O
primeiro, de Alberto Gonçalves, avisa, com o arrojo da sua indignação sem
tréguas, sobre a parolice ocidental, revestida de seráfica crença em direitos e
igualdades sociais, quando todos sabemos quanto tal nunca existiu, e basta,
para o confirmar, a referência de Alberto Gonçalves aos costumes de
brutalidades dos machos sobre as fêmeas segundo as práticas religiosas dos
povos islâmicos - o que, de resto, não perturba as consciências dos habituais
pregoeiros da democracia, ululante sempre, sim, mas contra uma “direita”,
segundo esses, única beneficiária nas benesses da vida. «Milhões de
mutilações genitais, casamentos forçados, apedrejamentos e o genérico desprezo
pela humanidade pouco dizem acerca da realidade islâmica. E as matanças
cometidas em nome do profeta ainda dizem menos.» - isso é irrelevante para
as mentalidades dos afectos e da inteligência, segundo a cartilha pregoeira da nova
moral ocidental. Daí que se finja acreditar no esporádico dos
ataques terroristas, com a habitual mobilização policial, hospitalar e
psicológica, o sofrimento das famílias, os ramos de flores a complementar as
tragédias vividas e o erguer de cabeças orgulhoso dos “Je suis Charlie” cada
vez mais esbatido, é certo, e provocando , pelo contrário, o acréscimo dos
apoiantes dessas direitas que se julgam com direito ao sossego de um viver eficiente.
Os
outros dois textos demonstram que o Islão aí está, cada vez mais avassalador e
criminoso - «O terrorismo está a
vencer», de José Milhazes, «Há alguma coisa de novo para dizer sobre o terrorismo?»
de Rui Ramos.
Para
meditarmos, se assim o entendermos.
Entretanto,
nós por cá, em rodapé, demonstrando a habitual parolice obsequiadora e delambida,
que não escapa à argúcia de Alberto Gonçalves, naturalmente. Assim somos, assim
continuaremos. Sem tréguas.
I
O respeitinho é muito
bonito, mas pouco eficaz
OBSERVADOR, 27/5/2017
É
injusto generalizar? Com certeza. Mas a aversão a generalizações, ou o
respeito trémulo pelo islão, não tem corrido bem. Quando o resultado da
reverência é este, talvez valha a pena tentar a afronta
Salvador
Sobral, o Homem que Salvou a Música, gostaria que não se noticiassem os
atentados terroristas. É uma ideia partilhada por muita gente, aquele tipo de
gente que, horas antes do atentado de Manchester, marchara em Lisboa e no Porto
contra a “cultura de violação”. Ao saber da marcha, que integrou 40 associações
e quase tantas outras pessoas, julguei tratar-se de uma denúncia pública, e
inédita por cá, da barbárie a que o islão submete as mulheres. Erro meu.
Afinal, a coisa fora motivada por uma cretinice a cargo de uns burgessos na
Queima das Fitas. Pelos vistos, meia dúzia de burgessos provam que uma
sociedade é, toda ela, propensa a abusar de raparigas em autocarros, mas
milhões de mutilações genitais, casamentos forçados, apedrejamentos e o
genérico desprezo pela humanidade pouco dizem acerca da realidade islâmica. E
as matanças cometidas em nome do profeta ainda dizem menos.
De
resto, os desejos de Salvador Sobral já estiveram mais longe da realização. Chacina
após chacina, as reacções, sentidas ou simuladas, perdem intensidade, e são
escassos os “Je Suis…” a enfeitarem páginas do Facebook. Não tardará o dia em
que vinte ou trinta criaturas mortas por bomba ou camião desçam às manchetes
pequeninas ou sejam embutidas no meio do “telejornal”. E, conforme acontece
hoje com episódios “menores” (uma degolaçãozita ou assim), chegará o momento em
que o horror não mereça uma linha ou comentário.
É
verdade que, face às linhas e comentários que temos, se calhar o silêncio
absoluto seria de facto preferível. Aparentemente, não bastam os “jornalistas”
que chamam “incidentes” a explosões criminosas. Esta semana, com o regresso
do terrorismo em grande escala, regressaram às televisões resmas de indivíduos
especializados em comentar o assunto fugindo do assunto a sete pés. Se a
primeira rajada de argumentos delirantes se esgota, o que raramente sucede, e
os especialistas não conseguem remover o assassino do islão, adoptam com agilidade
o Plano B, que consiste em remover o islão do assassino. O essencial, além de
não mostrarmos medo (do ridículo, presume-se), é perceber que não se pode
confundir os muçulmanos com o terror, embora os comentadores se vejam
regularmente desmentidos pela impressionante quantidade de muçulmanos que
insiste em confundir-se com o terror e pela quantidade maior que, não
praticando o terror, legitima-o pela aprovação tácita ou, no mínimo, pela
indiferença. O espectáculo não é desprovido de piada. Porém, o sangue real que
procuram esconder sob abstracções modera um bocadinho a vontade de rir.
O
método não se distingue do utilizado pelo conhecido Sheik Munir. Instado
a explicar Manchester, o homem cujo cavalheirismo nunca inspirou marcha alguma,
optou por ignorar as vítimas, reduzir o autor ao maluquinho do costume e,
sobretudo, exigir “respeito” pelo islão (Paulo
Tunhas dissecou aqui o estilo). Nem de propósito, respeito é
justamente aquilo que, da parte do Ocidente, o islão tem tido de sobra – no
sentido literal da palavra. A cada novo atentado, dedicam-se desmedidos
louvores à “religião de paz”, os quais curiosamente não impedem o atentado
seguinte. Nos intervalos, exerce-se rigorosa cautela para não beliscar a vasta
susceptibilidade da crença e, de brinde, oferece-se abrigo aos seus desvalidos.
Salvador Sobral, através de t-shirt, foi apenas um dos que convidaram os
refugiados para sua casa. Não que os refugiados careçam de convite: dois deles
vieram da Líbia para a Inglaterra, lá criaram os filhos e, ao que consta,
ajudaram um deles a arruinar as vidas de dezenas de inocentes.
É
injusto generalizar? Com certeza. Porém, a aversão a generalizações, ou o tal
respeito trémulo pelo islão, não tem corrido bem. Quando o resultado da
reverência é este, talvez valesse a pena tentar a desconsideração e a afronta.
Não temos nada a perder, principalmente se a alternativa é perder tudo.
Nota de rodapé
Madonna
andou por Lisboa e não foi recebida pelo presidente da câmara: o sujeito, que
sinceramente desconheço, visitou-a no hotel e, à saída, declarou que o
hipotético interesse da cançonetista por uma casa em Sintra é – acreditem –
“importante para o país”. Mas a coisa, já de si extraordinária, não ficou por
aqui. Parece que o ministro da Cultura, que também não sei quem é, requisitou o
fecho do Mosteiro dos Jerónimos para que a senhora e os filhos o visitassem,
cito um jornal, “sem qualquer incómodo” e sob a orientação especializada da
própria directora do monumento. Consta igualmente que Madonna assistiu a uma
exibição de cavalos lusitanos, preparada de propósito para a ocasião. E há
boatos de que a intérprete de “La Isla Bonita” se terá encontrado com o dr.
Costa, em circunstâncias por esclarecer.
Perante
isto, a tendência da tradicional má-língua é resmungar contra os privilégios
das celebridades, o provincianismo das “elites” (perdão) e uma nação que, pelo
menos nas instâncias “oficiais”, atingiu níveis de demência pouco explorados.
Infelizmente, a má-língua deixa-se dominar pela inveja e, à semelhança dos que
não compreendem as motivações dos “jihadistas”, não consegue colocar-se no
lugar do “outro”.
O
erro é partir do princípio de que a hospitalidade em causa é uma regalia
desejável. Não é. E quem presume o inverso deveria imaginar o que sentiria se,
em viagem a uma cidade estrangeira, fosse constantemente importunado por
criaturas rústicas e irrelevantes, se visse condicionado a levar crianças a um
claustro, tivesse de contemplar uma prova de hipismo e, ao que li algures,
aturasse um ex-futebolista do Benfica ao jantar. O único fogacho de sorte de
Madonna consistiu em ter escapado miraculosamente ao prof. Marcelo e às
divagações em torno de Craveiro Lopes. Mesmo assim, haverá gente a passar
férias mais agradáveis no Cazaquistão.
Nada
disto é por acaso. Mal se percebeu que o turismo sustenta, quase sozinho, a
nossa patética economia, os ponderados indivíduos no poder tomaram de imediato
a atitude que se impunha: acabar com ele. Depois de um período dedicado a
combater as companhias “low-cost”, a condenar a evolução das cidades e a
introduzir taxinhas para financiar o regresso a 1970, o PS lembrou-se há dias
de impor a autorização dos condomínios para arrendamentos de curta duração. Na
prática, isto visa enxotar metade dos turistas. A metade restante enxota-se
mediante a sujeição dos desgraçados a suplícios como o de Madonna. E se ainda
resistirem um ou dois incautos, é então que aparece o prof. Marcelo, a propor
“selfies” e a resolver o problema de vez.
II
O terrorismo está a vencer
OBSERVADOR, 26/5/2017
Os
políticos ocidentais continuam em insistir nas meias-medidas, muitas delas
fruto de acordos e apoios duvidosos a grupos e Estados que estão na origem do
terrorismo.
É
importante homenagear as vítimas dos atentados e prometer, jurar que não temos
medo, que não iremos renunciar ao nosso modo de vida, mas estas palavras
começam a ficar gastas depois de tanta repetição, perdendo completamente o seu
sentido. Sendo assim, por muito difícil e doloroso que seja, temos de constatar
que estamos a perder a guerra com o terrorismo islâmico.
O
mais estranho é ver que as causas e raízes do terrorismo moderno estão
determinadas, as receitas para o combate a essa praga são muitas e variadas,
mas os políticos ocidentais continuam em insistir nas meias-medidas, muitas
delas fruto de acordos e apoios duvidosos a grupos e Estados que estão na
origem do terrorismo. E assim será até que os dirigentes ocidentais continuem a
manter políticas ambíguas em relação a determinados regimes políticos, pondo os
interesses económicos e financeiros à frente da vida dos cidadãos.
Todos
sabem qual o principal país que vive segundo as normas que os terroristas
querem impor não só no mundo muçulmano, mas também na Europa: Arábia Saudita.
Nesta monarquia medieval espezinham-se os mais elementares direitos humanos,
a intolerância contra outras maneiras de pensar, religiões faria inveja à
Inquisição. Alguém sabe onde fica nesse país um templo católico, budista ou
hinduísta, embora lá trabalhem milhares de estrangeiros? Sobre os direitos das
mulheres e das minorias sexuais nem vale a pena falar.
Mas
todos os dirigentes mundiais vão “beijar a mão” aos príncipes sauditas na
esperança de que lhes caia da mesa algumas migalhas. Há poucos dias atrás, o
Presidente norte-americano Donald Trump foi à Arábia Saudita e, segundo a
imprensa, conseguiu um milionário contrato de venda de armas, e os restantes
dirigentes de países que vendem armas, incluindo Vladimir Putin e alguns
dirigentes europeus (Alemanha, França e Grã-Bretanha) ficam apenas com “água na
boca”, com inveja de não terem conseguido um contrato igual.
Para
que servem armas tão modernas? Para combater Israel? Duvido, pois Israel, com a
ajuda norte-americana, tem o armamento, incluindo nuclear, necessário para
garantir a sua sobrevivência. O inimigo principal dos sunitas sauditas é o
Irão xiita, que também não se queixa de falta de armamentos fornecidos pela
Rússia. Como é do conhecimento geral, parte do armamento fornecido a esses e
outros países do Médio Oriente vai parar às mãos de grupos como o Estado
Islâmico, o Hezbollah, etc.
As
redes terroristas também não podem substituir sem meios financeiros, não
funcionam apenas com base no fanatismo (embora este factor possa ser
importante) e eles chegam dos seus patrocinadores através de brancos
ocidentais. Como também é sabido, os familiares dos suicidas podem receber
subsídios por terem formado um mártir.
Por
conseguinte, sem vontade política de pressionar a sério países que patrocinam o
terrorismo e de cortar pela raiz o seu financiamento, nenhuma medida contra o
terrorismo islâmico resultará, podendo apenas “remendar” o problema. Não se
pode deixar de assinalar que os países ocidentais contribuíram em muito para a
desestabilização do Médio Oriente e para a derrocada de regimes que, embora
pouco recomendáveis, continham forças ainda mais extremistas.
É
sintomático, neste campo, a situação na Síria, onde a fragmentação dos grupos
armados torna praticamente impossível a solução política da guerra nesse país e
poderá originar forças ainda mais extremistas. Igualmente foi feito muito pouco
para apoiar os rebentos democráticos e laicos nessas sociedades, principalmente
se compararmos com a tolerância de que gozam os pregadores fundamentalistas
islâmicos na Europa. Não nos podemos esquecer que foi a partir de Paris que o
ayatollah Khomeini preparou o derrube do Xá do Irão Reza Pahvali, em 1979.
Outro
fator importante que está na base do terrorismo islâmico é o sério fracasso da
política de integração dos imigrantes dos países islâmicos, ou melhor, da sua
quase total inexistência em países como França ou Grã-Bretanha.
A
continuar a política de meias medidas, será impossível pôr fim ao Estado
Islâmico. Pode-se apenas fazer o mesmo que está a feito com os talibãs no
Afeganistão. Não obstante a forte presença militar ocidental nesse país, esse
exército terrorista continua a controlar parte dele. Como se trata de uma força
“mais moderada” do que o Estado Islâmico e se opõe a este, a China e a Rússia
já mantêm conversações com eles com vista a evitar o alargamento do conflito
afegão à Ásia Central e ao Nordeste da China, onde as populações são
maioritariamente muçulmanas. Se se continuar assim, resta apenas esperar que
novos grupos terroristas irão substituir o Estado Islâmico.
III
Há
alguma coisa de novo para dizer sobre o terrorismo?
24/5/2017
O
terrorismo islâmico pode transformar as sociedades ocidentais, e é uma ilusão
pensar que impedir isso é apenas uma questão de boa vontade e abertura de
espírito.
Perante
cada barbaridade do terrorismo islâmico na Europa e na América, percorremos
sempre o mesmo caminho.
Primeiro,
há a demora em admitir que se trata de um atentado. A seguir, vem a reserva
sobre a identidade do autor. Depois, a incerteza sobre as suas cumplicidades e
filiações. Nesta relutância em reconhecer a realidade, não há apenas uma
prudência preliminar: há, muito claramente, o desejo desesperado de que não
haja a lamentar senão um acidente trágico, a selvajaria de um doido ou, quando
muito, o ataque desenquadrado de um “lobo solitário”.
Por
fim, quando já não pode haver dúvidas de que se trata de uma atrocidade
planeada por um jihadista imigrante ou filho de imigrantes muçulmanos do Médio
Oriente ou do Norte de África, com sócios entretanto presos, como aconteceu
agora em Manchester, jorram as admoestações do costume: o terrorismo quer-nos
dividir, e nós temos de nos manter unidos; o terrorismo contesta o nosso modo
de vida, e nós temos de prosseguir as nossas vidas o mais habitualmente
possível. Como se tudo dependesse apenas de nós e dos sentimentos que
ostentamos nas redes sociais.
Há
muitas sociedades, no Médio Oriente ou em África, para quem o horror jihadista
é parte do quotidiano. As democracias ocidentais, porém, não estão preparadas
para aceitar as bombas como uma nova normalidade. Porque a nossa liberdade
requer segurança, mas também porque não é compatível com todas as formas de
segurança. É significativo, a esse respeito, que em Manchester, tal como em
quase todos os últimos atentados, o perpetrador fosse alguém conhecido da
polícia pelas suas ideias ou conexões islamistas. Mas as nossas autoridades não
privam ninguém de direitos apenas pelas suas origens ou convicções, antes de
provada a conspiração para cometer um crime. Até quando, sob a pressão do
terrorismo, será assim?
A
tese de que os terroristas nunca vencerão tem o conforto da nossa supremacia
tecnológica. Mas não é pelo nivelamento tecnológico que os jihadistas nos
ameaçam. É pela aglomeração do nosso mundo com o mundo deles. A Europa, no
tempo dos impérios, quando administrava a África e policiava a Ásia, estava
separada por longas viagens desses mundos exóticos. Em 1881, houve uma grande
revolta jihadista no Sudão, liderada por um auto-denominado Mahdi. O público
ocidental seguiu o acontecimento pelos jornais e alguns livros. Hoje, através
das migrações e dos meios de transporte e de comunicação, essa distância
desapareceu: o Sudão do Mahdi fica actualmente nos subúrbios de Manchester, de
Paris ou de Berlim, porque com as pessoas vêm as suas culturas.
Os
regimes ocidentais promoveram a circulação, com muitos benefícios. Agora, não
têm solução para os seus efeitos secundários. Uns pensam em acabar de
ocidentalizar a África e o Médio Oriente, através da intervenção militar;
outros esperam integrar os que vão chegando; e outros ainda, exigem o
encerramento das fronteiras. Mas, como se tem visto, faltam os consensos e os
recursos não só para as intervenções e as assimilações, como também para os
distanciamentos.
Por
isso, faz-se o que se pode: manter a polícia atenta na Europa e na América,
para não deixar a jihad desenvolver “células”, e ajudar aliados no Médio
Oriente e na África, de modo a não consentir “santuários”. Mas que acontecerá
se um dia os ocidentais se sentirem verdadeiramente fracos e inseguros, como é
objectivo dos terroristas? Conseguiremos não nos tornar noutra coisa, por
exemplo, em comunidades exclusivistas determinadas a retaliar brutalmente?
Talvez pouca gente deseje isso, mas é uma ilusão pensar que é apenas uma
questão de boa vontade e abertura de espírito.
No
fundo, a única coisa que falta dizer sobre o terrorismo é evidente: pode mesmo
mudar a maneira como vivemos, e também a maneira como pensamos. Por enquanto,
no Reino Unido já há tropa na rua, como em França, e até Morrissey começar a estar farto do
“politicamente correcto”.
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