“O gaio e as pombas”
«Um gaio, avistando num pombal
Pombas muito bem nutridas,
De branco se tingiu para a elas
Parecer igual,
E a sua mesa partilhar
Por conter
Ricas comidas.
Enquanto permaneceu mudo,
Por pomba passou,
E na companhia delas viveu.
Mas no dia em que gritou
A sua voz pareceu
Suspeita às pombas espantadas
Que o expulsaram, formalizadas.
Vendo que a mesa do pombal
Lhe estava agora interdita
Para junto dos seus voltou;
Mas levou sopa.
Porque os seus congéneres
Deixaram de o reconhecer
Por causa da sua nova roupa
E, sem soma de caridade,
Excluíram-no da sua sociedade.
Foi assim que, por ter querido dupla ração,
Se viu à nora
Privado de uma e de outra
De ninguém obtendo perdão,
Com toda a razão.
Também nós devemos
Com os nossos bens satisfazer-nos
Pensando que, as mais das vezes,
Não só não ganhamos nada,
Mas perdemos o que temos
O que é uma maçada.»
Isso, é claro, era no tempo
Em que Esopo contava fábulas,
O que foi há muitos séculos,
No tempo em que os animais falavam.
Mas enquanto eles perderam
As suas capacidades
De falar e de se relacionar,
Hoje são outras as rábulas.
Ninguém se lembra de aplicar
A moral das fábulas aos homens
Que se estão nas tintas para ela,
Porque é outra a moral deles
Que evoluiu tal como eles.
De facto, do mesmo modo que o gaio
Até chegam a mudar de cor
Para se enfiar à mesa de um Senhor
Que lhe pode servir, não ocasionalmente,
Mas por combinações antecipadas
Por vezes mesmo escutadas
Que logo são apagadas,
Em conluios que valem perfeitamente
Para as ambições jamais goradas
Quando feitas com a gente conveniente.
E ao contário do gaio,
Que foi desprezado por uns e outros
Estes, que são gente decente,
Vêem-se cada vez mais admirados
E homenageados
Subindo na vida,
Sempre respeitados.
Moral de fábula é treta
Para gente pateta.
terça-feira, 1 de junho de 2010
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