É verdade que, fascinada pelas
palavras cheias de António Costa, de mãos dadas com as Catarinas e os Jerónimos
do pelotão apoiante, e com a camaradagem flutuante dos seus próprios comparsas
de grupo, encantados com a oportunidade de figurarem novamente ao comando desta
mesquinha embarcação sempre à deriva, entre o aperreamento e a balda, entre a
ilusão e o sono, entre o desejo e a mortificação, também eu me quis convencer
de que tudo nos vai correr à maneira, e
todos os meses espreito o vencimento, para ver se está a ser reposto, segundo a
fórmula “o prometido é devido” que se badalava quando tudo começou. Mas este
texto de Paulo Rangel veio tirar-me as peneiras e a partir de agora não vou
mais acreditar em mudança, apesar do Camões e dos outros adeptos do rio que
flui, a não ser que seja para águas ainda mais poluídas.
Não há nada a acrescentar,
suponho, a esta expressiva síntese do deputado europeu.
O consumo consome e consuma o
Governo
Público16/08/2016
1. A
estimativa rápida do Instituto Nacional de Estatística — ainda carecida de
correcção e precisão — mostra que o crescimento económico a meio do ano,
passados os dois primeiros trimestres, se queda por menos metade do que
inicialmente previu o Governo e por metade do que se registou em 2015. O
Governo Costa, socialista e apoiado activamente pela esquerda radical, tinha
como grande bandeira o crescimento. Crescimento que se faria essencialmente
por obra e graça da procura interna, do consumo privado, induzido por uma
devolução acelerada e robusta de rendimentos aos funcionários públicos e
pensionistas. Ainda no fim-de-semana, Jerónimo de Sousa insistiu na
necessidade de, no Orçamento de 2017, aumentar as pensões e os salários da
função pública. O crescimento seria também propiciado por um aumento do investimento
público e até privado. Mas investimento — apesar da reacção
delirante de Ana Catarina Mendes na noite da Festa do Pontal do PSD — nem
vê-lo! A receita milagrosa de Costa e de Centeno e, bem assim, dos seus
aliados da extrema-esquerda falhou rotundamente. Afinal onde está a subida
notória ou, ao menos, visível do crescimento? Com a política socialista e da
esquerda radical o crescimento decresce e decresce a olhos vistos: decresce
para metade do ano passado e para menos de metade das previsões de Centeno e
Costa. O dito estímulo ao consumo já consumiu o Governo e há-de consumi-lo até
o consumar.
2. O silêncio sepulcral do PS, do
Bloco e do PCP, a respeito desta aferição do INE, mostra bem o fracasso das
políticas do Governo. Aumentar de supetão e selectivamente, num único ano,
os rendimentos de duas classes da população — como se todas as outras
não tivessem sido expostas aos mesmos sacrifícios por causa do resgate
— não produziu nenhum efeito palpável no crescimento económico. E,
porque essa medida imprudente teve como contrapartida um significativo
aumento de impostos (também sobre o consumo), assistimos a um evidente
efeito recessivo de diminuição do crescimento económico. Isto, que
comprova a falência e a exaustão do programa económico do Governo da frente de
esquerda, nenhum dos três ou quatro partidos comenta ou explica. Não se ouviu
uma palavra de Costa, de Catarina Martins ou de Jerónimo de Sousa sobre este
mau resultado. Ouviu-se, sim, sem nenhum menoscabo para a dirigente
socialista, uma surreal declaração de Ana Catarina Mendes em reacção ao
discurso sério, responsável e realista de Passos Coelho no Pontal. A substituta
de Costa no PS parece viver num outro país ou até num outro mundo. E depois, já
ontem, ouviu-se uma investida lírica de António Costa contra Passos Coelho, sem
nada conseguir explicar acerca dos números do crescimento que tanto o
inquietavam e obcecavam quando ele — o crescimento — de facto existia. Jerónimo
e Catarina, esses, guardam de Conrado o cabido silêncio — sem nada dizerem
quanto à derrocada das políticas que tanto sustentaram. É espantoso como estes
dois partidos que se alimentam do ruído político — algures entre a gritaria e a
berraria — estejam agora tão calados, tão sossegados, tão disciplinados.
3. Mais
grave ainda é que essa aposta no consumo privado — que falhou tão
ostensivamente — consumiu todo o programa do Governo, que afinal nela se
consumava. Fora dessa estratégia, que se revelou tão frustre e fraca, o Governo
não tem quase nada ou mesmo nada para apresentar. Em termos
económico-financeiros, foi desastrosa a gestão do caso Banif e verdadeiramente
medíocre a gestão, ainda em transe, dos assuntos da Caixa Geral de Depósitos.
No campo da educação, o Governo prosseguiu pura e simplesmente o caderno de
encargos dos sindicatos da FENPROF, hipotecado ao PCP e à CGTP, destruindo todo
o adquirido de muitos e muitos anos. Em sede de saúde, apesar da vontade do
Ministro, as cativações — impostas pelo aumento da despesa destinado ao tal
impulso ao consumo — geram dívida acumulada e vão afectar gravemente os
serviços dentro de meses. Na área fiscal, o Governo não cessa o aumento brutal
de impostos, geralmente, como se vê bem no IMI, de forma encapotada.
Um tal aumento tem um impacto automático na queda do crescimento a que aqui se
aludiu. Tudo isto para não falar na exemplaridade dos padrões de ética
republicana, onde o Governo soberbamente queria dar cartas e em que tem
sucumbido de modo assaz deplorável. Os outrora moralistas do regime,
sempre de dedo em riste, Bloco e PCP, estão agora mudos e quedos, com
declarações de princípio abstractas, sem qualquer convicção ou acutilância.
O episódio do Secretário de Estado que usa de má fé para receber um subsídio
de residência não lhes suscita nenhuma denúncia; o envolvimento do Ministério
da Educação na manobra de condicionamento e de ataque à independência de um
juiz não lhes motiva nenhuma repreensão; a promiscuidade de membros do Governo
com empresas sobre a sua tutela é retratada a título de pura e simples
ingenuidade, como se se tratasse de crianças sem qualquer experiência política…
O Governo podia ser apenas incompetente e falhar nas suas metas, mas
mostrar-se um guardião dos princípios do Estado de Direito, com que os seus
sustentáculos parlamentares da esquerda radical tanto enchem a boca. Mas nem
isso.
4. Mau,
francamente mau, foi também o desempenho da titular da Administração Interna em
matéria de prevenção e combate aos incêndios. Depois de se ter alardeado que
Portugal nunca estivera tão bem preparado, a Ministra tardou, e muito, a
aparecer, chegando a deixar o Primeiro-Ministro sozinho numa visita ao comando
da Protecção Civil. E tardou, e muito, em accionar o apoio internacional. Se
ela esteve bem na questão dos refugiados, parece agora falhar no núcleo duro
das suas funções: a protecção civil e a polícia. E nem sequer hesitou em
procurar afastar as Forças Armadas de uma responsabilidade que estas podem
muito bem, no quadro de uma compreensão moderna da sua missão, assumir. A
Ministra tal como o Governo também se aqui se consumiu e quase, verdade seja
dita, se consumou.
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