Entretive-me a ler alguns
comentários ao artigo deste domingo, de Alberto Gonçalves – “A vacina” -
de que respiguei dois – o de uma mulher e o do homem que lhe responde.
Um homem ousado, Alberto
Gonçalves, que não se importa de arrostar com a babugem da linguagem fabricada
na escola do extremismo nem sequer político, porque apenas ignaro e servil a
forças baladeiras de uma oposição que não é apenas grotesca, dos idos de
setenta, como ele descodifica com clareza no seu artigo - ao acusar as forças
fraudulentas a que um Costa se arrima, na ânsia do poder, acusando todo um país
que fecha os olhos comodamente, rebanho de sempre, atrás do repasto, embora
seja fictício o repasto prometido.
Eis o comentário obtuso e mal
educado de uma mulher cuja mente e linguagem petrificaram, nessa retórica de
aquisição sem esforço, porque pendente apenas dos ais próprios, equiparáveis
aos urros castiços de qualquer bicho reivindicativo dos seus direitos
fisiológicos:
«Ainda não consegui perceber como é que ao cabo de 40 anos
passados sobre o 25 de Abril ainda existem fascistas a escrever em colunas de
jornais, perdão, pasquins de vão de escada.. Isto só é possível enquanto o
caduco silva, ex agente da pide estiver no poder. Vergonha de gente.»
E a resposta de quem não aceita isso e acha que deve
intervir. Inutilmente, sem dúvida:
«Vergonha de comentário de gente que afina a sua pseudo
democracia pela democracia leninista, segundo a qual todos os que não lerem
pela sua cartilha marxista são "fascistas" e os jornais em que lhes é
permitido escrever livremente não passam de "pasquins" e nem sei que
mais! A sua vivência democrática, minha senhora, está muito, mas muito
deficiente!.... Mas ainda está a tempo de aprender!»
(É claro que discordo do
vocativo, e do comentário final: Se nunca teve tempo, é visível que nunca o
terá).
O artigo merecedor do desforço
comentarista supra:
A "vacina"
Alberto Gonçalves
Notícias, 1/11/15
Neste
Outono sombrio, há quem alimente esperanças com a teoria da "vacina".
Eis uma súmula: em primeiro lugar, Cavaco aceita contrariado um governo PS com
a participação ou o "apoio" dos partidos comunistas. Depois, o
governo defende os superiores interesses nacionais (leia-se serve a
clientela e espatifa a economia), actua em benefício dos trabalhadores
(i.é , saqueia os últimos cêntimos dos que trabalham e pagam impostos), favorece
os direitos das pessoas (ou seja, persegue e cala dissidências) e consolida a
democracia (por outras palavras, deixa-a em coma). No meio do pandemónio,
lá para o Verão o governo cai, Portugal aprende que o marxismo é nocivo e a
relevância eleitoral da esquerda, PS incluído, esvazia-se por décadas ou pela
eternidade afora. Um consolo, não é? E também uma alucinação pegada.
Na
tarde de 11 de Setembro de 2001, sofri um portentoso ataque de ingenuidade e,
por momentos, presumi que os atentados nos EUA explicariam enfim ao mundo a
legitimidade da resistência de Israel ao terrorismo. Voltei ao normal em
dias ou horas, o tempo suficiente para que certo mundo desatasse a
"compreender" as dores da "rua" islâmica, a reforçar a
repulsa pelos EUA e a redobrar o anti-semitismo, perdão, o anti-sionismo. À
semelhança da cegueira ideológica, a má-fé não aprende nada, excepto a evitar a
realidade.
Excepto
para os viciados em metanfetaminas que a bem do colesterol hesitam em ingerir
uma morcela, o arrependimento não é para aqui chamado. Se o país não
erradicou o comunismo após os arremedos revolucionários de Cunhal, Otelo e
Vasco Gonçalves (por pudor, não falo do rastro de sangue e miséria que a
conversão dos povos à felicidade espalhou - e espalha - pela Terra), a que
propósito ficaria "vacinado" por causa de novo assalto ao poder, uma
pequenina supressão das liberdades e a trivial bancarrota? O razoável
PS faliu-nos em três ocasiões e nunca se viu remetido para a obscuridade que
merecia. Depressa atribuída aos "mercados", à Sra. Merkel, a
Passos Coelho e às conspirações do costume, uma quarta falência não fará grande
diferença, e a diferença que fizer custará demasiado.
Além
de enganadora nas expectativas, a "vacina" é desaconselhável nos
efeitos: no fundo, sugere a resignação de todos os cidadãos que ainda não
endoideceram, de Novembro em diante condenados a consentir uma burla e a
contemplar um desastre. Embora banhada nas melhores intenções, a ideia da
"vacina" acaba por tornar o desastre consolador e a burla tolerável,
dois equívocos que pagaremos com juros.
Isto
tudo para dizer que Cavaco Silva não deve ceder a chantagens e nomear o Sr.
Costa. Pretextos "técnicos" não lhe faltam, desde a inexistência
de um acordo de facto (na quinta-feira, o Sr. Jerónimo assumiu o carácter
fictício do mesmo) às promessas implícitas e explícitas dos partidos
comunistas em remover-nos do Ocidente rumo à balbúrdia exótica que estiver em
voga. Mas a verdadeira razão prende-se com a Sagrada Constituição,
cujo artigo 120.º informa que o Presidente da República garante "o
regular funcionamento das instituições democráticas". A "frente
popular" nem ganhou eleições nem é democrática. A "vacina" é a
própria doença, está nos livros. E estaremos feitos.
Sexta-feira,
30 de Outubro
Pouco barulho
Vasco
Lourenço, presidente de uma Associação 25 de Abril e homem de grande gabarito,
quer "iniciativas" em prol da "liberdade" e da
"justiça". Sobre a justiça, presumo que a censura dos media da
Cofina (e o processo ao Sol) a propósito da divulgação de pormenores do
"caso" Sócrates já é um bom princípio. No que respeita à
liberdade, a urgência, conforme insinuam o próprio Sr. Lourenço e o
inestimável Sr. Nogueira da CGTP, é sabotar qualquer manifestação em defesa do
governo na data das moções de rejeição, imprudência que se discute
nas "redes sociais" e que os sadios valores de "Abril"
naturalmente não admitem. Sinais dos tempos?
Convém
ainda notar que os "tempos" nem sequer começaram. Os processos de
intimidação em curso são um mero aperitivo do que nos espera quando, e se, a
frente golpista chegar a mandar nisto. Para começar, não será fácil usar a
expressão "frente golpista" em público - em privado recomenda-se o
sussurro. Mesmo enquanto autarca pequenito e candidato burlesco, o Sr. Costa já
provou que convive optimamente com as opiniões alheias desde que coincidam com
as dele. Erguido a PM, sobretudo um PM de escassa ou nula legitimidade, não
custa antecipar até onde irá a proverbial tolerância da criatura.
Para
cúmulo, há que somar ao carácter da criatura a vasta tradição democrática dos
comunistas de tons sortidos que a patrocinarão na eventual, e festiva,
aventura. Tanto o PCP como o BE são agremiações historicamente abertas
ao debate, no sentido em que o Templo de Jim Jones era uma agremiação
historicamente aberta ao debate. Todos foram coerentes na ausência à tomada de
posse de um governo livremente discutido e escolhido nas urnas.
O
engraçado, para não dizer trágico, é que andámos 40 anos a ouvir essa gente
chamar impunemente "fascista" a tudo o que se movia e agora arriscamo-nos
a não poder devolver-lhes o epíteto, enfim utilizado com propriedade.
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