sábado, 14 de novembro de 2015

Selma Lagërlof



Tenho-me lembrado de Selma Lagërlof, apetecendo um livro bom, sem pretensões, nesta altura de tanta barafunda pouco criteriosa, em que novamente nos encontramos a falazar, a decidir segundo normas que envergonhariam qualquer povo educado em sérios critérios de cidadania, responsabilidade, respeito e auto estima.
Vê-se que Selma Lagërlof foi educada segundo esses preceitos que contribuíram, certamente, para a boa formação moral das crianças do mundo inteiro, sobretudo com o seu livro “A Maravilhosa Viagem de Nils Holgërson através da Suécia”, de fantasia e sentimentos justos e passeios de encanto através dessa Suécia das suas lendas. Foi um livro que o professor de português da minha irmã, Duarte Marques, do Liceu Salazar de Lourenço Marques, aconselhara as alunas do 2º ano a ler, juntamente com os livros da Virgínia de Castro e Almeida “Céu Aberto” e “Em Pleno Azul” e que o meu pai logo se apressou a comprar, sempre colaborando na boa formação das filhas, apesar de não ser para larguezas o seu ordenado de Guarda-Fiscal na altura. É também por tudo isso que o recordo sempre, e mais agora que me apetece regressar a esse passado sem espectros ainda de futuros sombrios, como este em que se ouve dizer que a juventude portuguesa bebe mais do que as outras, as moças e moços universitários fazem concursos de bebida para recepção aos caloiros, e mais tarde vão ensinar alunos, ou tratar doentes ou defender causas, provavelmente sem nunca terem curado a bebedeira. E lembro a magia desses três livros que li e reli na minha adolescência, a que o Dom Quixote e os livros de Júlio Dinis da estante do meu pai, e outros mais, acrescentaram o prazer da sua escrita e enredo criativo.
Na colecção de Prémios Nobel de Literatura publicada em tempos pelo DN, e que o meu marido adquiriu, encontrei um pequeno volume de Selma Lagërlof – “O Livro das Lendas” – que já conhecia, e que reli, como forma de evasão, para mais uma vez me admirar com a evolução dos critérios para atribuição dos Nobel da Literatura, derivando quer para o rebuscamento frásico, quer para o factor político, ou apenas o enredamento dos jogos de nepotismo favorecendo tal atribuição.
Entre essas Lendas tão simples, que mereceram o Prémio Nobel, releio “A Rapariga do Brejo Grande” história de uma rapariga pobre que teve um filho de um homem rico que não reconhecia o filho, pronto a jurar falso em tribunal, de mão sobre a Bíblia, o que a pobre rapariga impediu, preferindo ser por ele desprezada e o seu filho destituído da ajuda paterna que ela pretendia obter em Tribunal, a deixá-lo cometer o sacrilégio de jurar falso, o que lhe valeria a condenação às penas eternas. O grito da moça humilde e chorosa merece-lhe a estima geral e a do próprio juiz, e a atracção de um jovem, um pouco ingénuo, que acabará percebendo o sentimento que por ela nutre, embora enredado noutros amores mais favoráveis a um estatuto superior de proprietário considerado.
Uma história de amor e de bons sentimentos que jamais suporia dignos de um Nobel, história distinta, contudo, das novelas cor de rosa, pela seriedade de uma efabulação que é simultaneamente uma homenagem ao povo sueco mais humilde, na honestidade e firmeza do seu comportamento social, como as outras “lendas” revelam também, traços que igualmente definem a escritora Selma Lagërlof, que desde a infância admiro.

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