e não se recomendam. Os velhos
ficam em casa. E foi preciso ir buscar ao fundo do saco antiguidades como
Basílio Horta, que dois terços dos portugueses julgam que viveu na 1ª dinastia.
E, no entanto, o PS persiste em transportar de autocarro a grande “base” do
partido, para eleger o taumaturgo que irá resolver os problemas da Pátria com a
facilidade com que o CSI descobre o assassino. É facto que ele não explica
como e que não se vê no PS nenhuma tendência para o salvar das feras. Mas, de
quando em quando, há milagres.
Oito pecados de
campanha
por ALBERTO GONÇALVES,
DN, 27/9/15
Currículos
Dos
submarinos à "roubalheira" do BPN, passando pelo "buraco
gigantesco" do Novo Banco que o programa do PS "acomodará" sem
dramas, as notícias das sondagens levaram o Dr. Costa a investir na sofisticação
dos argumentos. Mas nenhum vence o de acusar Passos Coelho de passar por
empresas "de objecto social obscuro". É justo, dado que o Dr.
Costa passou a vida inteira numa empresa cujo "objecto social" é
claríssimo: o PS, especializado em estrafegar as contas públicas e deixar-nos a
factura. Também por isso é ridículo sugerir que o desespero das
"saídas" profissionais orienta a campanha do homem. Desde que os
amigos de Sócrates e os amigos de Seguro sofram de amnésia, o Dr. Costa tem o
futuro garantido. E ainda há a Quadratura do Círculo.
Economia
Mais
engraçado do que o esforço de certos media para esconder os sinais de
(alguma, sosseguem) recuperação económica só o desgosto da oposição ao
recebê-los. Antes, o aumento do desemprego, a subida da dívida, as
quedas no rating e o tombo das exportações provavam o advento do Apocalipse.
Agora, as tendências inversas ou não existem ou não contam ou não são
credíveis. Típico: nada ofende tanto um "activista" contra a
pobreza quanto um novo-rico. Ou um ex- pobre.
Empates
Por
obra e graça da licenciatura que em embaraçosos tempos adquiri (com nota 19 a
Estatística, lindo menino), sei o que é uma margem de erro e um intervalo de
confiança. Até o teste do chi-quadrado me é familiar. Mas não é preciso um
curso para estranhar que os comentários às sondagens insistam tanto na
questão do "empate técnico". Claro que, tecnicamente, o tal
empate é plausível: tão plausível quanto, em certos casos, a maioria
absoluta da coligação, cuja possibilidade ninguém refere. É o velho
tique de confundir a análise com o desejo. E o velhíssimo problema do
enviesamento na amostra dos analistas, a que o jargão do ramo também chama excentricidade.
É uma palavra adequada.
Governo
Por
hábito e preguiça, todos se queixam do que se discute na campanha. Ninguém se
preocupa com o que a campanha discute. Um governo? Não parece. À
"direita", a coligação só se aguentaria com uma maioria parlamentar
que hoje se mostra improvável. À esquerda, o PS só alcançará a maioria
mediante posteriores acordos, alianças ou fusões com os dois partidos
comunistas. Entre a balbúrdia e a demência, nada do que sair do 4 de
Outubro promete ir muito além dos seis meses da lei. Por isso, é preciso
calma: no fundo, as "eleições mais importantes da história da
democracia" contam pouco. Em Abril ou Maio, se o que aí vem não for de
fugir entretanto, cá estaremos.
Metáforas
Apesar
de a CNE considerar tratar-se de uma metáfora, o PCTP removeu os cartazes que
berravam "Morte aos traidores!". É pena, e mais um passo na
legitimação da hipocrisia reinante. Afinal, o PCTP era o único partido
comunista com a sinceridade suficiente para confessar, ainda que
metaforicamente, o desejo de tantos: matar os "traidores", leia-se
os lacaios do capital, a burguesia, nós todos. Serve de consolo o facto de a
retirada dos cartazes não significar o fim da ambição que move aquele bando de
potenciais assassinos (metáfora). Nem da carreira do respectivo chefe, um
sujeito com ar de quem não toma banho desde 1973 (metáfora) que, em países
exóticos, passa por advogado (metáfora).
Revelações
Numa
almoçarada do Bloco, Catarina Martins afirmou, com alarme, que a escola pública
nunca começou tão tarde quanto agora. Jura? Antes da adesão à CEE, e da mania
de que a modernidade consiste em encarcerar fedelhos, o ano lectivo começava
sem excepções em Outubro. À força de repetir mentiras assim desastradas,
a Dra. Catarina subiu a "revelação da campanha". A política
caseira beneficia de imensas "revelações". Por acaso, são quase
sempre do Bloco de Esquerda (há meses, a revelação era a filha de Camilo
Mortágua), e raramente produzem uma afirmação que sobreviva ao escrutínio da
realidade. Os jornalistas e comentadores que atribuem a distinção saberão
explicar o primeiro facto, embora não convenha questioná-los sobre o segundo.
Rua
É
na "rua", no "contacto directo com o eleitorado", que os
líderes políticos "sentem" que a sua "mensagem" está
"a chegar às pessoas". Não importa se as pessoas são cinco
transeuntes incomodados pela interpelação dos senhores do Livre ou uma excursão
de tristes, com autocarro e merenda, paga pela junta de freguesia
vizinha para abrilhantar as recepções ao Dr. Costa ou ao Dr. Passos. Os líderes
ouvem gritar o seu nome e, naturalmente, fingem concluir que o povo os venera
com zelo. Alguns, os chamados casos perdidos, começam a acreditar de facto.
Sócrates
Todos
garantiam que, sobretudo depois de ser transladado para casa, José Sócrates
influenciaria decisivamente a campanha. Até ver, surgiu sob a forma de exemplo
a evitar no primeiro debate entre Passos e Costa, e, em fotografia anónima,
num pastiche da Última Ceia. Não é impressionante: é o possível de alguém
que, sob o aplauso de oportunistas, julgou ter a importância que nunca teve. E
é, se não me engano, o estertor de um morto político. Claro que Sócrates ainda
vai a tempo de aparecer, com auréola e pizza, à janela da Rua Abade de Faria ou
em desabafos na imprensa. Mas já será o recurso cenográfico de um zombie.
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