Publicadas no A Bem da Nação”:
1º Texto, em 27/ 4/15:
CALÇAS DE GANGA E OS CUSTOS DA
LIBERDADE
Um
exemplo de efeitos da globalização
As calças de ganga tornaram-se em símbolo de
liberdade.
0,8% da produção mundial de algodão para calças de
ganga provém de agricultura biológica.
Uma
costureira de calças de ganga ganha em Bangladesch 65 euros por mês (antes da
catástrofe em 2014 ganhava 37 euros por mês).
75%
do preço de umas calças de ganga são para os revendedores (retalhista dois
terços) e para a empresa de marca (um terço).
24%
são para material e transporte
1%
são custos do trabalho. Por umas calças que custam 49 euros a trabalhadeira
recebe 0,49 €.
Para
a produção de umas calças de ganga (plantação de algodão e acabamento com
produtos químicos) são precisos 8.000 litros de água. Só para o branqueamento
de umas calças de ganga com cloro são utilizados 60 litros de água (para
comparação, um alemão utiliza 128 litros de água por dia). No tratamento de
umas calças de ganga são usados até 700 produtos químicos.
Umas
calças precisam de percorrer 19.000 km até chegarem ao vendedor na Alemanha. O
algodão é cultivado na Índia ou Cazaquistão, fiado em fios na Turquia, colorido
em Taiwan, tecido em pano na Polónia e com ele são feitas as calças de ganga na
China.
Em
2013 a Alemanha importou 114.000.000 calças de Ganga. Por isso a média do custo
de umas calças de ganga na Alemanha são 8,77€. Na França e na Itália o preço
médio de umas calças de ganga são 15€. A diferença dos preços vem do facto de a
Itália e a França importarem apenas um terço da quantidade que importa a
Alemanha. Para esta informação servi-me dos dados para a Alemanha referidos no
HNA de 25.04.2015.
O
preço da moda obriga! A indústria têxtil é mundialmente a maior poluidora. A
globalização, no que se refere à ganância de lucro tem consequências horrendas:
destrói o saber ancestral e hábitos culturais, coloca os trabalhadores num
combate de concorrência internacional desesperada e não respeita o ambiente.
Se
na Europa os consumidores por razões éticas deixassem de importar os produtos Fast
Fashion quem sofreria as consequências seriam as trabalhadeiras dos países da
produção. Moralmente repreensível são as empresas que adquirem lucros à custa
da humanidade. A sociedade precisa de uma mudança de pensamento, de uma nova
mentalidade.
Comentário:
A igualdade social, que pretende equiparar os homens e
as mulheres através da ganga, é, de resto, uma moda bem gira, sobretudo se
apreendida nas ancas bem feitas das raparigas vistosas, além de que usadas
dentro do princípio de solidariedade social, que irmana os que vestem as calças
de ganga a Ocidente, às costureiras que as fabricam, a Oriente. São ainda passíveis
de cortes, que não só abrem a curiosidade às peles, como demonstram a nossa fraternidade
no que deixam prever da labuta ocidental, que vai mesmo aos rasgões, acrescida
da consciência individual, proporcionadora do nosso bem-estar espiritual, de
que assim, pela compra, ajudamos ao bem-estar material, pelo pagamento chorudo,
dos salários das costureiras do Bangladesch.
2º Texto, em 25 de Abril de 2015
O 25 DE ABRIL DE BAIXO CONTINUA POR
FAZER
UMA
REVOLUÇÃO DO CONJUNTIVO – PORTUGAL SEM AMIGOS
Era
uma vez a revolução do 25 de Abril. Aquele dia em que a História, começa a
dizer-nos adeus e a acenar-nos de volta.
Sob
tanta música e tanto aroma do passado, quem tem o poder da interpretação da História?
Quem tem algo para dizer? A consciência da justiça perdeu-se. A renovação
precisa de nova orientação.
Portugal
partido deixou de ser inteiro
Portugal,
sem querer, foi reduzido ao 25 de Abril. A nuvem da ideologia e a
tradição jacobina não deixam raiar nele o sol de todos: o Sol é só delas, não o
deixam ser bem-comum.
Revoluções
e 25 de Abril há muitos! Para cada qual o seu Abril! Só Portugal não tem
nenhum! Portugal partido deixou de ser inteiro porque o partido se esqueceu que
é apenas uma parte do todo. Num país desagregado em que a Pólis não flui porque
se confunde fluência com instabilidade, a vida política consta de portugueses
de extremos: de opressores ou de vítimas com os correspondentes
correligionários.
O
25 de Abril é dos portugueses ou de algum partido?
Sim,
até porque, por vezes, na opinião pública se chega a ter a impressão que o 25
de Abril é pertença da esquerda e não do povo português. Elites portuguesas
precisaram de uma “revolução” para alcançar uma democracia e uma prosperidade que
outros povos conseguiram sem ter de dever nada a ninguém.
O
público distraído vivia no arraial da festa e o cidadão pé-descalço, não sentia
dores nos pés, devido ao encanto da música. Entretanto a música passou, o ritmo
desacelerou e só a marcha continua numa cadência surda, a viver de ecos
longínquos de solmizações desafinadas e reduzidas a “esquerda”-“direita”. Tudo,
o vento levou. O que nos mantém unidos é a palavra democracia, embora já
bastante rompida.
Feitores
e herdeiros do palco “25 de Abril” continuam a fazer acrobacias para adeptos e
espectadores enquanto xamãs republicanos, por trás dos bastidores, garantem o
descontentamento como continuidade nacional. Aqueles não têm perspectiva nem
planos a longo prazo e estes não lhes deixam criar condições gerais.
A
democracia recebeu um carácter regional: na monarquia rivalizavam-se as
famílias nobres, na república rivalizam-se os partidos. As famílias nobres
tinham a terra que os unia, os partidos une-os a ideologia. A sociedade
portuguesa não tem uma filosofia conservadora coerente, nem uma filosofia de
esquerda séria; na praça pública sobressai um discurso e uma praxis diletante
de esquerda e de direita!
Portugal
não tem amigos, e por isso não conhece alternativas; na gerência do Estado, a
carência de programas (e de conceitos) é substituída pelo rotativismo
partidário. Se antes vigorava o direito dos mais valentes depois passou a
vigorar o direito dos mais fortes.
Inês
de Castro imagem de um povo sem família que a acolha
Os
políticos da nossa democracia são surdos à voz do povo. No escuro dos
ministérios e nas lojas dos irmãos cruzam-se entumecidos os assassinos de Inês
(de Castro) - a nação humilhada porque esquecida! Na voz da gente ecoam
as súplicas de Inês num chorar meigo de mágoas temperadas num amor não
correspondido; Inês sofre na aura do meu povo onde brilha o pôr-do-sol de uma
era sem sol nascente. Inês é Portugal ao relento que continua a bater à
porta do Estado, do rei Afonso que a assassina por “razões de estado” mas será
reabilitada (só depois da morte) por razões do coração de um Pedro difamado...
A Tragédia Castro é uma boa imagem da nação, do 25 de Abril e do povo que
continua com destino trágico!
A
democracia é povo e por isso se manteve longe do Estado; alguns
queriam democratizar o sistema mas o sistema acabou por domesticá-los; ao
integrarem-se no sistema, este sugou-lhes a personalidade tornando-os objectos
do regime político e dos correspondentes grupos de interesse, sem ideais nem
ligação ao povo: onde não há ideais não há povo. Por isso a nossa
república não consegue produzir personalidades de perfil estatal (talvez se
note alguma na sua sombra: Manuel de Arriaga, Ramalho Eanes, Salazar e algum
que o leitor se lembre). A república tem sido boa e profícua em produzir
opositores ao governo mas tem sido má em produzir governantes e personalidades
íntegras.
O
descontentamento é geral; por todo o lado surgem candidatos a presidente numa
intenção de encurralarem o “estabelecimento” e a classe política corrupta.
Quer-se uma unidade para lá do espectro esquerda-direita no sentido de uma
unidade popular contra a corrupção, contra a elite. A revolta está bem patente
mas como é de baixo não tem patentes que a façam valer. A história de Portugal
tal como o regime de Abril, resume-se no dilema entre razão e coração, entre D.
Afonso e D. Pedro (o Justiceiro) e que se resolve na Tragédia de Inês, na
tragédia do povo, que se revela como a sustentabilidade de Portugal.
Há
41 anos festejava o povo, hoje festejam os funcionários dele. Neste
contexto, as comemorações de Abril dão mais a ideia de serem um acto de
auto-elogio ou de lavagem da própria consciência (ideologia) em louvores
mesquinhos ou num bota-abaixo de um passado enevoado para louvar um futuro ensombrado.
O
25 de Abril de baixo continua por fazer e o 25 de Abril de cima encontra-se nas
mãos de “mercenários”.
Comentário:
Uma análise extraordinariamente lúcida, de uma “linda
Inês” sem socorro, rainha depois de morta, apenas nas maravilhosas estrofes
de Camões, (aplicáveis aos referentes
real e metafórico), ele próprio, também simbolicamente, morto na miséria, tal
como essa pátria que ele elevou à glória, apenas no eco do seu poema, que a nossa
prosa rasteira definitivamente contraria.
3º Texto:
Quinta-feira, 23 de Abril de 2015
CENTENÁRIO DO HOLOCAUSTO DOS
ARMÉNIOS
A
perseguição turca conseguiu reduzir os 25% de cristãos da sua população para
apenas 0,2%
A
perseguição turca aos cristãos foi mais eficaz que a perseguição nazi aos
judeus. Na área da Turquia, em 1915, 25% da população era cristã mas com o
genocídio e a contínua perseguição e discriminação dos cristãos restantes, a
Turquia conseguiu reduzi-los para 0,2% da população; hoje 99% da população
turca é muçulmana. A Turquia, herdeira do Império Otomano compreende-se como
Estado de etnia homogénea muçulmana.
A
24 de Abril de 1915 começou o genocídio arménio praticado pela Turquia
na área do Império Otomano onde os arménios viviam como minoria desde o séc. 8
a.C. A Turquia deu então início ao extermínio da presença cultural arménia em
Constantinopla, com incursões e aprisionamento massivo das elites arménias
publicando depois a lei de deportação a (Ainda hoje são deportados arménios de
Aleppo na Síria).
Seguia
uma estratégia que consistia em organizar jovens arménios e soldados desarmados
em “batalhões de trabalho” que eram depois assassinados em massa; os velhos, as
mulheres e as crianças eram obrigados a sair em marchas da morte em direcção ao
deserto sírio. Os arménios também eram transportados em vagões de animais no
comboio-Bagdá, que a partir de 1915 deportava muitos arménios para o deserto
onde eram assassinados em massa. (Já de 1894 até 1896 tinha havido perseguições
com o assassínio de 80 a 300.000 arménios).
Conivência
entre Alemanha e Turquia
O
abate de uma sociedade civilizada em que foram mortos 1,5 milhões
de arménios deu-se com a conivência da Alemanha. Aqui, como lá, numa
tentativa de oportunismo ou de branqueamento das barbaridades cometidas no
primeiro genocídio do séc. XX, os dois Governos não querem empregar o termo
genocídio que designa o plano e execução do extermínio dos arménios.
Francisco
I, tal como historiadores independentes, designou de “genocídio„ o
extermínio dos arménios, argumentando: "Onde não há memória, o mal mantém
as feridas abertas". O Papa foi muito criticado na Turquia por ter
empregado a palavra “genocídio”.
O
Governo alemão, ao contrário do Parlamento Europeu e da França, evita empregar
a palavra genocídio para designar o holocausto dos arménios por considerações
semelhantes às que levaram a Alemanha a calar outrora o genocídio dos arménios.
Esta torna-se numa situação insuportável, numa Alemanha que tão bem processou o
seu passado (2° genocídio).
“Os
alemães, aliados dos turcos na Primeira Guerra Mundial... viram como as
populações civis foram fechadas em igrejas e queimadas, ou reunidas em massa em
campos, torturadas até à morte, e reduzidas a cinzas”
Em
junho de 1915, escrevia o cônsul-geral alemão em Constantinopla, Johann
Heinrich Mordtmann ao Governo em Berlim: “Trata-se de aniquilar os arménios,
como me dizia Talat Bey há algumas semanas”.
A
política de extermínio com o uso de agentes químicos e biológicos, de gás
tóxico e inoculação de tifo, os campos de extermínio, o processo sistemático e
o planeamento da destruição de um povo inteiro, "organizado pelo
Governo" serviram de exemplo para Hitler no genocídio dos judeus. Adolf
Hitler encorajava os comandos superiores da Wehrmacht a 22/08/1939 dizendo:
”Quem fala hoje do extermínio dos arménios?”
Rößlert,
então cônsul alemão em Aleppo, salvou muitos arménios e documentou as acções praticadas.
Um representante da autoridade turca concluía a 31.08.1915: “A questão arménia
já não existe”.
O
respeito pelas vítimas é desvirtuado ao substituir a discussão do acontecido
pelo discurso sobre a questão da propriedade de termo genocídio ou massacre.
Pretende-se a paliação do crime.
Os
arménios querem com razão que se reconheça como genocídio a perseguição de
extermínio levada a cabo.
O
historiador Hesemann considera o genocídio contra os arménios como a
perseguição aos cristãos mais sangrenta da História.
Há
histórias da História por contar, os informados sabem que cada época, cada
ideologia, conta a História que mais lhe agradar. Também hoje se
branqueiam revoluções e se ignora a realidade do que acontece em África
direccionando-se a atenção dos povos para o marginal.
António da Cunha Duarte Justo
Páginas desassombradas
sobre o genocídio dos Arménios, perpetrado pela Turquia na Primeira Guerra Mundial,
paradigma, em superioridade numérica e monstruosidade mortífera, do percurso nazi
na Segunda, discípulo mais anjinho do que pensávamos, ignorantes que somos.
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