quinta-feira, 11 de junho de 2009

“Se não fizermos como os outros ficamos para trás”

Disse-o Felícia ao Felício, implicada nas tramóias de banca da Dona Branca e que à conta disso comprou um bom apartamento. Mas já vinham de família os seus dotes de economista, como familiar de um sujeito que enriquecera a vender sacos de adubo misturado com terra, até que foi descoberta a falcatrua por um daqueles lavradores demasiado minuciosos na questão dos fertilizantes o qual detectou a mixórdia e promoveu a denúncia.
Felícia desabafou com Felício, confiadamente, o seu pensamento economicista, que generalizava a toda a nação a característica da cleptomania. Mas Felício não se ofendeu, nem lhe mostrou o fato coçado, sintoma – embora débil – de que não estava incluído nos “outros”.
No fundo, concordava com Felícia, ouvidas e lidas as notícias diárias de escândalos financeiros, que implicam contas no estrangeiro em nome de familiares, divórcios apressados – e aparentes - para salvar o dinheiro extorquido, pondo-o em nome da cônjuge, cambalachos de vária ordem entre promotores diversos, numa rede cada vez mais cerrada, que inclui o distante Macau, e sem a Justiça por perto a desatar os nós das intrigas fiscais e outras mais.
A minha experiência sobre essa particularidade dos “outros”, que somos “nós todos”, segundo a visão exageradamente pessimista de Felícia, também é antiga, embora de pouca monta, mas que serve para aclarar a questão - desde assaltos à casa confiante, assaltos à bolsa de esticão, “contos do vigário” à porta de casa, referentes a urgências de embarque no combóio devido a doença de familiar, exigindo os 1000$00 que seriam devolvidos dias depois mas nunca foram, o dono da loja que erra adrede nas contas apesar da máquina, a moça da padaria que apanha o portamoedas esquecido no balcão e não o devolve, negando tê-lo encontrado... um romance em muitos episódios sobre a temática dos sem escrúpulos que nos definem, segundo os cépticos como Felícia. Mas são pequenas malandrices, de um mesquinho povo inseguro, por ser criado sem princípios cívicos, acho. Todavia, penso também que estão na base das malandrices mais vastas, senão a Felícia não generalizaria desse modo.
Até os donos das lojas se queixam constantemente de calotes e caloteiros, segundo alguns me contam, gabando-me por ser excepção, o que poderia honrar-me se não achasse natural pagar mensalmente as minhas prestações.
Mas como nunca gostei de me superiorizar, recordo muitas vezes a tal história contada pelo Bieito ao Gil, do que queria ser original e apanhou no toutiço enquanto não se decidiu a beber da mesma água que os outros e confraternizar, cantando e dançando todos à chuva.
Assim, não ficaria para trás. Um dia alinho. Faço questão de dançar à chuva.

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