Ouvi ontem Herman José, pela primeira vez, depois do seu reingresso na RTP. “Por Outro Olhar”, se chama o programa, que, segundo a minha amiga, só tem o defeito de ser dado tarde na noite. “Ressuscitou, mas estão a pôr-lhe o programa à meia noite”, disse ela com a cólera da indignação, por desejar ver o programa sem cedências das suas horas de sono. Estava habituada a horários mais nobres para o seu querido Herman, e acha que os directores de programas desperdiçam tolamente os aspectos de originalidade, diversão e cultura que o actual programa demonstra, arredando-o para horas incompatíveis com o cansaço dos dorminhocos, como a minha amiga.
Muitas vezes temos falado de Herman José, dos tempos da sua genialidade, na comicidade e poder de comunicação inteligente, quando a sobriedade se limitava à marotice, à desconstrução e desmistificação do senso comum, que o fizeram criar quadros inesquecíveis e sketches de “antologia” teatral. Apreciávamos a sua arte de pôr a ridículo tantas das vulgaridades de políticos ou figuras mais ou menos públicas, ou os quadros históricos de personagens reduzidas a tamanhos comezinhos, excluídas as suas importâncias, malbaratadas as suas grandezas.
Os seus companheiros nas sucessivas jornadas – Lídia Franco, Helena Isabel,Victor Sousa, Maria Ruef, Ana Bola, Joaquim Monchique e tantos mais – primaram na criação dos respectivos papéis, de ruptura, beleza, graça, traduzindo trabalho, inteligência, disciplina, que proporcionaram horas de gáudio, nos horários nobres a que nessa altura tinha direito, como estrela fulgurante, várias vezes reconhecida, por um público que o premiou continuamente.
Mas Herman exagerou, na sua vontade de desferir os seus golpes de sanha contra os convencionalismos da boa ordem social. Tornou-se obsceno, desbocado, repelente. E foi castigado por isso.
Nunca percebi como, sendo pessoa culta e trabalhadora, se deixou resvalar na senda do dislate contínuo, nos quadros grosseiros de uma obscenidade inútil, numa apresentação exterior provocatória, no desrespeito por todos a quem, pessoa carinhosa, parecia amar de facto – os seus pais, as crianças, as velhinhas, os jovens ou adultos dos seus programas e entrevistas, reveladores de uma desenvoltura mental incompatível com a ordinarice e o grotesco dessas suas saídas de má memória.
Senti, realmente, pena, mas admiração também - pela coragem da não desistência, talvez por continuar a acreditar em si - quando, abandonado e maltratado pela vida, e talvez desprezado pela sociedade, parecia mendigar uma nova oportunidade de actuação, junto daqueles que, afinal, eram seus amigos e lhe ofereceram nova oportunidade, por continuarem a acreditar nele.
Vi ontem pela primeira vez o seu novo programa, e tive pena de ter falhado o primeiro, a que a minha embirração tornava indiferente.
“Por Outro Olhar” apresenta gente entrevistada por Herman José: o real – nas suas reais qualidades de comunicador, de pessoa culta, alegre, educada; o fantasiado – o “outro olhar” da mesma personagem, nas suas qualidades de criatividade, engenho, uma graça extraordinária na captação bem irónica da nossa realidade, na desvalorização das grandezas humanas, de uma forma alegre, engraçada, sem deboche. Sóbria.
Bem-vindo, Herman José.
Muitas vezes temos falado de Herman José, dos tempos da sua genialidade, na comicidade e poder de comunicação inteligente, quando a sobriedade se limitava à marotice, à desconstrução e desmistificação do senso comum, que o fizeram criar quadros inesquecíveis e sketches de “antologia” teatral. Apreciávamos a sua arte de pôr a ridículo tantas das vulgaridades de políticos ou figuras mais ou menos públicas, ou os quadros históricos de personagens reduzidas a tamanhos comezinhos, excluídas as suas importâncias, malbaratadas as suas grandezas.
Os seus companheiros nas sucessivas jornadas – Lídia Franco, Helena Isabel,Victor Sousa, Maria Ruef, Ana Bola, Joaquim Monchique e tantos mais – primaram na criação dos respectivos papéis, de ruptura, beleza, graça, traduzindo trabalho, inteligência, disciplina, que proporcionaram horas de gáudio, nos horários nobres a que nessa altura tinha direito, como estrela fulgurante, várias vezes reconhecida, por um público que o premiou continuamente.
Mas Herman exagerou, na sua vontade de desferir os seus golpes de sanha contra os convencionalismos da boa ordem social. Tornou-se obsceno, desbocado, repelente. E foi castigado por isso.
Nunca percebi como, sendo pessoa culta e trabalhadora, se deixou resvalar na senda do dislate contínuo, nos quadros grosseiros de uma obscenidade inútil, numa apresentação exterior provocatória, no desrespeito por todos a quem, pessoa carinhosa, parecia amar de facto – os seus pais, as crianças, as velhinhas, os jovens ou adultos dos seus programas e entrevistas, reveladores de uma desenvoltura mental incompatível com a ordinarice e o grotesco dessas suas saídas de má memória.
Senti, realmente, pena, mas admiração também - pela coragem da não desistência, talvez por continuar a acreditar em si - quando, abandonado e maltratado pela vida, e talvez desprezado pela sociedade, parecia mendigar uma nova oportunidade de actuação, junto daqueles que, afinal, eram seus amigos e lhe ofereceram nova oportunidade, por continuarem a acreditar nele.
Vi ontem pela primeira vez o seu novo programa, e tive pena de ter falhado o primeiro, a que a minha embirração tornava indiferente.
“Por Outro Olhar” apresenta gente entrevistada por Herman José: o real – nas suas reais qualidades de comunicador, de pessoa culta, alegre, educada; o fantasiado – o “outro olhar” da mesma personagem, nas suas qualidades de criatividade, engenho, uma graça extraordinária na captação bem irónica da nossa realidade, na desvalorização das grandezas humanas, de uma forma alegre, engraçada, sem deboche. Sóbria.
Bem-vindo, Herman José.
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