Nunca um escrito foi tão
directo na crítica, tão objectivo nos dados que fornece, que vão da referência à
falcatrua de todo o processo eleitoral, como a casos pontuais de ignorância linguística
portuguesa, com erros de palmatória, no novo elenco governativo, que inclui António
Costa, e a Ministra da Educação, além de outros exemplares que o Facebook
denuncia, de arrepiar os cabelos - mas convenho que nos tempos que passam por
nós, há muito tempo que os pruridos ortográficos ou fónicos deixam de fazer
sentido no país – em suma sintetizadas as figuras “políticas” do elenco governativo
na frase insultuosa ditada pela indignação, mas certamente que credível nas
suas afirmações, porque escritas por pessoa intelectualmente e moralmente idónea,
não tenho dúvidas em o afirmar, pelos princípios que sempre tem defendido de
uma ética escrupulosa e de formulação arguta: «Não vou ao ponto de dizer que a nova ordem é a
consagração dos clientes da taberna: é a consagração dos indivíduos que,
expulsos da taberna, desataram a frequentar caves maçónicas compatíveis com o
seu nível. Privados de uma reles ideia, a não ser a da impunidade
"natural", exibem petulância directamente proporcional à rudeza que
os define. Por cá, a espécie é igualmente apelidada de "elite". E
ninguém se ri, até porque dá vontade de chorar.»
Um
país de mentirinha, dirigido por novos “guardadores de rebanhos”, deitados
na sua realidade comezinha de «pensamentos que são todos sensações”, e que
pensam «com as mãos e os pés» e outras partes do corpo, muito anti metafísicos,
porque a sua realidade, que embora só por brincadeira tenha a ver com a de
Alberto Caeiro, excluída a intelectualidade deste, parece deslizar também numa
de sensacionismo ambicioso e doentiamente falso ou fútil:
A nova ordem nacional
Alberto Gonçalves
DN, 29/11/15
Recapitulemos. A 4 de Outubro, a vitória da coligação
de "direita" e da "austeridade" provou que o povo é
masoquista e retardado. Horas depois, ou o tempo necessário para contar os
deputados, apurou-se que afinal a maioria do povo derrotou a
"austeridade" nas urnas e concluiu-se, com alívio, que o povo
masoquista e retardado é minoritário. O exercício, então, consistiu em parodiar
na internet e na nobre arte do comentário político a falta de competência aritmética
da "direita", já que 122 lugares na AR são mais do que 107 -
"Qual é a parte que não percebem?", repetia-se por aí. Dada a suprema
importância dos parlamentares, exigia-se que o PR indigitasse a aliança de
esquerda sem ouvir nenhum. Enquanto isso, insultava-se "o Cavaco",
que por sua vez indigitou Passos Coelho. Derrubado Passos Coelho, reclamou-se a
nomeação imediata do Dr. Costa, ameaçou-se com baderna pública e decidiu-se que
"o Cavaco", entretanto ocupado a receber meio mundo, não respeita a Constituição
e o eleitorado, embora o homem agisse de acordo com a primeira e tivesse sido
eleito em duas ocasiões pelo segundo (a parcela masoquista e retardada). Tudo,
da sagrada "lei fundamental" à plebe, existe apenas para ser torcido
a benefício da vanguarda esclarecida.
Hoje, com a cedência do PR à piedosa mentira da
"inevitabilidade" do governo PS, enterrou-se (entre insultos) "o
Cavaco" e passou-se a biografar os membros da coisa como se os ditos
fossem para levar a sério. Não são. Desde logo, são, sem excepção ou dúvida,
cúmplices de uma golpadazita - inteiramente "conchcinal", dirá o Dr.
Costa -, o que por si define o respectivo carácter. À lupa, são no máximo
antigos serviçais da autarquia, zombies "socráticos", favores, flores,
emissários de interesses, em suma ninguém. Dissecar o currículo formal de cada
um, mesmo agrupando os diversos agregados familiares que por lá andam, tem
utilidade reduzida e não será grande contributo para prever o futuro e a
essência do novo tempo, do novo homem, enfim da nova ordem emergente. A nova
ordem está nos pormenores, e nem se esgota no rancho que tomou posse há dias.
Está, por exemplo, num primeiro-ministro que troca o
jargão político por um jargão pessoal vagamente aparentado ao português (se ler
conforme fala, o "brilhante negociador" ainda irá a meio do clássico
Anita Vai ao Circo). A nova ordem está num ministro das Finanças que parece
saído dos flashbacks de Family Guy e entrado no circo a que a Anita foi. Está
num candidato presidencial oficioso que promete "puxar por Portugal"
e, juro pela minha saudinha, ser "um saca-rolhas". Está no
ex-governante suspeito de múltiplos crimes que palmilha o território nacional
em missão evangélica. Está numa ex-ministra da Cultura, e vibrante entusiasta
da "situação", que avisa no Twitter: "Há [sic] direita
prefere-se que não se emitam opiniões." Apesar disso, é "há"
esquerda que as opiniões incomodam mais.
A nova ordem está na fresquíssima secretária de Estado
da Igualdade ou da Fraternidade, que em tempos explicou no Facebook: "Como
sabem eu [sic] não tenho por hábito fazer sensura [sic], mas não tulero [sic]
insultos (...)". E está no sensor, perdão, censor que saltitou da ERC para
a tropa, com escala pedagógica a norte. E está na sugestão do Sr. Seixas da
Costa, personalidade conhecida por zelar pela educação parisiense do Eng.
Sócrates e por se indignar com a falta de "estrelas" Michelin em
Portugal: "A ideia não será popular, mas não seria a ocasião para se
introduzir uma transparência total nas redes sociais acabando com o
anonimato?" E está no assombroso Dr. Ferro. E no nobilíssimo Dr. César dos
Açores. E em sujeitos que passeiam títulos e pêlos nas orelhas em simultâneo.
Quem é essa gente, Deus do céu?
Não vou ao ponto de dizer que a nova ordem é a
consagração dos clientes da taberna: é a consagração dos indivíduos que,
expulsos da taberna, desataram a frequentar caves maçónicas compatíveis com o
seu nível. Privados de uma reles ideia, a não ser a da impunidade
"natural", exibem petulância directamente proporcional à rudeza que
os define. Por cá, a espécie é igualmente apelidada de "elite". E
ninguém se ri, até porque dá vontade de chorar.
Ao que tudo indica, a "direita" ficou
sinceramente escandalizada com a jovialidade com que o PS traiu os próprios
"princípios", aliou-se às beatas de Lenine e, após 40 anos de ténue
civilização, enxovalhou a data fundadora do regime. Ou a "direita"
perde a virgindade ou não volta a levantar-se. O único "princípio" do
PS é a convicção profunda e feroz de que nasceu para mandar nisto, custe o que
custar. E, se custa muito resignarmo-nos à arrogância de rústicos, a eles custa
pouco partilhar o poder com quem partilha a descrença na democracia e a crença
na superioridade inata. Só espanta que o arranjinho demorasse tanto. A nova
ordem, feita de brutalidade, retórica de 4.ª classe (sem exame), intolerância,
comparsas, falências, delírios, respeitinho e a terminal anexação do país pelo
Estado, é um projecto velho.
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