sábado, 15 de maio de 2010

O rescaldo da esperança

Agora que o Santo Padre partiu, depois de nos ter trazido a esperança, compartilhada por todos os que falaram nisso, e foram imensos, inclusive – e sobretudo - o nosso Presidente da República, como seria natural que fosse, voltámos ao comportamento anterior da desesperança e direi mesmo do desespero de muitos, embora o nosso Primeiro Ministro ache que Portugal está no melhor caminho possível, pois vai pagar tudo direitinho com os dinheiros da austeridade de todos os portugueses de boa-vontade, e mesmo dos de má-vontade, mas quanto ao aumento das exportações nem cheirá-las, pois nos falta produção assaz, que essa, não há milagre suficientemente valente para inverter as nossas tendências para o santo ripanço de uma incompetência ancestral, apoiado no sentimento da desesperança de que um bom desempenho no trabalho seja merecedor de um reconhecimento grado, salvo para os pertencentes às etnias da boa adaptação a qualquer remodelação de comando de tipo governamental e não só.
Quanto às importações, continuamos bem servidos, diz a minha amiga, ao constatar a profusão das frutas e outros artefactos da produção estrangeira, entre as quais a chinesa em grande plano de eficácia preçária – e precária - e é por isso que nos sentimos vivendo num país em franco progresso, confiantes nas palavras vigorosas do nosso Primeiro Ministro, que umas vezes diz “assim” – que faz e que acontece - e outras vezes diz “assado” – que faz e que acontece, embora precisamente o contrário do que disse quando disse o “assim” com muita insistência, mau grado os avisos dos responsáveis de então, como Manuela Ferreira Leite, e que agora é obrigado a admitir por imposição exterior, dos que exigem tento e equilíbrio e afirmam que as grandes obras da glória do PM, em promessa, do tempo do “assim”, são para interromper, que os tempos agora são do “assado”.
Mas, “assim” ou “assado”, o nosso PM mantém o aplomb de sempre, e o mesmo potencial de voz tonitruante, como era a de Júpiter, nos seus tempos áureos. O seu tom de voz tonitruante – do nosso PM, não do pai dos deuses romanos, que esse passou - agora é acompanhado do tom de voz suave e expressivamente modulada e quase que direi melíflua, do seu companheiro do maior partido oposto, que se vê que não é tão oposto assim, ambos camaradas eficazes para o desvio dos megalómanos projectos anteriores do tempo do “assim” e adopção das medidas eficazes do actual tempo do “assado” para combater de imediato o défice, com a colheita de dividendos que todos têm obrigação de ceder sem protesto, pelo menos os mais pobrezinhos, que os mais enriquecidos com os dinheiros indevidos, ficarão dispensados de lançar para o monte da nossa trágica condição de empenhados e de pagadores permanentes, com as excepções usuais.
Por isso eu não acredito que a visita do Santo Padre tenha sido frutuosa no capítulo da esperança, embora o nosso PR, que é um homem digno e que fez um impecável discurso de adeus ao Papa, ache que nós temos que confiar mais em nós para sairmos da fossa em que nos atolamos.
Tanto a minha amiga como eu própria achamos que não chega confiarmos em nós. Penso que já disse porquê, mas posso repetir, que tem a ver com o “assim” ou o “assado” dos discursos de falsidade do nosso PM que, de idêntica dimensão de vanidade e de auto-saliência, nos empurram infalivelmente para o tal atoleiro, agora bem acompanhado pelo camarada de olhão que lhe segue o rasto.
Mas também o nosso PM não acha isso, que vamos viver com mais esperança agora, depois da visita de Sua Santidade. Aqui entre parênteses, não vá o diabo tecê-las, até penso que deve ter sido por isso que lhe baixou o estatuto, chamando-lhe várias vezes “Sua Eminência”. Porque o nosso PM não pede, de facto, a nossa esperança, pede o nosso esforço. Aliás, impõe-no. Ouvi-o há bocadinho. O esforço de todos, menos o das excepções.

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