domingo, 16 de maio de 2010

Uma de rãs

Toda a gente conhece,
Se bem me parece,
A fábula da Rã que quis igualar em tamanho
O Boi, o que foi muito mal, por sinal,
Para uma bichinha
Tão enfezadinha
- Coitadinha! -
Que não se apercebia
De que com isso ia
Deixar este Mundo,
E parar ao Profundo,
E sem mais aquelas
Deixar as mazelas
Das várias querelas
Em que na sua vida
Andou entretida.

Assim nós.
Bem nos esforçamos
Por parecermos
Do mesmo tamanho
Dos povos poderosos
Rasgando as várias vias
Das nossas vaidades
E atamancando
Razões, sem-razões,
Para podermos parecer
Tamanhos como eles.
E assim esticamos
Até rebentarmos.

Eis de Fedro, a fábula
Desta pequena rábula:

A Rã que rebentou e o Boi”

«O pobre, quando o poderoso quer imitar
Só pode o pernil esticar.
Num prado, um dia, uma Rã viu um Boi.
E, tolhida de inveja por tanta grandeza,
A sua pele rugosa se pôs a inchar;
Então, aos filhotes decidiu inquirir
Se, ao Boi, em tamanho era superior.
Os trastes negaram e ela, de novo,
A pele esticou num esforço maior
E voltou a interrogar quem era o maior:
- O Boi, responderam, com ar enfadado.
Então,
Com grande indignação,
Pôs-se a esticar com tanta certeza,
Tanta firmeza,
Que ficou com o corpo rebentado,
Sem qualquer beleza.»

Eis, seguidamente,
A fábula de La Fontaine
Tão viva no original
E que a minha tradução liberal
Amorteceu, por meu mal.
Mas o fundo da questão
É que não é precisa explicação,
Por ser tudo tão evidente.
Tão evidente
Infelizmente,
E saliente
Para a gente:

A Rã que quer fazer-se tão grande como o Boi”

«Uma Rã viu um Boi
Que lhe pareceu de bela estatura
Ela, que em tamanho
Não atingia mais do que a altura
De um ovo, invejosa
E de má catadura,
Incha, estende-se, esforça-se, viçosa,
Para igualar o animal em grossura,
Dizendo: “Vede, minha irmã, com atenção;
É quanto basta? Dizei-me; ainda não cheguei lá?
- Ná! –Agora então? – Não!
- Foi agora? – Nem por sombras, ora!”
A frágil bestazinha
Inchou tanto que rebentou
Arrasadinha, arrasadinha.

O mundo é cheio de pessoas
Que não são mais sensatas do que esta tolinha:
Todo o burguês quer construir
Como qualquer grande senhor:
Todo o principezinho
Precisa de embaixador,
Todo o marquês deseja manter
Pajens ao seu serviço,
Mesmo sem ter
Posses para isso.»

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