Contém o capítulo XVII do “Elogio da Loucura” opinião adversa sobre a mulher, num espirituoso retrato antifeminista que não resisto a traduzir:
XVII: «Tendo, todavia, nascido para governar as coisas, o homem deveria ter recebido mais do que uma onça de razão. Júpiter consultou-me sobre este ponto, como sobre os outros, e eu dei-lhe um conselho digno de mim, o de unir a mulher ao homem. Seria, com efeito, dizia eu, um animal delicioso, louco e insensato, mas ao mesmo tempo divertido, que, na vida doméstica, aliaria a sua loucura à seriedade do seu companheiro e atenuaria os inconvenientes disso. Bem entendido, quando Platão parece hesitar em classificar a mulher entre os seres dotados de razão, ele não quer significar nada mais que a insigne loucura deste sexo. Que uma mulher, ocasionalmente deseje passar por sensata, não faz mais que redobrar a sua loucura. ... Não lutemos contra a natureza; agrava-se o seu vício a recobri-lo de virtude e a forçar o seu talento. ... Por muito que ponha uma máscara, a mulher fica sempre mulher, isto é, louca.»
É claro que todas estas observações sobre a insensatez feminina, como conceito machista arreigado desde os primórdios viris da civilização, irá desabar num estardalhaço equiparável à da babélica torre que as línguas confundiu, com a argumentação de uma inteligente mulher, Simone de Beauvoir, que prova que “ninguém nasce mulher: torna-se mulher”, asserção com que inicia o seu “Segundo Sexo”, sobre os condicionalismos ancestrais da condição feminina numa sociedade falocrática.
Mas a Loucura prossegue, impávida, o seu discurso que, se despiciente em relação às capacidades intelectuais da mulher, estabelece os parâmetros tradicionais da superioridade feminina na sua relação com o homem, também feita de cumplicidade e astúcia, os quais servirão lindamente à escritora francesa de suporte, embora incompleto, para a sua demonstração:
«Poderiam as mulheres indispor-se contra mim por lhes atribuir a loucura, a mim que sou mulher e a mesma Loucura? Seguramente que não. A olhar de perto, é este dom de loucura que lhes permite serem em muitos aspectos mais felizes que os homens. Elas têm sobre eles, primeiro a vantagem da beleza, que pôem muito justamente acima de tudo e que lhes serve para tiranizarem os próprios tiranos. O homem tem os traços rudes, a pele rugosa, uma barba cerrada que o envelhece, e tudo isso traduz a sabedoria; as mulheres, com as faces sempre lisas, a sua voz sempre suave, a sua pele macia, têm para si os atributos da eterna mocidade. Aliás, que procuram elas nesta vida senão agradar aos homens o melhor possível? Não é essa a razão de tantas toilettes, pinturas, banhos, penteados, unguentos e perfumes, de toda essa arte de se arranjar, de se pintar, de alindar o rosto, os olhos e a tez? E não é a Loucura que melhor lhes traz os homens? Eles prometem-lhes tudo, em troca de quê? Do prazer. Mas elas chamam-lhe Loucura. É perfeitamente evidente, se pensardes nas frioleiras que o homem conta à mulher, nas parvoíces que por ela comete, cada vez que lhe passou pela cabeça divertir-se.
Ficais agora a saber qual é o primeiro, o maior encanto da vida e donde provém.»
E não se diga que hoje, apesar das mudanças radicais que as novas leis possibilitaram nas relações entre os sexos, as mulheres se coibem de usar dos mesmos arrebiques dos tempos de antanho, até provavelmente, com maior exploração ainda dos artifícios para sedução do homem, quando não é apenas em função do prazer pessoal, como expressão de requinte, de educação ou de simples vaidade.
Não há movimentos feministas capazes de destruir séculos e séculos de tradição discriminatória, que se apoia, talvez, como primeiro argumento, na diferença de tamanhos e de pesos – aparte as excepções da regra – que fazem valer na natureza a lei do mais forte, transformada tantas vezes em lei da selva.
XVII: «Tendo, todavia, nascido para governar as coisas, o homem deveria ter recebido mais do que uma onça de razão. Júpiter consultou-me sobre este ponto, como sobre os outros, e eu dei-lhe um conselho digno de mim, o de unir a mulher ao homem. Seria, com efeito, dizia eu, um animal delicioso, louco e insensato, mas ao mesmo tempo divertido, que, na vida doméstica, aliaria a sua loucura à seriedade do seu companheiro e atenuaria os inconvenientes disso. Bem entendido, quando Platão parece hesitar em classificar a mulher entre os seres dotados de razão, ele não quer significar nada mais que a insigne loucura deste sexo. Que uma mulher, ocasionalmente deseje passar por sensata, não faz mais que redobrar a sua loucura. ... Não lutemos contra a natureza; agrava-se o seu vício a recobri-lo de virtude e a forçar o seu talento. ... Por muito que ponha uma máscara, a mulher fica sempre mulher, isto é, louca.»
É claro que todas estas observações sobre a insensatez feminina, como conceito machista arreigado desde os primórdios viris da civilização, irá desabar num estardalhaço equiparável à da babélica torre que as línguas confundiu, com a argumentação de uma inteligente mulher, Simone de Beauvoir, que prova que “ninguém nasce mulher: torna-se mulher”, asserção com que inicia o seu “Segundo Sexo”, sobre os condicionalismos ancestrais da condição feminina numa sociedade falocrática.
Mas a Loucura prossegue, impávida, o seu discurso que, se despiciente em relação às capacidades intelectuais da mulher, estabelece os parâmetros tradicionais da superioridade feminina na sua relação com o homem, também feita de cumplicidade e astúcia, os quais servirão lindamente à escritora francesa de suporte, embora incompleto, para a sua demonstração:
«Poderiam as mulheres indispor-se contra mim por lhes atribuir a loucura, a mim que sou mulher e a mesma Loucura? Seguramente que não. A olhar de perto, é este dom de loucura que lhes permite serem em muitos aspectos mais felizes que os homens. Elas têm sobre eles, primeiro a vantagem da beleza, que pôem muito justamente acima de tudo e que lhes serve para tiranizarem os próprios tiranos. O homem tem os traços rudes, a pele rugosa, uma barba cerrada que o envelhece, e tudo isso traduz a sabedoria; as mulheres, com as faces sempre lisas, a sua voz sempre suave, a sua pele macia, têm para si os atributos da eterna mocidade. Aliás, que procuram elas nesta vida senão agradar aos homens o melhor possível? Não é essa a razão de tantas toilettes, pinturas, banhos, penteados, unguentos e perfumes, de toda essa arte de se arranjar, de se pintar, de alindar o rosto, os olhos e a tez? E não é a Loucura que melhor lhes traz os homens? Eles prometem-lhes tudo, em troca de quê? Do prazer. Mas elas chamam-lhe Loucura. É perfeitamente evidente, se pensardes nas frioleiras que o homem conta à mulher, nas parvoíces que por ela comete, cada vez que lhe passou pela cabeça divertir-se.
Ficais agora a saber qual é o primeiro, o maior encanto da vida e donde provém.»
E não se diga que hoje, apesar das mudanças radicais que as novas leis possibilitaram nas relações entre os sexos, as mulheres se coibem de usar dos mesmos arrebiques dos tempos de antanho, até provavelmente, com maior exploração ainda dos artifícios para sedução do homem, quando não é apenas em função do prazer pessoal, como expressão de requinte, de educação ou de simples vaidade.
Não há movimentos feministas capazes de destruir séculos e séculos de tradição discriminatória, que se apoia, talvez, como primeiro argumento, na diferença de tamanhos e de pesos – aparte as excepções da regra – que fazem valer na natureza a lei do mais forte, transformada tantas vezes em lei da selva.
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