domingo, 29 de novembro de 2009

Loisas e coisas

A minha amiga estava escandalizada. Foi a respeito do jogo Sporting-Benfica:
- Eu estava a ver aquilo e fiquei pasma. Sabe quantos polícias ali estavam? 500! Quinhentos! Vai tudo para a guerra. Lisboa fica despovoada. Foi preciso criar um espaço entre as duas claques! E ainda rebentaram um petardo! E lançaram garrafas e pedras!
- A nossa entifada!
Ignorou.
- Isto diz tudo! E é futebol! Ou melhor, é por ser futebol! É preciso a polícia armada para afastar os fulanos. Porque estes odeiam aqueles e aqueles odeiam estes.
- Vê? Tal como os palestinianos e os israelitas. À pedrada.
- Ora nós, com tantos problemas para resolver! Foi preciso criar uma barreira, uma clareira para os selvagens não se aproximarem. E eu pensei assim: “Aquilo é a juventude deste país, cá da gente!” Incrível! Incrível!
- Pois eu mudei de canal, enojada com tal saloiada nossa. Passei à TVI 24. Estava a dar uma reportagem sobre as tropas americanas no Afeganistão. As tropas americanas que estão ali para defender algum do povo afegão contra os talibãs, em condições miseráveis, alojados numa escola esburacada pelo tiroteio dos talibãs, dormindo no chão, num calor insuportável, falando com o timorato povo afegão, que obedece a ordens dos talibãs, sob pena de serem executados... Mas protegidos pelos rapazes americanos, que prometiam continuar a defendê-los, apesar das condições incríveis. Mostraram a barragem e os canais de irrigação construídos pelos americanos, para fertilizarem aqueles espaços de terra seca, e que serviam também para os talibãs ganharem fortunas no cultivo da papoila e no alastramento da droga. Que mundo de non-sens! A nossa rapaziada curte o futebol, não pensa sequer em se ilustrar. Atira pedras aos do clube rival.
- Tenho pena dos polícias, em todo o caso. É uma profissão de risco.
- Se é! Com tanta loucura à solta!
Mas mudámos para um tema mais prazenteiro. A minha amiga contou:
- Veja como os nossos serviços funcionam bem! Quando se morre avisam-se os serviços todos. Mas alguns serviços continuam a enviar cartas e reclamações. Uma vizinha minha viu-se grega para conseguir que os serviços parassem de mandar avisos, ainda muito depois de o marido ter morrido. No ano passado, depois de a minha ex-empregada doméstica Gabriela ter morrido, foram avisados os serviços do facto, a C.G.D. em primeiro lugar. Pois a C.G.D. continuou a enviar correio para a Gabriela. Um dia, escrevi no envelope da carta que devolvi: “Morri”. Mas agora, ao receber nova carta de advogados, respondi: “Exmos Srs. Doutores: Infelizmente morri no dia 10 /11/ 2008 e a v/ constituinte PT Comunicações foi informada.”
Terminou assim na galhofa a nossa bica de hoje. Mas em casa, enquanto fazia o pudim caramelo da marca "Pingo Doce" – porque hoje é domingo – ouvi uma reportagem sobre crianças deficientes, tratadas com doçura num hospital da capital. E perante tal injustiça da vida sobre crianças inocentes e a dor permanente dos seus pais, sentida segundo a segundo, heroicamente, a vida inteira, disfarçada no momento para brincar com os filhitos, toda a revolta perante o nosso nacional estado de sítio incontornável se desvaneceu, numa dor maior de impotência.

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