Francisco Assis bem que tentou mostrar à nação que, sendo socialista
convicto, discorda da convicção de Costa de se apoiar na esquerda, que fará o
país dançar na corda bamba até se estatelar de vez. Francisco Assis piou tarde,
o que significa que as suas convicções de lealdade a princípios de honestidade
na questão de ganhadores ou perdedores eleitorais são evasivas, apenas quis
ficar bem na fotografia ante o país da direita, mas o resultado da tentativa, à
porta fechada, foi nulo, naturalmente, ele próprio desejoso de pertencer a um
partido governante nem que seja na dependência de gente de discurso de slogan,
para quem tudo se resume a “derrotar o governo”, ainda que à
custa da destruição do país. Vasco Pulido Valente apresenta avisos de
consistência, que não perturbaram Assis, que também os devia conhecer. Mas, como já
outros disseram, somos um povo desmazelado, que deixa assaltar a casa antes de pôr
as trancas na porta, além de suficientemente ingénuo para acreditar nas
patranhas dos patranheiros dos slogans da fartura na miséria.
O manifesto dos 115
Vasco Pulido Valente
Público, 7 de Novembro de 2015
No
meio da conversa metafísica sobre a legitimidade ou ilegitimidade do putativo
governo António Costa, as notícias que realmente contam têm passado
desapercebidas. Primeiro, um pequeno perigo que pode deitar abaixo todo o
edifício construído por uma “esquerda” que não consegue medir o efeito da sua
inesperada ascensão ao governo. A agência de “rating” canadiana DBRS (a
única das quatro grandes que não desceu a dívida portuguesa à categoria de
“lixo”) avisou terça-feira que admite fazer descer um degrau à nossa papelada.
Se isso vier a acontecer, não será permitido ao BCE comprar dívida portuguesa
(de que em larga parte nós vivemos), nem aos bancos dar dívida portuguesa como
colateral do dinheiro que andam por aí a pedir; e não tardará que uma nova
troika desembarque em Lisboa.
Como
se isto fosse pouco, também saiu esta semana um manifesto assinado por 115
donos de empresas familiares Para a imaginação popular uma empresa familiar
é um café ou uma loja de sapatos. Estes 115 senhores não se ficaram por aí,
como por exemplo, Peter Villax (da farmacêutica Hovione), Vasco de Mello (do
grupo José de Mello), Pedro Teixeira Duarte (da construtora Teixeira Duarte),
António Amorim (do grupo Amorim) ou João Pereira Coutinho (da SGC). Este
manifesto é tanto mais significativo quanto as forças reais da economia não se
foram esconder por uma vez nas saias do poder como dantes se embrulhavam na
milagrosa manta de Salazar. Parece que finalmente chegaram à maturidade e são
capazes de tratar de si. O que dizem é francamente assustador.
Começam
por explicar o que os preocupa. A “esquerda” não percebe ou finge que não
percebe, mas para os signatários do manifesto basta “o facto de dois dos
partidos que podem formar um novo governo ou maioria parlamentar serem
estatutariamente anti-inciativa privada”. Só por si, previnem os 115, a
presença do PC e do Bloco na mesa do Conselho de Ministros ou perto dela levou
ao “adiamento de projectos” e, portanto, de “novo investimento”. E, para
as pessoas com dificuldades cerebrais, o manifesto acrescenta que a política do
afamado dr. Costa produzirá “mais desemprego, mais sofrimento e mais pobreza”.
Os 115 são sérios. Infelizmente, não faltam por aí trafulhas para ouvir o
incitamento implícito no manifesto, ou seja, “ponham o vosso dinheiro a salvo,
enquanto é tempo”. A Holanda e o Luxemburgo agradecem.
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