Um texto de Salles da
Fonseca, 16º da série “Muitas e desvairadas gentes”, crónicas resultantes
da sua viagem recente por terras da Índia e Ceilão:
Terça-feira, 15 de
Dezembro de 2015
MUITAS E DESVAIRADAS
GENTES – 16
Goa é o
Estado da União com o mais elevado PIB per capita sendo o turismo um elemento
fundamental da sua economia. Contudo, há agora um elemento desestabilizador no
modelo já enraizado por que ninguém esperava: a queda abrupta do Rublo.
Os
americanos passaram à auto-suficiência energética e o Estado Islâmico aí está a
fornecer petróleo a troco de armas, a cotação do barril de petróleo caiu e a
Rússia faliu. Tão simples como isto. A mesma falência aconteceu a Angola mas
esta nada tem a ver com Goa enquanto os turistas russos eram muito importantes
para a economia goesa. Havia também umas «prestadoras russas de serviços» –
ligadas à mais velha profissão do mundo – que ficaram sem a clientela a que
estavam habituadas. Sim, Goa estava a transformar-se num mega prostíbulo russo.
Consta que os miríficos casinos flutuantes – propriedade da Máfia russa,
segundo se diz à boca cheia – também estão a passar por alguma recessão. Os
cartazes em russo anunciando não sei o quê (sou analfabeto em cirílico e não
sei russo) estão baços e sem a iluminação feérica a que, diz-se, estavam
habituados.
Há
também os hippies arqui-velhos que ainda não perceberam que o mundo já deu umas
quantas voltas desde que ali aportaram e que o flower power já era... Mas se
foram importantes há décadas, agora limitam-se a exibir a degradação a que
chegaram, não passam de um fait divers e não têm mais qualquer relevância económica.
E,
contudo, a costa a norte de Pagim, desde Sinquérim a Baga passando por Candolim
e Calangute, fervilha de gente animada round the clock, com cafés, bares e
restaurantes porta sim-porta sim, praias cheias sobretudo à noite com a festa
da música, das luzes e dos fogos de artifício a pretexto de tudo e de nada... É
que, de facto, nem só de russos e de hippies caducos vive o turismo de Goa.
Nós, os outros, somos a maioria e os indianos de outros Estados encheram os
hotéis por lá terem ido passar o Diwali. O quê? O Diwali é para os indianos o
mesmo que o ano novo e o Natal são para nós, dois em um, motivo de festa, de
votos positivos, de presentes.
Tivemos
alguma dificuldade em conseguir alojamento no hotel que queríamos, o do Forte
Aguada, tendo corrido o «risco» de irmos parar a outra zona menos animada. Mas
conseguimos o que queríamos e pudemos testemunhar que Goa é actualmente o pólo central
do turismo indiano. Mais uma razão para que Goa preserve a sua própria cultura
em vez de se deixar igualar aos demais Estados da União.
Mas
serão os goeses capazes de definirem a política no seu próprio Estado ou
continuarão por muito mais tempo à mercê dos interesses dos grandes Partidos
colonialistas, o do Congresso e o BJP? Pelo ambiente político de que tomei
conhecimento, temo que Goa se dilua na União.
E foi
com esta ideia bem pesada que tomei o avião com destino a Bombaim.
O meu comentário: Tout
passe, tout casse, tout lasse et tout se remplace… Nem vale a pena lamentar. Nem Afonso
de Albuquerque estranharia, talvez, esses dados novos sobre um povoamento que a
sua política de miscigenação iniciou, dentro dos trâmites da legalidade, é
certo. Mais um texto cheio de vibrações turísticas, de política pendente, que nos faz viajar com a
curiosidade atenta…
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